Mas para José Salvador e Ezequiel o dia de trabalho, pelo qual receberiam 1.500 pesos (110 dólares), se complicou quando começou a soprar o Norte, um vento muito forte. A 70 quilômetros da costa e sem motor, começaram a ficar à deriva, relata Alvarenga, de 37 anos. Seu companheiro, de 15 ou 16 anos, morreu quatro meses depois, de sede e fome, porque vomitava e não conseguia se alimentar de animais crus. "Aguentou quatro meses. Mas depois fiquei sozinho. ;Meu Deus, quando vou sair, quando vai me levar?;, eu pensava", relata o náufrago, que diz ter lançado o cadáver de seu colega ao mar.
Começou então um périplo de mais de um ano no qual sobreviveu comendo peixe, quando havia, e bebendo água da chuva ou sua própria urina. "Levantava esperando patos, pássaros que viessem a minha lancha", lembra fazendo longas pausas, como se custasse a se lembrar do que viveu. Também se alimentava de tartarugas que se aproximavam da lancha. "Pensava que ia ficar louco, que não ia conhecer as pessoas, eu pensava. Olhava para meu pai, olhava para a minha mãe, as minhas irmãs, mas eram imaginações", explica o pescador, que passava horas "sentado, vendo o céu, vendo o sol".
Sua fé em Deus o manteve vivo, garante, embora também tenha pensado em cometer suicídio. "Não pensava em morrer, pensava que ia sair, forte. Mas em duas ocasiões quis me matar, agarrava a faca quando não havia água ou comida", lembra.
Uma história com muitas perguntas
Sua história levanta muitas perguntas, começando pela de sua sobrevivência durante pelo menos treze meses em condições extremas, e seguindo por seu aspecto físico, relativamente saudável quando foi resgatado. "Está melhor do que o esperado", reconheceu o embaixador dos Estados Unidos nas Ilhas Marshall, Thomas Ambruster, um dos primeiros a vê-lo.
No entanto, existem precedentes, como o de três pescadores que em 2005 foram resgatados nas Ilhas Marshall nove meses depois de terem se perdido na costa mexicana. José Salvador Alvarenga apareceu na última quinta-feira em uma praia do atol de Ebon, a 12 mil quilômetros da costa do México. Foi dormir e lembra que a primeira coisa que viu foi um coqueiro e depois uma casinha. Foi localizado por dois moradores locais. Estava desorientado e vestia apenas uma cueca esfarrapada. "A primeira coisa que pensei era em comer, pensava em tortilha, ovo, frango, imaginava a comida", lembra.
O náufrago também disse estar ansioso para ver a filha, chamada Fátima Maeva. Como não falava inglês, se comunicou através de desenhos e gestos e depois foi levado a Majuro, a capital das Ilhas Marshall, onde está hospitalizado. Sua mãe, que vive em El Salvador, o reconheceu na segunda-feira por fotografias. "Agradeço a Deus por ver meu filho, acreditava que estava morto", declarou à rede CNN María Julia Alvarenga, que vive com seu marido em Garita Palmera, 118 km a sudoeste de San Salvador. "Só quero tê-lo aqui conosco", explicou, à espera de que o filho volte para casa.