O pedido de desculpas do ministro israelense da Defesa Moshé Yaalon, que havia acusado o secretário de Estado americano, John Kerry, de "obsessão incompreensível", está longe de ter dissipado a crise diplomática, que revela o fosso entre os dois aliados, segundo analistas israelenses.
Kerry declarou nesta quarta-feira (15/1) que não vai deixar "uma série de comentários" desviá-lo de seu objetivo de "fazer avançar o processo" de paz entre israelenses e palestinos, com o apoio do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.
Mas, segundo o jornalista Shimon Schiffer, que divulgou as afirmações do ministro da Defesa, "não é um segredo que Netanyahu pense a mesma coisa. Só que Yaalon, ao contrário de Netanyahu, não quer participar da farsa em torno das negociações" com Kerry.
Yaalon quis denunciar "a insultante falta de transparência" com os cidadãos israelenses na condução das negociações, nas quais ele acredita que Kerry se alinhou às posições palestinas, explica o editorialista em um artigo do Yediot Aharonot.
O jornal cita uma outra "autoridade" do Likud, partido de Netanyahu e Yaalon, segundo a qual "Yaalon disse em voz alta tudo o que Netanyahu pensa", afirmando que "o limite de tolerância de Netanyahu (frente às pressões americanas, NDLR) está quase sendo superado".
Ao término de um dia amargo nas relações entre Israel e Estados Unidos, Yaalon afirmou na noite de terça-feira que não "teve intenção alguma de ofender o secretário de Estado" e pediu desculpas.
O chefe da diplomacia americana, "estimulado por uma obsessão incompreensível e por uma espécie de messianismo, não pode me ensinar uma única coisa sobre o conflito com os palestinos", havia dito Yaalon em uma conversa particular citada pelo Yediot.
Para o correspondente diplomático do jornal de esquerda Haaretz, "os estragos causados por essa declarações não afetam apenas Yaalon pessoalmente, mas a segurança de Israel", em razão da importância da cooperação militar com Washington.
O plano americano ;não vale nada;
Os Estados Unidos estão comprometidos a manter em suas vendas de armas ao Oriente Médio "a vantagem qualitativa" de Israel, ao qual fornecem uma ajuda militar anual de 3,1 bilhões de dólares, ou seja, cerca de 20% do orçamento israelense de Defesa.
"O ministro da Defesa Yaalon se tornou aquele que destruiu com pouco esforço o processo de paz", resumiu um especialista do jornal de direita Maariv.
[SAIBAMAIS]Netanyahu se distanciou na terça das afirmações de seu ministro, mas sem repreendê-lo: "Talvez haja divergências com os Estados Unidos, mas elas são sempre sobre o assunto em pauta, não sobre as pessoas".
Yaalon criticou fortemente as propostas americanas para a segurança na fronteira entre a Jordânia e um futuro Estado palestino, no Vale do Jordão.
"O plano americano de segurança que nos foi apresentado não vale o papel em que está escrito. Ele não garante nem a segurança nem a paz", disse, segundo o Yediot.
Durante sua última viagem ao Oriente Médio, concluída em 6 de janeiro, Kerry apresentou às duas partes um projeto de "acordo-quadro" com os principais pontos relacionados a um traçado definitivo das fronteiras, à segurança, ao status de Jerusalém e ao destino dos refugiados palestinos.
Esse projeto também não foi bem recebido pelos palestinos. Nesta quarta, 200 pessoas protestaram em Ramallah, na Cisjordânia, para denunciá-lo, exibindo faixas com os dizeres "As propostas americanas violam o direito internacional e os direitos dos palestinos".
De acordo com os resultados de uma pesquisa divulgados na terça-feira, 76% dos palestinos se opõem a um acordo de paz em que Israel manteria tropas durante dez anos em território palestino.
Do outro lado, segundo pesquisas de opinião divulgadas na semana passada, mais de dois terços dos israelenses se recusam a renunciar a uma presença militar israelense no Vale do Jordão.