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Legado político de Ariel Sharon carece de herdeiro em Israel

A esquerda o critica por ter propiciado a colonização de territórios palestinos ocupados por Israel em 1967, enquanto a direita questiona a retirada das tropas israelenses da Faixa de Gaza em 2005

Jerusalém - O ex-primeiro-ministro de Israel Ariel Sharon, morto neste sábado depois de permanecer oito anos em coma, deixa uma herança política que nem a direita, nem a esquerda israelense podem reivindicar totalmente.

A esquerda o critica por ter propiciado a colonização de territórios palestinos ocupados por Israel em 1967, assim como a desastrosa invasão do Líbano em 1982, enquanto a direita questiona a retirada das tropas israelenses da Faixa de Gaza em 2005, e a evacuação de cerca de 8.000 colonos israelenses que estavam na área.

A ultra-direita israelense e o direitista Likud, antigo partido de Sharon e ao qual pertence o atual primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, nunca o perdoaram por ter "traído" os colonos dessa forma. "Teve seus méritos como militar para a segurança de Israel, mas não esqueceremos o que ele fez em Gaza", declarou recentemente Naftali Bennett, ministro da Economia e líder do partido favorável aos colonos, Lar Judaico, de extrema-direita. "Muitos de nós, incluindo eu mesmo, ficamos enfurecidos com a expulsão dos 8.000 moradores de Gush Katif e os desastrosos resultados para os cidadãos de Israel", disse Bennett. "Uma coisa assim não pode voltar a acontecer nunca mais", ressaltou.

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Sem criticar diretamente Sharon, Netanyahu mencionou em várias oportunidades a tomada de controle de Gaza por parte do movimento islamista Hamas em 2007 para descartar uma retirada massiva da Cisjordânia.

[SAIBAMAIS]A esquerda saudou a retirada de Gaza, mas criticou seu caráter unilateral. Para ela, ao se negar a negociar as condições da retirada com o presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, Sharon enfraqueceu o acordo, e fortaleceu o Hamas. esquerda israelense não pode esquecer que Sharon foi o líder da colonização, que encarnou uma política férrea contra os palestinos antes de se convencer que Israel deveria renunciar a conservar a maior parte dos territórios conquistados durante a Guerra de 1967 se quisesse seguir sendo um estado "judaico e democrático". No plano eleitoral, o partido Kadima, fundado por Sharon em novembro de 2005, após sair do Likud, que se opunha à retirada de Gaza, foi perdendo influência.

Pouco depois do ataque cerebral que deixou Sharon num estado de coma irreversível, em janeiro de 2006, seu sucessor, Ehud Olmert, levou o Kadima a uma vitória espetacular, desbancando o Likud.

Não obstante, em 2009, Netanyahu chegou perto dos resultados do Kadima e formou uma coalizão. Pouco a pouco, o Kadima, que passou à oposição, foi perdendo peso.

Em janeiro de 2013, o Kadima, dirigido pelo ex-ministro da Defesa Shaul Mofaz, perdeu para a formação centrista criada por Tzipi Livni, dissidente do partido. Nenhum dos dois reivindica a herança de Sharon.

Desde que seu estado de saúde se agravou, comentaristas israelenses o comparam a Netanyahu. Assim, Sharon é apresentado como um "estadista" capaz de errar, mas também capaz de arregaçar as mangas para atingir resultados, e Netanyahu como um homem incapaz de fazer frente à pressão contraditória da ultra-direita israelense e dos Estados Unidos.

Hanan Cristal, comentarista da rádio estatal, se perguntou se Netanyahu terá "a audácia de seguir o caminho de Ariel Sharon, aceitando colocar em perigo a sua maioria e seu partido para que o diálogo com os palestinos avançasse".