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Economia francesa pode se transformar em novo doente da Europa

"Não vemos, no futuro próximo, um plano conjunto articulado que permita liberar o potencial de crescimento, indispensável para a redução do desemprego", explicou o economista chefe para a Europa da agência, Jean-Michel Six

Paris - Entre Bruxelas que não acredita na redução dos déficits e a Standard and Poor;s que duvida da queda dos gastos públicos, a reputação da economia francesa sofreu um duro golpe esta semana.

Tanto que levou o economista alemão Holger Schmieding, do banco Berenberg, a afirmar nesta sexta-feira que "cada vez está mais claro que o verdadeiro problema da Europa é França".



A agência de classificação Standard and Poor;s ameaçava há meses reduzir a nota da França de "AA%2b" a a "AA", só que o anunciou oficial nesta sexta-feira significou um balde de água fria para o governo socialista.

A isso se soma a publicação, na terça-feira, pela Comissão Europeia das previsões orçamentárias muito mais pessimistas que as de Paris: o executivo europeu estima que o déficit público francês se situará em 3,7% em 2015 e o governo francê em menos de 3%.

Tanto para a agência de classificação como para a Comissão, o que está em dúvida é o novo mantra do governo: a redução forçada dos gastos públicos.

O ministro francês do Orçamento, Bernard Cazeneuve, não é preciso mais repetir que a recuperação das finanças públicas francesas passa exclusivamente por cortes dos gastos do Estado e o regime da Previdência Social.

"Não vemos, no futuro próximo, um plano conjunto articulado que permita liberar o potencial de crescimento, indispensável para a redução do desemprego", explicou à AFP o economista chefe para a Europa da agência, Jean-Michel Six.

Reduzir a dívida abaixo de 80%

A agência informou que, para aumentar a nota da França, o país terá que dar mostras de "uma melhora da competitividade", ou reduzir seu endividamento abaixo de 80% do Produto Interno Bruto (PIB). Um esforço enorme já que a proporção se aproxima atualmente de 95%.

Os economistas europeus considera que a queda da nota não terá efeitos políticos.

Holger Schmieding prevê que a França, diante de sua queda à "segunda divisão na Europa", acabará por aplicar as reformas necessárias "mas levará tempo, assim como a Alemanha levou para reagir a seus problemas quando ficaram evidentes em 1995", quando o país era considerado doente por causa de seu desemprego e de seu marasmo econômico.

Para este economista, "o maior problema é esta tradição pós-revolucionária francesa de protestar iradamente contra qualquer reforma", mas não considera que a segunda economia da zona do euro seja "candidata a uma crise financeira maior".

Daniel Gros, diretor do Centre for European Policy Studies (CEPS) de Bruxelas, considera também que "no momento, a França representa mais um problema potencial que real", mas pede que mude de rumo se não quiser se ver envolta em "uma dívida que deixará de ser sustentável, no ritmo atual, em 3 ou 4 anos".

"O peso do Estado na economia é muito grande", explica, com um gasto público de cerca de 55% do PIB, ou seja, mais da metade da riqueza gerada a cada ano no país. É 10 pontos maior que na Alemanha.

"O único idioma que os governos compreendem"

Gros alerta que o perigo é que a taxa de risco da França dispare. "Se isso acontecesse, seria de um dia para outro e seria brutal. É um momento que não se pode prever com precisão". "O único idioma que os governos compreendem é o dos interesses", disse Amit Kara, economista em Londres do banco UBS.

Para Kara, "a história recente mostra que os anúncios das agências de classificação não costumam sacudir muito os mercados"

Contudo, o humor desses mesmos mercados pode "mudar da noite para o dia", alerta, e o "detonador poderia ser o descontentamento social" crescente na França.

A próxima semana também não será fácil pois a Comissão prevê se pronunciar na próxima sexta-feira sobre o projeto de orçamento 2014 da França e do restante dos países da zona do euro.