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Le Monde confirma espionagem, mas EUA denuncia informações enganosas

Washington - O serviço de inteligência dos Estados Unidos foi forçado a responder à insatisfação dos governos de França, Alemanha e México sobre a extensão de seu programa de espionagem, garantindo que as notícias sobre o assunto eram "imprecisas e enganosas".

O diretor de Inteligência Nacional, James Clapper, questionou a veracidade das matérias publicadas no jornal francês "Le Monde" esta semana sobre as atividades de inteligência americana.

Questionado pela AFP, o jornal confirmou nesta quarta-feira as informações sobre as operações de espionagem em massa da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) na França.

"A informação de que a NSA realizou mais de 70 milhões de gravações de dados telefônicos de cidadãos franceses é falsa", assegurou Clapper.

"Os Estados Unidos coletam informações para proteger sua nação, seus interesses, e para proteger seus aliados, principalmente, de ameaças terroristas, ou da proliferação de armas de destruição em massa", acrescentou o diretor, concluindo que os EUA "concedem grande importância a sua longa amizade com a França e continuarão cooperando em matéria de segurança e inteligência".

Na segunda-feira, o jornal "Le Monde" revelou detalhes da espionagem telefônica da NSA a cidadãos franceses, com base nos documentos sigilosos vazados pelo ex-consultor de inteligência americano Edward Snowden.

Na terça, "Le Monde" divulgou novas informações sobre as escutas em embaixadas, incluindo a representação da França na sede da ONU, em Nova York. De acordo com o jornal, a NSA fez 70,3 milhões de gravações de dados telefônicos de franceses entre 10 de dezembro de 2012 e 8 de janeiro de 2013.

Em resposta ao governo dos EUA, o "Monde" publicou em sua página on-line nesta quarta "o documento procedente da NSA questionado por Clapper". Trata-se de um "gráfico que descreve a magnitude das vigilâncias telefônicas realizadas na França" - explica o jornal. Esse gráfico "indica claramente que os dados de 70,3 milhões de comunicações francesas foram gravadas pela agência" - insistiu o jornal, ratificando as matérias publicadas no início da semana.

O presidente francês, François Hollande, manifestou sua "profunda rejeição" às "práticas inaceitáveis" do país aliado em uma conversa por telefone com o presidente americano, Barack Obama, e pediu "uma cooperação bilateral" entre os serviços de inteligência.

Em paralelo, a chancelaria francesa convocou o embaixador americano em Paris para pedir explicações.

Alguns observadores e outros veículos da imprensa francesa relativizaram o impacto do caso na relação entre os dois países. O jornal "Le Parisien/Aujourd;hui" escreveu em sua manchete "Paris irritado, mas não muito". Para especialistas, os dois países precisam um do outro na cooperação contra o terrorismo.

-- Alemanha reage à notícia de espionagem --

Em Berlim, o porta-voz da chancelaria alemã afirmou que o telefone celular de Angela Merkel estaria sendo, possivelmente, espionado pelos serviços dos EUA.

"O governo federal obteve informações", segundo as quais o telefone celular da chanceler está sendo espionado pelos serviços americanos, declarou em nota o porta-voz Steffen Seibert.

Merkel conversou com Obama nesta quarta e lhe disse que, se a informação for confirmada, "desaprova totalmente" essas práticas, as quais considera "inaceitáveis".

Berlim pediu uma "explicação imediata" de Washington, completou Seibert.

Em resposta, o presidente Obama garantiu à chanceler alemã que os EUA não espionam suas comunicações. A Casa Branca não desmentiu, porém, as matérias de que espiões americanos registraram, no passado, as chamadas de seu celular.

Na conversa por telefone, "o presidente garantiu à chanceler que os Estados Unidos não estavam espionando, nem espionarão as comunicações da chanceler", anunciou o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney.

-- Investigação "exaustiva" no México --

No último domingo, o jornal alemão "Der Spiegel" revelou que a NSA espionou e-mails do ex-presidente mexicano Calderón a partir de maio de 2010 e, "sistematicamente e durante anos, o governo mexicano".

Na terça-feira, o governo mexicano elevou o tom em sua reivindicação aos EUA pelo esclarecimento das denúncias de espionagem de altos funcionários, entre eles o ex-presidente Felipe Calderón. De acordo com o ministro mexicano do Interior, Miguel Ángel Osorio Chong, o México vai conduzir uma investigação "exaustiva" sobre as atividades de espionagem dos EUA.

"O presidente ordenou uma investigação que irá determinar se existem provas da espionagem americana, e se os cidadãos ou funcionários mexicanos participaram", frisou.

O ministro ressaltou que se investigará a "probabilidade" de que funcionários, ou ex-funcionários mexicanos tenham participado dessas práticas "intencionalmente, ou por omissão, negligência, ou por qualquer outro motivo".

O governo, segundo ele, "revisou e reforçou os mecanismos de segurança das comunicações, dos dados e redes, sistemas de software, codificação e criptografia usados pelo presidente e por todos os serviços de segurança do governo", desde a chegada de Enrique Peña Nieto, à presidência, em dezembro.

O ministro mexicano das Relações Exteriores, José Antonio Meade, de passagem por Genebra, anunciou que convocará em breve o embaixador dos EUA para esclarecimentos sobre a suposta espionagem de e-mails do ex-presidente Felipe Calderón.

"Confrontado com esses novos elementos e com uma resposta (americana) insuficiente e, portanto, inadmissível, o Governo do México enfatiza a necessidade de iniciar (...) a investigação prometida pelo presidente Obama", declarou Meade na terça-feira, em Genebra.

Ele pediu que a investigação seja concluída o mais "rápido possível" para determinar os responsáveis por essas atividades de espionagem.

Em 5 de setembro, o presidente Peña Nieto assegurou que Obama prometeu investigar as acusações de espionagem. No México, opositores e analistas consideraram fraca a primeira reação do governo diante da denúncia do "Spiegel".

O governo do México divulgou apenas um comunicado, pedindo explicações a Washington e reiterando que a prática da espionagem "é inaceitável, ilegítima e contraria o Direito mexicano e o Direito Internacional".