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Presidente egípcio deposto é interrogado e bens de lideranças congelados

Mursi e outros membros da Irmandade Muçulmana são interrogados, em um local mantido em segredo, sobre as circunstâncias de sua fuga da prisão de Wadi Natroun, durante a revolta contra Hosni Mubarak

Cairo - A justiça egípcia interrogou neste domingo (14/7) o presidente deposto Mohamed Mursi sobre sua fuga da prisão no início de 2011, e decidiu congelar os bens de 14 autoridades islamitas, como parte de uma investigação sobre os atos de violência das últimas semanas. Mursi e outros membros da Irmandade Muçulmana estão sendo interrogados, em um local mantido em segredo, sobre as circunstâncias de sua fuga da prisão de Wadi Natroun (a noroeste do Cairo), durante a revolta contra Hosni Mubarak, anunciaram fontes judiciais à AFP.

A investigação, realizada pela Segurança Interna, tenta em determinar principalmente se o movimento foi beneficiado pela ajuda de grupos estrangeiros, como o Hezbollah libanês ou o Hamas palestino, indicaram as fontes. No sábado, fontes judiciais haviam anunciado que o novo procurador-geral, Hicham Barakat, examinaria queixas de particulares contra Mursi e outros membros da Irmandade Muçulmana por "espionagem", "incitação ao assassinato de manifestantes" e "má gestão econômica", em ligação com os eventos das duas últimas semanas. Esse exame pode causar a abertura oficial de uma investigação.

Este mesmo procurador-geral ordenou também, neste domingo, o congelamento dos bens de 14 lideranças islamitas, entre elas o guia supremo Mohamed Badie e mais oito dirigentes da Irmandade Muçulmana. Cerca de cem pessoas morreram em todo o país desde 3 de julho, data da derrubada de Mohamed Mursi pelo Exército em meio a grandes manifestações exigindo a sua saída do poder.

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Os confrontos mais violentos foram registrados no dia 8 de julho, durante um ato pró-Morsi diante da sede da Guarda Republicana, no Cairo, deixando 53 mortos. Mandados de prisão foram expedidos contra o guia supremo da Irmandade Muçulmana e contra outras lideranças da confraria que estariam envolvidas nos episódios de violência daquele dia. Outras 250 pessoas também foram acusadas.

Os dois campos rivais convocaram manifestações para segunda-feira no Cairo, principalmente uma passeata pacífica dos defensores de Mursi em direção à sede da Guarda Republicana. Os partidários de Mursi, contestado por milhões de egípcios por não ter administrado o país e por ter servido apenas aos interesses de seu movimento, protestam há duas semanas diante da mesquita Rabaa al-Adawiya, no bairro de Nasr City, no Cairo.

Na sexta, dezenas de milhares exigiram a restituição do primeiro presidente democraticamente eleito do país. O novo governo, que ignora essas demandas, garantiu que o ex-chefe de Estado está "seguro" e é tratado "com dignidade". Enquanto isso, as novas autoridades se esforçam para formar um governo o mais rápido possível, com o objetivo de manter o plano político estabelecido pelo presidente interino Adly Mansour.

O primeiro-ministro Hazem Beblawi se reuniu neste domingo com os ministros que pretende nomear. O prêmio Nobel da Paz, Mohamed ElBaradei, prestou juramento como vice-presidente encarregado das relações internacionais, e o ex-embaixador em Washington, Nabil Fahmy, afirmou ter aceitado o posto de ministro das Relações Exteriores.

Segundo Beblawi, a composição do governo pode ser anunciada na terça ou na quarta-feira. Ele será constituído de 30 membros, acrescentou, reafirmando que suas prioridades serão restaurar a segurança, garantir o fornecimento de bens e serviços e preparar o processo eleitoral (eleições legislativas e presidencial). O processo de transição elaborado pelo presidente interino prevê legislativas até o início de 2014, após a adoção de uma nova carta constitucional.

A evolução da crise no país mais populoso do mundo árabe é acompanhada com atenção do exterior. O secretário de Estado adjunto americano Bill Burns deve chegar ao Cairo neste domingo para uma visita de dois dias. A chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, se disse "profundamente preocupada", enquanto o primeiro-ministro turco, o islamita Recep Tayyip Erdogan, afirmou que Mursi ainda é o único chefe de Estado legítimo do Egito.

A chanceler alemã, Angela Merkel, pediu neste domingo a libertação de Mohamed Mursi.Ela também defendeu um "processo (político) envolvendo todos os grupos da população do Egito". A organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch (HRW) criticou a investigação realizada até o momento sobre a violência registrada no dia 8 de julho. Ela indicou não ter encontrado "nenhuma prova" de ataque à sede da Guarda Republicana e considerou que os manifestantes rezavam "em calma" quando os tiros começaram.