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Bento XVI, um papa enfermo e cansado optou pela vida de meditação

Primeiro papa alemão da era moderna, Joseph Ratzinger, de 85 anos, substituiu em 2005, aos 78 anos, João Paulo II, um dos pontífices mais carismáticos da história

Cidade do Vaticano - O papa Bento XVI, que nesta quarta-feira (27/2) fez a última aparição pública antes da renúncia definitiva na quinta-feira (26/2) para dedicar-se à oração e meditação, será recordado por esta decisão sem precedentes na história recente da Igreja, após o curto pontificado marcado por muitos escândalos.

Primeiro papa alemão da era moderna, Joseph Ratzinger, de 85 anos, substituiu em 2005, aos 78 anos, João Paulo II, um dos pontífices mais carismáticos da história.

O papado de Ratzinger, que presidiu com mão dura a célebre Congregação para a Doutrina da Fé, antigo Santo Ofício da Inquisição, foi marcado pelo pedido de perdão por décadas de abusos sexuais de religiosos católicos contra menores em vários países e optou pela "tolerância zero" contra os padres pedófilos.


Seu estilo reservado e enfermiço contrasta com os imponentes trajes litúrgicos antigos resgatados dos museus vaticanos e o espetacular anel de Pescador que utiliza. Ao fim dos oito anos no comando de uma Igreja de 1,2 bilhão de fiéis, teve que enfrentar o escândalo do ;Vatileaks;, o vazamento em 2012 de documentos confidenciais à imprensa italiana. O caso colocou em dúvida até mesmo sua liderança como guia da Igreja e demonstrou as intrigas e divisões dentro da Cúria Romana.

[SAIBAMAIS]Segundo a imprensa italiana, um relatório secreto elaborado por três cardeais escolhidos pelo papa "enfermo e sem forças" para investigar o caso terminou por convencê-lo de que era necessário alguém jovem, forte e enérgico para fazer uma limpeza na instituição milenar, o que sem dúvida pesou na decisão de deixar o Trono de Pedro.

Padre desde 1951, Ratzinger passou a maior parte da vida dentro dos palácios vaticanos e teve uma experiência pastoral curta, de 1977 a 1981 em Munique. Nascido em 16 de abril de 1927 em Marktl am Inn, na diocese de Passau, na Baviera, Ratzinger foi ordenado padre em 29 de junho de 1951, nomeado arcebispo de Munique em março de 1977 e proclamado cardeal em 27 de junho de 1977 pelo papa Paulo VI. O pontífice cresceu em uma família muito católica e patriótica. Seu pai era da polícia.

Em 1943, aos 16 anos, foi incorporado, assim como todos os demais seminaristas de sua classe, como auxiliar de defesa antiaérea nazista. Em setembro de 1944, quando atingiu a idade exigida, foi obrigado a entrar para o exército.

Em várias ocasiões, como cardeal e como pontífice, denunciou a "desumanidade" do regime nazista durante a Segunda Guerra Mundial, dissipando assim qualquer suspeita de cumplicidade.

Um teólogo prestigioso

Depois do conflito, no início da década de 50, Ratzinger começou a dar aula de Teologia no Instituto Superior de Fresssing e se tornou um professor brilhante de várias universidades alemãs, incluindo as de Bonn, Münster e Ratisbona.

Participou como conselheiro nos trabalhos do Concílio Vaticano II (1962-1965), que modernizaram e renovaram a Igreja, uma experiência que o marcou profundamente.

Nas lutas dentro da fé católica, Ratzinger foi um fervoroso opositor da "Teologia da Libertação" e no trono de Pedro iniciou uma ofensiva mundial contra o aborto, a eutanásia e a legalização do casamento gay.

O segundo papa não italiano em mais de quatro séculos, eleito pontífice em 19 de abril de 2005, após um rápido conclave, autorizou a missa em latim (em setembro de 2007) e suspendeu em 2009 a excomunhão de quatro bispos integristas do movimento ultraconservador de Marcel Lefebvre, incluindo o britânico Richard Williamson, que negava a existência do Holocausto nazista, o que provocou a revolta da comunidade judaica.

Entre 2007 e 2012 publicou três livros sobre a vida de Jesus, a partir dos dados fundamentais apresentados nos Evangelhos e em outros textos do Novos Testamento.

Nas obras, ele reflete sobre a figura de Jesus Cristo na qualidade de teólogo, um imponente exercício intelectual, que também foi um sucesso internacional de vendas. O papa número 265 da história da Igreja visitou, em quase oito anos de pontificado, quase 20 países, incluindo o Brasil.