Roma - A Itália, atingida pela crise econômica e pelos escândalos de corrupção, realiza na próxima segunda (25/2) e terça-feira (26/2) eleições legislativas cruciais nas quais sua estabilidade política está em jogo. O candidato favorito de centro-esquerda, Pier Luigi Bersani, que por quase um ano gozava de uma cômoda vantagem, pode se ver obrigado a formar uma aliança com o primeiro-ministro em fim de mandato e tecnocrata Mario Monti para poder governar diante do surpreendente avanço no último mês da direita de Silvio Berlusconi e do comediante "antissistema" Beppe Grillo.
Cerca de 47 milhões de italianos foram convocados às urnas para renovar o Parlamento, formado pela Câmara de Deputados (630) e pelo Senado (315), mais quatro senadores vitalícios. Segundo as últimas pesquisas disponíveis, a coalizão de centro-esquerda liderada por Bersani ganharia as eleições com 2,5 a 4,5 pontos de vantagem sobre a direita de Berlusconi, que pode alcançar um empate no Senado, graças aos assentos concedidos, segundo a região.
Mas o clima eleitoral foi ofuscado na semana de Carnaval pela histórica renúncia do papa Bento XVI, e os programas de rádio e televisão se dedicaram quase que exclusivamente à inédita decisão do pontífice. Berlusconi, que baseou toda a sua campanha em aparições em todos os canais de televisão, enaltecendo as suas bases e prometendo a eliminação de impostos, havia conquistado um aumento espetacular com esta estratégia midiática.
"O anúncio do Papa freou a corrente a favor de Berlusconi, lhe tirou visibilidade e espaço midiático", explicou à AFP o cientista político Roberto D;Alimonte. Além disso, a Itália foi atingida nos últimos dias por uma série de escândalos de corrupção que afetaram os partidos políticos tradicionais e favoreceram a figura do chefe de Estado em fim de mandato, Mario Monti, que também aproveitou amplamente a televisão e a internet para denunciar os escândalos, tal como ocorreu em 1992 com "Tangentopoli", que sentou no banco dos réus com mais de 4.000 empresários e representantes de todos os grupos políticos.
[SAIBAMAIS]A esquerda, que contava com 33% a 34% dos votos, conta em conquistar a maioria absoluta na Câmara de Deputados graças ao complicado sistema eleitoral em vigor, mas a aparição inesperada do juiz antimáfia Antonio Ingroia, recém-chegado à política com o movimento Revolução Civil, pode lhe tirar votos, já que se dirige ao mesmo eleitorado.
"O máximo que Bersano pode aspirar é se manter no mesmo nível", considera D;Alimonte. O perfil sério e tranquilo de Bersani é completamente diferente do de seus maiores rivais e, em particular, do comediante Beppe Grillo, símbolo dos indignados, que, com seu Movimento 5 Estrelas, com uma plataforma para reduzir o número de parlamentares e com a exigência dos bancos se responsabilizarem por suas perdas, está canalizando a ira dos jovens contra a classe política.
Grillo, que também promete conceder um salário fixo aos desempregados, ocupa o terceiro lugar, com 14% a 18%. Também é o único que percorreu a península em pleno inverno para realizar grandes comícios e tomar as manchetes dos jornais com suas atropeladas denúncias. "É possível que conquiste 20% dos votos, tal como o partido de Berlusconi", comentou D;Alimonte, ao se referir ao novo fenômeno da política italiana, acusado de populismo.
Por outro lado, a irrupção na política de Monti em dezembro gera perguntas, e embora acumule de 10% a 14%, o chefe de governo em fim de mandato sofre as consequências da crise econômica que atinge a península, com um PIB negativo (-2,2% de 2012). A batalha de Berlusconi junto com a populista Liga Norte pela próspera Lombardia é chave para tomar o controle do Senado, já que esta região, junto com Sicília, Veneto e campanha, concede um elevado número de assentos.
"Grillo rouba votos de Berlusconi e da Liga", sustenta o especialista, que lembra os escândalos que afetaram diversas personalidades da direita, entre eles o influente presidente da região de Milão, o católico Roberto Formigoni do PDL, conectado com importantes círculos de poder. "Isso poderia favorecer a vitória de Bersani nas duas salas do Parlamento", sustenta D;Alimonte. O pior cenário, que todos os editorialistas examinam, é que a Itália se encontre no dia 25 de fevereiro com duas maiorias diferentes na Câmara de Deputados e no Senado.
A Constituição concede o mesmo peso às duas salas do Parlamento e esta possibilidade significaria a temida ingovernabilidade, o que preocupa os mercados e afetaria a terceira economia da Eurozona, muito endividada e em recessão. Os cientistas políticos sustentam que, caso não seja alcançada uma maioria no Senado, existe "um pacto de aço" entre a esquerda de Bersani e os moderados de Monti para governar, com o tecnocrata como ministro da Economia ou na presidência do Senado.