Cairo - O presidente egípcio, Mohamed Mursi, parecia neste sábado (8/12) pronto para fazer concessões frente ao movimento de contestação contra a ampliação de seus poderes e contra um projeto de Constituição, após um apelo do Exército ao diálogo para evitar um "desastre" no país.
O primeiro-ministro Hicham Qandil declarou que um comitê de seis especialistas havia sido encarregado de "modificar" o decreto de 22 de novembro por meio do qual o presidente islamita ampliou seus poderes e os colocou fora do alcance de qualquer recurso à justiça, desencadeando a pior crise política desde sua eleição no final de junho.
Os trabalhos do comitê devem terminar neste sábado à noite ou no domingo (9) de manhã, acrescentou o premier em uma entrevista concedida a uma rede de televisão privada.
Mursi também pediu "que seja encontrada uma solução jurídica que permita adiar o referendo" sobre um projeto de Constituição também muito criticado pela oposição, previsto para 15 de dezembro, acrescentou Qandil.
Esse anúncio foi feito pouco depois de a principal coalizão opositora, a Frente da Saudação Nacional (FSN), ter pedido a manutenção do movimento de protesto até que suas "reivindicações legítimas e pacíficas se concretizem".
O FSN também fez uma ameaça de greve geral.
Mas as formações islamitas que apoiam Mursi, entre elas o poderoso movimento da Irmandade Muçulmana do presidente, aumentaram o tom, recusando categoricamente qualquer adiamento do referendo constitucional.
Durante esta jornada repleta de reviravoltas, o influente Exército egípcio saiu das sombras e fez um apelo para que governo e oposição dialoguem para evitar "um desastre" no país, algo que as Forças Armadas não permitirão.
Nos últimos dias, o Exército garantiu a proteção do palácio presidencial do Cairo, que foi alvo de manifestações, sempre deixando claro que não atuaria com violência.
O Exército desempenha tradicionalmente um papel importante no Egito, mesmo que Mursi, primeiro presidente civil do país, o tenha deixado menos presente em agosto, aposentando seu chefe, o marechal Hussein Tantawi.
"Caminho obscuro"
Em seu comunicado, o Exército alertou que, sem diálogo, o Egito pode entrar em "um caminho obscuro que conduziria a um desastre", algo que a instituição militar "não permitirá". Ele pede também o "respeito às regras democráticas".
A oposição fez da anulação do decreto uma de suas principais reivindicações, junto com o adiamento da consulta sobre a Constituição.
Os manifestantes exigem mais tempo, o que permitiria, segundo eles, elaborar um texto mais consensual. Eles consideram que o projeto atual pode abrir caminho para uma islamização maior da legislação e que não oferece garantias para as liberdades, principalmente de expressão e de religião.
Na quinta-feira (6), em um discurso à nação, Mursi se mostrou firme sobre esses dois pontos, mas convidou a oposição para o diálogo.
No dia seguinte, o vice-presidente, Mahmud Mekki, anunciou que um adiamento do referendo podia ser discutido, com a condição de que a oposição não fizesse uso desse adiamento para tentar anular o texto na justiça.
Exigindo uma mudança no texto, pequenos grupos de manifestantes continuam se reunindo nas imediações do palácio presidencial, epicentro das grandes manifestações de egípcios favoráveis e contrários a Mursi nos últimos dias, e colocada sob forte proteção de soldados e tanques, que bloqueiam o acesso ao prédio.
Mais de 10.000 opositores se reuniram diante da Presidência na sexta. Vários deles chegaram a cruzar a cerca de arame farpado para se aproximar do palácio, mas não houve incidentes maiores.
Confrontos entre manifestantes pró e anti-Mursi haviam deixado de quarta para quinta-feira sete mortos e centenas de feridos nas proximidades do palácio.