Sittwe - Sessenta e quatro pessoas perderam a vida nos confrontos registrados nesta semana entre budistas e uma minoria muçulmana do oeste de Mianmar, diante da inquietação crescente da comunidade internacional, que teme pelo processo de reformas no país.
O número de mortos, que inicialmente era de 112 pessoas, foi revisado em baixa pelo governo. "Cometemos um erro no balanço", explicou Win Myaing, porta-voz do governo do estado de Rakhine. "O balanço de mortos é de 34 homens e 30 mulheres", acrescentou.
Após várias semanas de aparente tranquilidade no estado de Rakhine, a violência entre budistas da etnia rakhine e rohingyas, uma minoria muçulmana considerada pela ONU uma das mais perseguidas no mundo, voltaram a explodir nos últimos dias. Ao menos 75.000 pessoas, em sua grande maioria rohingyas, foram deslocadas na primeira onda de violência. Nos últimos dias milhares chegaram a pé ou de barco aos acampamentos nos arredores de Sittwe, capital do estado de Rakhine. Os acampamentos estão abarrotados e faltam alimentos, assim como cuidados médicos para os deslocados.
A crise já é problemática para o presidente Thein Sein, que multiplicou as reformas desde que chegou ao poder, em março de 2011. O ex-general lançou negociações com as rebeliões étnicas, algumas das quais estão em conflito com o poder de Naypyidaw desde a independência, em 1948. Mas a violência no estado de Rakhine é de outra natureza. Em um dos estados mais pobres do país, há décadas as duas comunidades se opõem. Desde junho, quando os confrontos tiveram início, mais de 150 pessoas morreram, segundo os números oficiais, que muitas organizações estimam ser menor que a realidade.
[SAIBAMAIS]Os 800.000 rohingyas vivem confinados no estado de Rakhine e não formam parte de grupos étnicos reconhecidos pelo regime de Naypyidaw, nem por muitos birmaneses, que os consideram, na maioria das vezes, como imigrantes de Bangladesh ilegais e não escondem sua hostilidade em relação a esta parcela da população. Mas a comunidade internacional se inquieta por estes muçulmanos, que falam um dialeto similar ao utilizado no vizinho Bangladesh.
"Os ataques de grupos de autodefesa, as ameaças dirigidas e a retórica extremista devem ser detidos", afirmou um porta-voz do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em declarações transmitidas a Yangun. "Se isso não for feito, a estrutura social pode se danificar de forma irreparável e o processo de reforma e abertura realizado atualmente pelo governo pode ficar em perigo", acrescentou. Os Estados Unidos convocaram "as partes a agir com moderação e a colocar fim imediatamente a todos os ataques" e exigiu esforços para "alcançar a reconciliação nacional em Mianmar".
Nesta sexta-feira, o jornal oficial em inglês New Light of Myanmar publicou na capa um comunicado de Thein Sein no qual prometia voltar a instaurar a tranquilidade. "A comunidade internacional observa o progresso em andamento em Mianmar com interesse", ressaltou. "Indivíduos e organizações tentam manipular (...) serão tomadas medidas legais contra eles", acrescentou. Neste contexto, as principais organizações muçulmanas de Mianmar cancelaram as celebrações do Eid al-Adha, uma das principais festas do islã que começou nesta sexta-feira.
Por sua vez, a violência provocou o retorno do fantasma do exílio massivo dos rohingyas, especialmente em direção à Malásia, em um volume maior em relação aos anos anteriores. "Já constatamos um aumento da quantidade de barcos que partem não apenas de Mianmar, mas também de Banghadesh", afirmou à AFP Vivian Tan, porta-voz da Agência para Refugiados da ONU. Bangladesh, que em junho interceptou vários barcos de refugiados rohingyas, anunciou que reforçará suas patrulhas fronteiriças para impedir a chegada de mais embarcações.