Cairo - Os jovens "revolucionários" egípcios que provocaram a queda do regime de Hosni Mubarak chegam à eleição presidencial desta semana com profundas divergências sobre a maneira de dar novo impulso às suas ideias.
Muitos afirmam estar cansados de lidar com "o que resta" do antigo regime embora continuem reivindicando o levante, segundo eles, lamentavelmente "confiscado" pelo Exército e pelos islamitas.
Quinze meses depois da renúncia de Mubarak, a maioria deles está disposta a voltar a sair às ruas, mas estão divididos na hora de eleger um candidato que os represente.
Esraa Abdel Fatah, de 33 anos, criou em 2008 uma página no Facebook chamada "6 de Abril", para apoiar uma greve trabalhista, que deu lugar a um dos movimentos que impulsionaram a mobilização contra Mubarak.
[SAIBAMAIS]A jovem explicou que é apenas "membro honorário" do movimento dos Jovens de 6 de Abril, mas que "concorda com seus atos e os apoia".
"É lógico que há divisões que nos enfraquecem, mas isso se deve ao momento" atual de transição, afirmou, dizendo ser "otimista, ainda que parte do antigo regime continue em pé".
"Com o novo presidente, começaremos o verdadeiro período de transição. O povo egípcio se prepara" para que assim seja, acrescentou.
Já há algumas semanas, os revolucionários se perguntam se é melhor participar das eleições presidenciais e, se o fizerem, em que candidato votar.
Esraa Abdel Fatah irá votar em Hamdeen Sabahi, um nacionalista árabe. Wael Ghonim, que criou outra página no Facebook que incitou a mobilização contra Mubarak, optou por um islamita moderado, Abdel Moneim Abul Futuh.
Por outro lado, Mohamed Waked, antigo militante socialista, escolheu o boicote. "Sei que somos minoritários e que as pessoas não vão aderir ao boicote, mas temos que denunciar estas eleições vergonhosas", disse.
Também há divergências sobre o modo de atuar frente ao Exército ou sobre a realização de novas manifestações, poucas semanas antes da transferência do poder a um presidente civil.
"Um revolucionário laico não deveria ir jamais a uma manifestação ou a um debate iniciado pelos islamitas (...) Quando o lugar está cheio da nossa gente, eles se vão e nos deixam em meio aos distúrbios e às prisões", escreveu o blogueiro Mahmud Salem, comentando atos de violência que deixaram mortos, após uma manifestação que os islamitas começaram no início de maio.
"Talvez (...) necessitemos de uma nova estratégia. Talvez tenhamos que suspender as negociações de uma vez por todas, já que deixaram de ser úteis para se transformarem em uma armadilha", acrescentou.
Para Mohamed Waked, é preciso ser "solidário com qualquer manifestante pacífico hostil ao exército".
Em longo prazo, "as divisiões (...) não diminuem o peso dos revolucionários", aponta Ezzedin Shukri-Fishere, da Universidade americana do Cairo.
"É só comparar a revolução no Egito com a ocorrida na França em maio de 1968. Os estudantes não têm necessidade de tomar o poder, já que conseguiram mudar as mentalidades (...) Os milhões de jovens egípcios que constituem a base do movimento não desapareceram", explica.