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'Indignados' voltam às praças da Espanha em seu primeiro aniversário

MADRI - Milhares de ;indignados;, o movimento social nascido há um ano em protesto contra a crise econômica, os políticos e os excessos do capitalismo, voltaram às praças da Espanha neste sábado, no pontapé inicial de quatro dias de mobilizações para demonstrar que seu espírito continua vivo.
[SAIBAMAIS]
Sob o lema "Tomar as ruas", os ativistas, em sua maioria jovens mobilizados através das redes sociais, convocaram concentrações em 80 cidades, entre elas Madri e Barcelona.

"Estamos aqui porque é necessária uma mudança global, porque a indignação não parou. Continuamos indignados com as políticas de austeridade que a elite econômica nos impõe", afirma em Madri Víctor Valdés, um estudante de filosofia de 21 anos. A frase "Juventude sem futuro" estampa sua camisa.

Em um país afundado mais uma vez na recessão, com uma taxa de desemprego de 24,44%, que chega a 52% entre os jovens, o governo conservador de Mariano Rajoy impõe já há seis meses medidas de rigor para poupar 30 bilhões de euros, com cortes que incluem setores como a saúde pública e a educação.

Graças ao movimento surgido em 15 de maio passado, "pouco a pouco a sociedade foi abrindo os olhos", afirma Noelia Moreno, de 30 anos, uma das participantes do protesto que, inspirado nas manifestações da primavera árabe, surpreendeu o mundo.

"Acredito que algo mudou na mentalidade das pessoas, não é algo muito tangível agora, mas foi plantada uma sementinha que no futuro vai poder ser vista", assegura.

É consciente, no entanto, da necessidade de manter o movimento vivo. "É uma corrida de longa distância, ninguém pode mudar todo um sistema político em um dia, nem em um ano, isso leva tempo", afirma.

Manter este impulso é precisamente o que os "indignados" buscam neste primeiro aniversário, que durante quatro dias dará origem a debates e assembleias populares nas praças de toda a Espanha.

Carregando uma bandeira que proclamava "O povo é a solução. Voltemos às praças, continuemos nas ruas", cerca de 35 mil pessoas, segundo a Guarda Municipal, marcharam por Barcelona e outras cidades do país, entre elas Madri.

Sob um sol forte, centenas de pessoas, muitas com a camiseta verde do movimento contra os cortes na educação, partiram no início da tarde dos subúrbios do sul de Madri, precedidos por uma bandeira que dizia "O problema é o sistema. Rebelem-se".

Em meio ao som de tambores e de gritos de "Assim, assim, nem um passo para trás, contra os cortes, luta social", seis grupos de madrilenhos partindo de diferentes pontos da capital partiram em direção à emblemática Porta do Sol.

Foi nesta praça onde se instalou há um ano um acampamento improvisado de barracas e sacos de dormir que, com seu refeitório, sua creche e suas bibliotecas, converteu-se no símbolo da revolta popular contra a crise, inspirando movimentos similares em outros países.

Para marcar este aniversário, também foram convocadas manifestações em cidades como Paris, Atenas, Nova York ou Rio de Janeiro.

Mas todos os olhares se voltarão para a Porta do Sol, já que as autoridades espanholas advertiram que não serão permitidos novos acampamentos e só autorizaram as concentrações até as 22h00 locais (17h00 de Brasília).

"Para além destas horas o que se estaria fazendo é violando a lei", afirmou a vice-presidente do governo, Soraya Sáenz de Santamaría. "Evidentemente não vão ocorrer acampamentos porque são atos ilegais", assegurou o ministro do Interior, Jorge Fernández Díaz.

Os "indignados" preveem, no entanto, realizar um minuto de silêncio no "Sol" à meia-noite e depois alguns podem tentar ficar, criando uma situação de tensão com a polícia, que mobilizará cerca de 1.500 policiais antidistúrbios.

"Não será um acampamento, e sim uma assembleia permanente", explica Luis, porta-voz do movimento, esperando que esta fórmula lhes permita ficar na praça até terça-feira, quando os "indignados" comemoram seu primeiro aniversário.

Desde que o acampamento do Sol foi desmantelado, no dia 12 de junho do ano passado, o movimento perdeu visibilidade nos meios de comunicação, mas seguiu vivo nas redes sociais, nas assembleias de bairro e na luta contra a exclusão, embora com menos seguidores.

"Os que permaneceram são os mais conscientes, atuando em ações setoriais, como, por exemplo, opondo-se aos despejos", afirma Antonio Alaminos, professor de sociologia da Universidade de Alicante.

Efeito mais concreto da mobilização dos "indignados", o novo salto dado pela Plataforma de Afetados pelas Hipotecas (PAH), que desde 2009 luta contra o despejo de famílias endividadas --muitas delas de imigrantes--, conseguiu nos últimos meses cancelar ou adiar dezenas de expulsões.