Florença - Os aromas dos perfumes inebriam o visitante já na soleira da antiga farmácia de Santa Maria Novella, uma célebre instituição florentina que abastecia, antigamente, Catherine de Médicis com pequeninos frascos misteriosos e, nos dias atuais, estrelas como Monica Bellucci.
Mesmo se a "Officina Profumo-Farmaceutica di Santa Maria Novella" (seu nome oficial) comemore este ano 400 anos, seu nascimento remonta a 1221, quando frades dominicanos começaram a cultivar ervas medicinais destinadas a preparar poções, bálsamos e pomadas. A fama desses produtos ia longe e, em 1612, a farmácia abriu suas portas ao público sob o patrocínio da família Médicis, que se tornou embaixadora da marca junto a cortes estrangeiras.
Por ocasião de seu casamento com Henrique II, Catherine de Médicis (1519-1589) levou na bagagem vários frascos de um perfume especialmente concebido para ela, à base de bergamota, "L;eau de la Reine", a água da rainha, que fez furor na corte da França, mas que esteve, também, na origem de uma nova técnica revolucionária.
"Antes, misturava-se as essência com óleo ou vinagre, mas os monges tiveram a intuição de utilizar logo o álcool. "L;eau de la Reine" foi o primeiro perfume célebre em toda a Europa a ser produzido com uma base de álcool", conta Gianluca Foà, um gigante de olhos azuis, gerente comercial da casa. Esta água de colônia faz ainda parte dos produtos perenes responsáveis pelo sucesso desta casa discreta, mas florescente: em 2011, sua cifra de negócios teve um salto de 37%.
Hoje, a farmácia parece imutável com suas salas soberbas decoradas de afrescos em pleno centro de Florença, com vista aberta para o claustro secular do convento.
As vitrines e o balcão não passaram por nenhuma mudança desde 1612, mas os dominicanos tiveram que partir em 1886 por ocasião do confisco dos bens da Igreja pelo Estado italiano, que revendeu a farmácia ao sobrinho do último diretor dominicano. Quatro gerações desta família se sucederam na administração.
Hoje, 80% dos clientes da farmácia são estrangeiros, a exemplo de Sabrina, uma chinesa de Sichuan de tez diáfana: "pensei que fosse apenas uma butique antes de entrar, mas é fabulosa", extasia-se ela diante dos afrescos que enfeitam a farmácia.
Cada nacionalidade tem seu produto fetiche: creme de calêndula para os chineses, pastilhas de hortelã-romana (Balsamita major) para os japoneses, ;Idralia cream; para os coreanos... Além da loja histórica, a farmácia incorporou a ex-igreja adjacente de San Niccolo e sua suntuosa sacristia decorada de pinturas de Mariotto di Nardo (século XIV), uma peça transformada, hoje, em museu-biblioteca.
Sobre as prateleiras estão empilhados cremes de beleza, perfumes, tisanas, licores e velas, cuja qualidade e embalagens incomuns em sua elegância fazem o orgulho da casa, guardiã da tradição e proprietária de suas próprias plantações de ervas medicinais.
Aparecimento num James Bond
No laboratório, instalado numa área imaculada de 4.500 m2 a três quilômetros da loja, a maior parte das operações são realizadas à mão, desde a moldagem des sabonetes, passando pela decoração das velas e as etiquetas. Detalhe significativo: como acontece com os queijos famosos, os sabões de romã secam ainda hoje durante dois meses em grandes armários.
Uma qualidade discreta que seduziu os grandes nomes de ontem e faz o mesmo com os famosos de hoje: os poetas Dante e Lord Byron, as atrizes Penelope Cruz e Monica Bellucci, a princesa Caroline de Mônaco...
Nenhum centavo é investido em publicidade: seus aparecimentos em filmes de sucesso como "Hannibal", com Anthony Hopkins, ou "Casino Royale", o James Bond de 2006, são suficientes para manter a notoriedade da casa e atrair os apreciadores nos 200 pontos mundiais de venda da marca, de Auckland a Hong Kong.
"Hoje, os clientes da ;Officina Profumo-Farmaceutica di Santa Maria Novella; são mais e mais jovens! E isto é bom: eles transmitem bastante seu entusiasmo por nossos produtos que, com isto, vivem mais tempo " alegra-se Eugenio Alphandery, presidente da loja. Além disso, graças à complexidade de sua elaboração e à carestia das matérias-primas, os produtos da farmácia dissuadem as falsificações. Este savoir-faire único tem um preço: uma água de toalete custa 80 euros e um pot-pourri, a especialidade da casa, não sai por menos de 15 euros. Os que estiverem sem dinheiro saem de lá com uma caixinha de pastilhas de cinco euros.