Santiago - Os incêndios florestais no sul do Chile tiveram uma consequência trágica com a morte de sete bombeiros e agora têm uma conotação ética, com a explícita suspeita do governo de que um grupo radical mapuche estaria por trás de algum dos sinistros.
Os bombeiros morreram na quinta-feira após ficarem presos pelas chamas quando combatiam um incêndio na comunidade de Carahue, na região de La Araucanía, cerca de 700 km ao sul de Santiago.
Todos foram contratados pela Florestal Mininco para combater um incêndio. Segundo relatou o único sobrevivente, Héctor Herrera, o grupo ficou preso por conta das chamas.
"Quando quis sair, não pude, voltei e havia chamas por todos os lados. A única chance era me molhar com a água do cantil e atravessar o fogo", relatou.
Em hospitais da região havia ainda dois bombeiros feridos, apesar de nenhum deles correr risco de morrer.
Após confirmar a morte dos bombeiros, o presidente Sebastián Piñera denunciou uma "intencionalidade criminal" no início desse incêndio e de outros sinistros registrados anteriormente nas regiões vizinhas de El Biobío e El Maule, e disse que por trás deles "escondem-se condutas de natureza terrorista".
Piñera disse contar com informações de empresas florestais, segundo as quais tanto no incêndio que arrasou a fábrica de papéis da Celulose Arauco - na região de El Biobío na segunda-feira passada - como no fundo da Florestal Mininco, houve múltiplos focos simultâneos.
O prefeito de Carahue, Pedro Vera, e o comandante dos bombeiros da comunidade, Héctor Rebolledo, apontaram no entanto para um descuido enquanto se confeccionava lenha e a uma onda de calor pouco comum, fortes ventos e uma forte seca.
"Não existe dúvida de que isto não foi fruto do azar ou da natureza, mas da intencionalidade humana", afirmou nesta sexta-feira o ministro do Interior, Rodrigo Hinzpeter.
Na quinta-feira, o ministro apontou diretamente suas suspeitas sobre o grupo radical Coordenadora Arauco Malleco (CAM), que reivindica a cultura mapuche, a maior etnia originária do Chile, e que na véspera assumiu uma série de ataques incendiários a veículos e um helicóptero na mesma região.
"A CAM reivindicou o atentado contra um helicóptero florestal e pouco depois houve muitos incêndios; as coisas no final começam a se encaixar, mas eu não vou fazer conjecturas", disse Hinzpeter, que nesta sexta-feira apresentou uma ação criminal na qual invocou uma severa lei antiterrorista, que data da ditadura de Augusto Pinochet, e endurece as penas em relação à legislação.
Após essa decisão, a atenção centrou-se no conflito étnico latente nas regiões de Biobío e La Araucanía, onde estão a maioria das comunidades mapupches, reduzidos hoje a cerca de 700 mil indivíduos, de uma população total de 16 milhões de habitantes, com níveis maiores de pobreza que o restante do país.
Os mapuches exigem direitos ancestrais de posse de terras, hoje em mãos privadas. Em meio a essa exigência, protagonizam frequentes confrontos com a polícia, que deixaram uma dezena de mapuches mortos. A Justiça, no entanto, condenou alguns indígenas pelos ataques incendiários e roubos, apesar de não ter conseguido imputar a nenhum deles uma "conduta terrorista".
O mapuche Héctor Llaitul, chefe da CAM, cumpre pena de 14 anos de prisão pelo ataque a um procurador e por roubo de madeira.
No entanto, o procurador nacional, Sabas Chahuán, pediu "prudência" ao governo na hora de apontar responsáveis e uma representante mapuche afirmou que por trás dessa acusação está a intenção de militarizar essa região.
"Isso serve ao governo para justificar a militarização da região", afirmou à emissora chilena a representante mapuche, Natividad Llanquileo.
Nesta semana, outro incêndio afetou o parque nacional Torres del Paine, na Patagônia chilena, arrasando 15 mil hectares de um local declarado reserva da biosfera pela Unesco.
Neste caso, um israelense foi acusado de causar o sinistro por conduta negligente, mas arrisca ter de cumprir no máximo 60 dias de prisão e pagar 300 dólares de multa, em meio à lei das florestas.