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Civis exigem transição de poder e entram em choque com tropas no Egito


Menos de 24 horas após a queda do ditador egípcio Hosni Mubarak, em 11 de fevereiro passado, o Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF, pela sigla em inglês) prometeu ;uma transição pacífica a uma autoridade civil eleita, para a construção de um Estado democrático livre;. A oito dias das eleições parlamentares, a demora do governo militar transitório de repassar o poder deflagrou protestos no Cairo e em três cidades do Egito.

Na capital, a Praça Tahrir ; a mesma que serviu de acampamento para uma multidão, à espera do fim do regime ; transformou-se em campo de batalha. Às 11h de sábado (7h em Brasília), as forças de segurança investiram contra 5 mil manifestantes. Somente anteontem, sete pessoas morreram e mais de 750 pessoas haviam sido feridas nos confrontos. Os ativistas não abandonaram o local e foram novamente surpreendidos pelo Exército.

Até o fechamento desta edição, nove civis tinham morrido e 1.194 sofreram algum tipo de lesão nos dois dias de confronto. Também foram registrados incidentes em Aswan (sul); em Alexandria e em Suez, às margens do Mar Vermelho. Nessas cidades, três policiais e sete civis ficaram feridos. O SCAF realizou uma reunião de emergência para se antecipar às consequências da repressão e para traçar uma estratégia de segurança para as eleições. Médicos informaram à agência France-Presse que quatro dos sete mortos ontem em Tahrir foram atingidos por balas reais.


Manifestantes

Por telefone, o professor universitário aposentado Taha Saif Allah, de 51 anos, contou ao Correio que chegou à Praça Tahrir às 17h de ontem. Estava acompanhado do filho, Shehab Saif, e do sobrinho. Dez minutos depois, as tropas começaram a reprimir os manifestantes, que exigiam a saída do marechal Hussein Tantaui, líder do SCAF. ;Carregávamos apenas tecidos, canetas, bandeiras, máscaras e uma solução para minimizar o efeito de gás lacrimogêneo. Estávamos lá pacificamente, apenas para apoiar as pessoas que ficaram feridas ontem (sábado);, relatou. ;Eu vi os paramilitares carregarem tudo o que você pode imaginar: balas de borracha, granadas de gás lacrimogêneo e bastões. Testemunhei um jovem ser espancado até a morte. Seu corpo foi carregado por colegas, atacados pelas forças. Os soldados destruíram os hospitais de campanha erguidos na praça para atender os feridos;, acrescentou.

Shehab disse à reportagem que havia sido atingido no ombro por duas balas de borracha, no sábado. ;Também sofri sufocamento e alguns amigos foram alvejados nos olhos com a mesma munição;, descreveu. O estudante não se intimidou. ;Decidi vir hoje (ontem) a Tahrir para continuar apoiando o povo contra a violência da polícia. E seguirei protestando, até que a SCAF entregue a autoridade aos civis.;

A jornalista britânica Bel Trew se lembra de quando a multidão começou a gritar ;Jaish!” (;exército;, em árabe). ;As tropas encurralaram os manifestantes. Eu corri para um prédio e vi os soldados batendo em ativistas. Presenciei seis pessoas inconscientes;, contou, por telefone. De acordo com a tevê Al-Jazeera, as forças conseguiram esvaziar a praça por algumas horas. No início da noite, 3 mil egípcios voltaram ao local.