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Com dinamismo, Hillary Clinton muda as relações internacionais dos EUA


;Em cada tentativa, o caminho mais provável para os homens inteligentes é tentar a persuasão primeiro;, afirmava Publio Terêncio, um poeta da Roma Antiga. A famosa frase foi usada por Hillary Rodham Clinton em seu discurso de posse como secretária de Estado. Ela fez questão de completar o preceito: ;A mesma verdade vale para as mulheres;. A inspiração da chefe da diplomacia dos Estados Unidos parece ter dado certo. Em 36 meses, ela mudou a política externa do país e foi uma grande protagonista no cenário internacional, especialmente nos maiores impasses ; como a crise na Líbia e o vazamento de importantes informações diplomáticas pelo site WikiLeaks. Persistente, apostou alto no diálogo. Ela faz questão de discutir e não economiza esforços para debater até conseguir. Já é considerada a secretária que mais viajou durante seu mandato. Foram 57 dias em trânsito por 93 países. Hillary passou de primeira-dama para líder mundial e ainda tem muitos desafios pela frente.

Conhecida pela ética no trabalho e pela incansável disposição, a democrata de 64 anos assumiu o posto de comandante da política externa americana com força para mudar o rumo das coisas e pronta para deixar sua marca na história. O governo anterior enfrentou uma grande crise contra terroristas, iniciou duas guerras e conquistou inimigos. Ao lado do presidente Barack Obama, a nova chefe trouxe outra dinâmica para o Departamento de Estado. ;Nós precisamos usar algo que é chamado de ;poder inteligente;, com uma gama de ferramentas à nossa disposição, diplomática, econômica, militar, política, legal e cultural, usando a arma correta ou uma combinação delas para cada situação;, declarou a secretária, durante sua nomeação. O diálogo e a parceria com outros países entraram em pauta.

Para começar, Hillary fez um trabalho de campo. Seja para participar de uma importante reunião na Europa sobre a crise na Líbia ou para uma visita de cortesia em alguma nação na América Latina, a secretária não mediu esforços para estar presente no centro e no calor dos acontecimentos. Sua equipe trabalha 24 horas por dia, e o avião do Departamento de Estado é um verdadeiro escritório, no qual despacha como se estivesse em Washington. É um trabalho com poucos intervalos. Este ano, por exemplo, logo depois de passar réveillon com a família, ela partiu rumo a Brasília para a posse de Dilma Rousseff. Ficou na capital federal por quatro horas apenas, roubou a cena durante o encontro com o venezuelano Hugo Chávez ao cumprimentar a nova presidente e deixou sua marca. A presença dela, ainda que rápida, foi importante para estabelecer um novo tipo de relação bilateral entre o Brasil e os EUA. Como secretária, Hillary sabe a importância disso.

Qualidades

Para Thomas Shannon, embaixador norte-americano no Brasil, Hillary trouxe mudanças para a diplomacia de seu país e mais dinamismo nas relações políticas e internacionais. ;O importante, do meu ponto de vista, é a combinação de sua capacidade política, sua inteligência, sua habilidade diplomática, com sua experiência de primeira-dama, senadora e advogada. Ela conta com uma boa rede de apoio no Senado e tem uma excelente relação com o presidente. Além disso, conseguiu motivar e inspirar todo o Departamento de Estado. Em quase três anos de trabalho, ela já mostrou uma energia enorme, como se fosse uma maratonista, alguém que pode correr muitos quilômetros e não cansa. Trabalha com força e energia;, aponta o diplomata.

Durante a negociação sobre a crise na Líbia, em março passado, Hillary foi essencial para acalmar os ânimos de alguns países que se opunham à intervenção militar, e mostrou o poder de tomar decisões. Também participou ativamente da sucessão presidencial no Haiti, reuniu-se com os principais candidatos e supervisionou a ajuda dos EUA. A secretária e sua equipe também voltaram a estabelecer um diálogo com a Coreia do Norte. Agora, ela se movimenta nos bastidores em prol de novas sanções contra o Irã, depois da divulgação do relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) que revelou os planos de Teerã para a construção de uma bomba atômica. ;Sem dúvida, parte do seu estilo é o engajamento, e ela viajou mais do que qualquer outro secretário de Estado. Isso indica esse compromisso de engajamento. Além de ter a capacidade de tomar decisões difíceis e de implementá-las ; como no caso da crise do governo líbio ;, houve um momento em que o diálogo não ia funcionar e ela precisou agir;, afirma Shannon.

A experiência de Hillary na Casa Branca e no Senado ajudou em seu trabalho de negociação no Departamento de Estado. Ela não apenas ganhou o respeito internacional como também dos norte-americanos. ;Ela tem feito um trabalho extraordinário. Especialmente com as demonstrações e as vozes que escutamos neste ano do outro lado do mundo, com a Primavera Árabe, que teve o seu apoio e encorajamento. Ela tem sido honesta, forte e aberta a todos os tipos de diálogo. Eu acredito que as pessoas a respeitam porque ela serviu o nosso país durante muitos anos com diversas capacidades e sabe se comunicar. Não há dúvida de que ela recebeu muito mais crédito por estar nesta posição e por tudo que já conseguiu;, comenta Gemma Puglisi, professora do Departamento de Comunicações Públicas da American University em Washington.

As escolhas de Hillary influenciaram sua carreira profissional. Casada com Bill Clinton, ela assumiu um papel ativo ao lado do marido e manteve a postura quando uma crise atingiu o governo. Durante o famoso caso com a estagiária Monica Lewinsky, a então primeira-dama se manteve ao lado do marido, sem deixar o escândalo enfraquecê-lo, pública e politicamente. Anos depois, ela estava novamente em Washington para assumir o mandato de senadora e seu próprio comando político. Em 2008, embarcou em uma campanha eleitoral acirrada contra Obama. Perdeu as primárias do partido, mas não o prestígio. ;Ela tentou se tornar presidente e não conseguiu, mas manteve a postura e ficou feliz em servir ao país de outra forma. Ela é mãe, esposa, advogada, apoiadora dos direitos humanos. Ela entende como Washington funciona e a diplomacia. Além disso, pode contar com o apoio de outros países. Ela é, literalmente, a pessoa certa para esse trabalho;, elogia Puglisi.

Casa Branca

Hillary chegou a admitir recentemente que não tinha aspirações de se tornar presidente e nem tinha certeza se ficaria no cargo, caso Obama fosse reeleito. Mas será difícil deixar o poder. Uma possível candidatura em 2016, quando ela estiver com 69 anos, foi descartada no começo deste ano. A chefe da diplomacia americana acredita que já deixou sua marca na história e pretende se dedicar à família e ao trabalho com caridade, provavelmente ao lado do marido. ;Eu acredito que com tantas pessoas que a apoiam e a fazem seguir em frente, ela deve se candidatar mais uma vez. Ela seria uma ótima presidente e a primeira mulher a comandar a Casa Branca;, afirma a especialista da American University. Uma pesquisa feita pela revista Time, no mês passado, mostrou o poder da democrata entre os americanos. Hillary derrotaria facilmente os candidatos republicanos nas eleições de 2012 ; teria 55% contra 38% para o atual favorito da oposição, Mitt Romney. Enquanto Obama aparece tecnicamente empatado, com 46 a 43%.

Para Nichola Gutgold, professora de Comunicação da Penn State University e autora de dois livros sobre a ex-primeira-dama Paving the way for Madam President e Almost Madam President (nenhum foi publicado no Brasil), ainda há chances de a secretária voltar a disputar a Presidência. ;Uma de suas grandes qualidades e características é a versatilidade, a habilidade de exercer uma grande variedade de papéis retóricos. Hillary Clinton está finalmente ganhando reconhecimento pelas habilidades de comunicação que ela exibiu quando concorreu à Casa Branca, em 2008. Ela está mudando a diplomacia americana por ser uma pessoa conhecida no resto do mundo, e as pessoas querem ter contato com ela;, observa a especialista.

Nas alturas

; Hillary Clinton viaja pelo mundo em um Boeing 757 da Força Aérea dos Estados Unidos, equipado com gabinete móvel e em contato permanente com Washington. Ela já é considerada um dos titulares do Departamento de Estado que mais realizaram viagens oficiais.
Tempo de voo: 1.376,5 horas ou 57,4 dias

Total de milhas: 632.452, visitando 90 países

Dias passados em viagem: 259