O dia foi de grandes decisões para as novas autoridades líbias, que ontem assumiram total e definitivamente a segurança do país, após sete meses de missão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Mais tarde, os líderes do Conselho Nacional de Transição (CNT) anunciaram o nome do novo primeiro-ministro no governo de transição, em substituição a Mahmud Jibril. Após a dura batalha que levou à queda do ditador Muamar Kadafi, a segurança se coloca como questão crucial para o novo comando, que reconheceu ter encontrado armas químicas no país e clamou por colaboração internacional para lidar com o problema.
O último dia da missão da Otan, encerrada às 23h59 (horário local), foi marcado pela visita surpresa do comandante da aliança atlântica, Anders Fogh Rasmussen, que se reuniu com os novos dirigentes em Trípoli. A operação, batizada de Protetor Unificado, teve a colaboração de 28 países e foi avalizada pela Resolução n; 1.973 do Conselho de Segurança da ONU. A medida foi aprovada sob o argumento de impor uma zona de exclusão aérea e proteger os civis do massacre do então ditador, durante os protestos que pediam sua saída. A campanha, porém, foi criticada por extrapolar o mandato e desrespeitar resoluções internacionais, que não previam a mudança do regime. Segundo a Otan, foram realizadas 26 mil ações aéreas, das quais 9.650 com objetivo ;ofensivo;.
;Vocês mudaram sua história e seu destino. Nós agimos para protegê-los. Juntos, vencemos;, disse Rasmussen em entrevista coletiva. Ele rebateu as críticas à Otan e negou que Kadafi fosse o alvo de uma investida da coalizão contra um comboio que deixava a cidade de Sirte, no último dia 20. A ação levou à captura e posterior execução do ex-ditador, cujas circunstâncias estão sob inquérito. Com relação à Síria, o comandante descartou ;totalmente; uma intervenção naquele país, mas criticou a repressão do regime do presidente Bashar Al-Assad contra civis, que também protestam por mudanças.
Para o especialista em Oriente Médio Márcio Scalércio, da Pontifícia Universidade do Rio de Janeiro (PUC-RJ), o governo de transição tem condições de garantir a segurança na Líbia. Mas, apesar da saída militar da Otan, segundo ele, é quase certo que França, Reino Unido e Itália continuarão presentes com alguma ;assistência; ao novo governo, ;de olho nos (futuros) contratos de petróleo;.
Segurança
A missão da Otan na Líbia foi encerrada no mesmo dia em que o CNT escolheu o novo chefe do governo de transição, o intelectual e homem de negócios Abdurrahim El-Keib, que substituirá Mahmud Jibril no cargo de primeiro-ministro. Ele e o presidente do CNT, Mustafá Abdul Jalil, têm o papel de conduzir o país segundo o ;mapa do caminho;, que prevê as primeiras eleições em até oito meses a partir da ;libertação total; do país, declarada no dia 23. Segundo reportagem da rede de TV Al-Jazeera, a escolha de El-Keib é importante por se tratar de uma pessoa com potencial para implementar decisões capazes de levar combatentes armados do CNT a integrar as novas forças de exército e polícia, além de ;impor a lei e a ordem na capital e em todo o país;.
Al-Assad sob pressão
Preocupada com o recrudescimento da repressão aos protestos contra o regime do presidente Bashar Al-Assad, na Síria, a Liga Árabe apresentou ontem a Damasco um plano com o objetivo de reduzir a tensão entre as forças militares e os manifestantes. O documento inclui, entre outros pontos, a proposta de um encontro entre representantes do governo e da oposição, a se realizar no Egito. Desde o início dos confrontos, há sete meses, mais de 3 mil pessoas foram mortas, segundo estimativa das Nações Unidas, mas até aqui o regime de Al-Assad mostrou-se sempre refratário a qualquer ;ingerência externa; no desenrolar da crise.
Até a noite de ontem, o regime não havia se manifestado sobre a proposição dos 22 países-membros da liga, que acrescentou ao coro das pressões internacionais um tom mais próximo. Também os países do bloco Brics, que até aqui bloquearam as tentativas do Ocidente de aprovar no Conselho de Segurança da ONU uma condenação à Síria, dão sinais de impaciência com Al-Assad pela relutância em cumprir com as promessas de reforma política.
No último fim de semana, pelo menos mais 40 pessoas morreram em confrontos originados por protestos contra o governo, o que motivou os representantes árabes a incluírem em sua proposta um item que prevê a retirada dos tanques do Exército das ruas. O plano da Liga Árabe propõe ainda ;um diálogo nacional entre todos os componentes da oposição e do regime;, a ser realizado no Cairo, nos próximos dias, segundo anunciou o secretário-geral da organização, Nabil Al-Arabi.
Um comitê ministerial da liga aguarda em Doha, capital do Catar, a resposta do presidente sírio. A organização programou para amanhã uma reunião extraordinária, na qual será apresentado o relatório de uma missão enviada à Síria para discutir a situação.