BUENOS AIRES - A presidente argentina Cristina Kirchner iniciará seu segundo mandato em dezembro fortalecida por uma esmagadora vitória na eleição de domingo com mais de 53% dos votos, mas deverá enfrentar o impacto da crise mundial no crescimento do país e no gasto social, segundo analistas. "Os pilares do modelo econômico estão em crise. A Argentina tem muitas luzes amarelas acesas na economia", disse à AFP Alberto Fernández, ex-chefe de Gabinete (2003/2008) da presidente e de seu antecessor e esposo, o falecido Néstor Kirchner.
O ;modelo; econômico kirchnerista, com um elevado nível de subsídios, permitiu aumentar o consumo interno em 4% anuais, obter um crescimento em média de 8% desde 2003 com exceção de 2009 e baixar a taxa de desemprego em 7%.
[SAIBAMAIS]Contudo, isto se traduz em um incremento de 35% anual no gasto público e uma inflação de 25%, segundo estimativas privadas, o que significa uma economia ;aquecida;, mas que não pode ser sustentada enquanto os subsídios equivalerem a 4% do Produto Interno Bruto (PIB).
O país obteve nestes anos um importante ingresso de divisas graças aos altos preços internacionais de grãos, especialmente a soja, que em dez anos passou de 200 dólares para mais de 500 dólares por tonelada. Contudo, uma boa parte das divisas pode sair do país: "O governo de Cristina se caracterizou pela saída de 70 bilhões de dólares em quatro anos", afirmou Fernández.
"Nos últimos cinco anos o resultado fiscal piorou, o que prova o impulso extra que o governo deu à economia", opinou Martín Lousteau, ex-ministro da Economia da atual presidente. "É uma bola de neve: os subsídios chegaram a 75 bilhões de pesos (17 bilhões de dólares), isso equivale a 4% do PIB", ressaltou Lousteau.
Soledad Pérez Duhalde, da consultora abeceb, afirmou à AFP que "as contas do fisco refletem que é necessário algum ajuste, porque é insustentável o nível atual de subsídios, principalmente no que se refere as tarifas residenciais do setor energético".
Para a economista, a diminuição dos subsídios para o transporte e aumento das taxas de serviços públicos "será feita de forma gradual, já que seu impacto será grande". "Muito se fala de um eventual pacto social (Estado, empresário e trabalhadores) para moderar expectativas inflacionárias e alargar os horizontes", disse Sergio Berensztein, diretor da consultora Poliarquía.
Outra questão pendente é o retorno ao mercado de capitais, do qual o país foi isolado após a moratória de 100 bilhões de dólares em 2001, o maior da história.
A Argentina, desde então, cancelou suas obrigações externas com reservas do Banco Central (BCRA), que possui atualmente mais de 47 bilhões de dólares. Sem dívidas com o Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de pagar 9,81 bilhões de dólares em 2006, o governo ainda tem um pendente passivo de aproximadamente 8 bilhões de dólares com o Clube de Paris.
"Há um problema político, porque uma renegociação com esta entidade parece exigir a presença do FMI, uma organização com a qual a Argentina não quer negociar", disse à AFP Fausto Spotorno, da consultoria Orlando Ferreres.
O governo deve pagar em dezembro, próximo ao vencimento, 2,7 bilhões de dólares, enquanto a necessidade de financiamento no primeiro ano de seu segundo mandato não excede 4 bilhões.