Jornal Correio Braziliense

Mundo

Argentinos votam pelo desejo de manter o crescimento econômico

Buenos Aires ; A estabilidade política e econômica, diante de uma crise internacional que afeta a Europa e os Estados Unidos, é o que está determinando o voto da maioria dos 29 milhões de eleitores argentinos, que hoje (23) escolhem presidente e vice-presidente da República, metade da Câmara de Deputados e um terço do Senado.

Na opinião do analista político Jorge Castro, do Instituto de Planejamento Estratégico, é essa estabilidade que explica a popularidade da presidenta Cristina Kirchner, que deve ser reeleita no primeiro turno. ;A Argentina sai destas eleições muito fortalecida. Nos últimos dez anos, tem tido superávits comerciais que chegaram a US$ 20 bilhões em 2008 e, este ano, está em torno de US$ 9 bilhões;, explicou. ;Essa quantidade de dólares que entra no pais, dois terços provenientes da exportação de produtos agrícolas e alimentos cotados internacionalmente (commodities), permite ao pais financiar as importações, que aumentaram mais de 40% no ano passado, e pagar a totalidade dos juros da divida;, acrescentou.

Desde 2003, quando a Argentina saiu da pior crise de sua recente história, o país tem sido governado pelos Kirchner. Néstor Kirchner foi presidente de 2003 a 2007, quando elegeu a mulher, Cristina, que manteve a mesma política do marido. Ele teria sido o candidato a Presidência, nesta eleição, se não tivesse morrido há um ano. Se Cristina for reeleita, como apontam todas as pesquisas de opinião, será o terceiro mandato seguido dos Kirchner.

O que preocupa vários analistas e economistas é a fuga de capitais do país. Desde julho de 2007 até junho passado, US$ 67 bilhões saíram do sistema financeiro argentino, segundo dados do Banco Central local. ;A fuga de capitais aumentou nos últimos meses, mesmo depois da vitória contundente de Cristina Kirchner nas eleições prévias de 14 de agosto;, disse Jorge Castro. ;É um sinal de que muitos argentinos votaram em Cristina em um dia e no dia seguinte foram às casas de câmbio comprar dólares;.

Outra preocupação é a inflação. Em 2007, o governo modificou a forma de calcular a inflação do Indec (o órgão estatal responsável pelas estatísticas oficiais). Com a alteração, a inflação anual oficial gira em torno de 9% ao ano, muito abaixo dos índices registrados pelas consultorias privadas, que calculam um aumento de preços ao consumidor de mais de 20% nos últimos doze meses.

Ao controlar a inflação no papel, o governo argentino conseguiu economizar dinheiro na hora de pagar os juros dos títulos da dívida, indexados à variação de preços. A população, até agora, não sentiu tanto a queda do poder aquisitivo porque os aumentos salariais ; negociados por sindicatos, aliados do governo, e empresários ; são discutidos com base na inflação real.

Além disso, a economia continua crescendo; o desemprego está caindo e os programas sociais tiraram da pobreza 14 milhões de argentinos. Apesar de todas as pesquisas de opinião e todos os analistas do governo e da oposição darem como certa a reeleição de Cristina Kirchner, ninguém sabe qual será o plano de governo dela. A presidenta prometeu ;aprofundar o modelo; que vem sendo adotado desde 2003, quando Néstor Kirchner foi eleito presidente com 22% dos votos e que ela manteve ao sucedê-lo, em 2007.

;Cristina Kirchner tem sido muito coerente, no seu governo, com as ideias que defendeu ao longo de sua trajetória política como deputada, senadora e presidenta;, disse à Agência Brasil a jornalista e autora da biografia autorizada de Cristina Kirchner, A Presidenta.

Cristina, que raramente dá entrevistas, concedeu quatro a Sandra Russo, falando de vida política e também de experiências pessoais, como o parto do filho Maximo, em 1977, em plena ditadura militar. ;Na época, ela e Néstor Kirchner militavam politicamente e suas vidas corriam perigo;, conta Sandra Russo. No livro, a presidenta também fala do marido. Na próxima quinta (27), completará um ano da morte dele.

;Como parlamentar, Cristina votou contra as leis de anistia e, quando Néstor Kirchner foi eleito presidente, foram reabertos os processos contra os militares que cometeram crimes durante a ditadura;, lembra Russo. Outro projeto que a presidenta defendeu quando estava no Congresso e que prometeu aprovar, no seu segundo mandato, é a limitação legal da venda de terras a estrangeiros. Na década de 1990, grandes áreas na Patagônia foram vendidas a estrangeiros.

Uma semana antes das eleições, Cristina Kirchner reuniu-se com o setor rural, com quem teve sérias divergências durante o primeiro mandato. Uma das fontes de renda do governo é o imposto sobre exportações agrícolas, que tem crescido muito com o aumento dos preços internacionais das commodities. Ela deixou claro que não pretende mudar a política, mas abriu uma porta ao dialogo.

O primeiro mandato de Cristina, que termina em dezembro, também foi marcado pelo confronto com os grandes grupos de comunicação, especialmente o Grupo Clarin, dono do jornal mais vendido no país, de canais de televisão, emissoras de rádio e empresas fornecedoras de serviço de internet. O Congresso aprovou um projeto de lei do governo limitando a concentração da mídia. Mas falta implementá-la na sua totalidade.