O blogueiro egípcio Alaa Abd El-Fatah, 29 anos, tem um novo endereço: Hospital Copta, situado à Rua Ramsés, n; 157, no centro do Cairo. Desde o massacre no bairro de Maspiro, na noite de domingo, ele e vários conterrâneos ocuparam o prédio. ;Estamos com as famílias de 17 dos 26 mortos cujos corpos ainda estão aqui. Queremos ter a certeza de que as necropsias apropriadas serão realizadas;, afirmou ao Correio, por telefone. Alaa e outros ativistas contam com a ajuda de médicos voluntários, que têm exercido a função de observadores. ;Após terem visitado os feridos e visto os mortos, eles revelaram que não há lesões provocadas por gás lacrimogêneo, bastões ou cassetetes. Os indícios são de ferimentos produzidos por munição real ou esmagamento;, explicou. Ele contou que esteve no necrotério e fotografou os corpos. O Conselho Supremo das Forças Armadas (Scaf, pela sigla em inglês) prometeu uma ;rápida investigação; sobre as circunstâncias do protesto realizado pelos cristãos coptas contra a destruição de uma igreja no vilarejo de Al-Marinab, na província sulista de Aswan.
A junta militar que dirige o país desde 11 de fevereiro ; quando uma revolução de 17 dias derrubou o presidente Hosni Mubarak ; manteve ontem um encontro de emergência e reiterou o compromisso com a ;proteção; dos egípcios. ;A Scaf incumbiu o governo de uma rápida formação de um comitê de investigação de fato para determinar o que ocorreu e para tomar as medidas legais contra aqueles que estiverem envolvidos, seja diretamente ou por incitamento;, afirmou o conselho. De acordo com o organismo, os confrontos visaram ;destruir os pilares do Estado e semear o caos;. Para acalmar os ânimos, as autoridades impuseram toque de recolher entre as 2h e as 7h (pelo horário de Brasília).
A jornalista Lilian Wagdy presenciou a matança de domingo. ;Eu testemunhei a violência. O Exército atirava feito louco e havia várias pessoas feridas;, relatou ao Correio, por meio do microblog Twitter. Para a egípcia de 30 anos, o incidente ajudará a ressuscitar a força da revolução. ;As pessoas viram com seus próprios olhos o que o Exército fez: esmagou os manifestantes de uma maneira muito brutal e usou munição viva contra eles. Acho que isso vai ajudar a colocar a revolução de volta aos trilhos;, comentou. Ela contou que a onda de violência teve início depois que um grupo de manifestantes pacíficos foi atacado pelas tropas, ao tentar se aproximar do prédio da tevê estatal. ;A situação por aqui ainda é tensa: há pessoas reunidas diante do Hospital Copta e outras marchando até a Catedral dos Abássidas;, afirmou Lilian.
Vergonha
Confusão, ira e melancolia. Testemunha da chacina, a blogueira Dalia Ziada admitiu à reportagem que essas sensações eram comuns ontem no Cairo. ;Cada egípcio está triste, e as pessoas raramente conversam entre si. Sentimos que é vergonhoso o que ocorreu ontem (domingo). Não foi para isso que fizemos a revolução;, lamentou. Os primeiros corpos foram sepultados ontem, enquanto Shenouda III, patriarca e líder da Igreja Copta Ortodoxa, culpava ;desconhecidos infiltrados; pelos confrontos. ;A fé cristã denuncia a violência. Desconhecidos se infiltraram na manifestação e cometeram crimes atribuídos aos coptas;, declarou ele, citado pela agência de notícias oficial Mena. ;Os coptas sofreram problemas em reiteradas oportunidades sem que os agressores fossem processados.; O temor de choque sectário levou Ahmed Al-Tayyeb, o grande imã da Al-Azhar ; a instituição mais importante do islã sunita ;, a instar um diálogo ;urgente; entre muçulmanos e cristãos.
O massacre de Maspiro causou horror na comunidade internacional. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, declarou-se ;profundamente triste; e convocou os egípcios ;a permanecerem unidos e a preservar o espírito das mudanças históricas do início de 2011;. O presidente americano, Barack Obama, se disse ;profundamente preocupado;. ;Chegou a hora de todas as partes darem mostras de moderação, para que os egípcios possam avançar na elaboração de um Egito forte e unido;, afirmou Jay Carney, porta-voz da Casa Branca. ;Os direitos das minorias, incluindo dos coptas, devem ser respeitados.;