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Guerra contra narcotráfico no México dá sinais de esgotamento

Manuel Martínez
postado em 02/10/2011 08:00


A guerra contra o narcotráfico no México, iniciada há quase seis anos, entrou em mais uma escalada de violência, com a disparada dos assassinatos e ações cada vez mais ousadas do crime organizado. Bandos a serviço dos cartéis da droga atacam postos policiais, semeiam o terror com repetidas chacinas e promovem atentados a comerciantes que não aceitam extorsão. Já usaram carros-bomba e, na semana passada, espalharam cabeças decapitadas junto de uma escola, em Acapulco ; quase uma repetição da semana anterior, quando 35 corpos foram espalhados por uma avenida de Veracruz. Matanças como essa, além das execuções e das baixas registradas em confrontos com a polícia e as Forças Armadas, contribuíram para que o país acumule mais de 43 mil mortes desde dezembro de 2006, quando o presidente Felipe Calderón tomou posse e colocou tropas federais no combate ao crime.

Foram milhões de dólares empenhados, com ajuda dos Estados Unidos no âmbito da Iniciativa Mérida. O vizinho do norte, cobrado pelos mexicanos por representar o mercado que movimenta a cocaína desde a América do Sul, contribuiu também com equipamentos e consultores, além de ter reforçado a segurança do seu lado da fronteira. Mas, aparentemente, os resultados ainda estão longe do que se pretendia. E a sociedade começa a demonstrar cansaço, como ficou patente com uma série de marchas pela paz que percorreram o país nas últimas semanas.

Analistas consultados pelo Correio atribuem a ineficiência da guerra contra os cartéis à falta de uma estratégia mais refinada. Para vários deles, há falhas de coordenação entre os envolvidos nas batalhas e falta conscientizar os mexicanos sobre o que o narcotráfico poderá representar para o seu futuro. Foram unânimes em citar como agravantes a corrupção generalizada e o abandono a que muitos governos regionais são relegados. E, direta ou indiretamente, dizem que Calderón escolheu um caminho sem volta.

Herança
;A luta contra o narcotráfico é o legado que o presidente pretende deixar;, avalia o professor Salvador Raza, da Universidade Nacional de Defesa dos Estados Unidos. Pouco depois de assumir um mandato de seis anos, em dezembro de 2006, Calderón ordenou uma ofensiva sem precedentes, com mais de 36 mil militares e policiais enviados a diversos estados. Eles tinham a missão de fazer detenções, destruir plantações de maconha e laboratórios de refino de cocaína e recolher informações sobre os criminosos. Paralelamente, servidores em diversas esferas do poder e agentes de segurança se viram submetidos a interrrogatórios. Posteriormente, a maioria deles foi demitida ou presa por envolvimento com a delinquência. Esse processo só se concluiu em 2010 e, durante esse período, o governo encaminhou projetos para reformas na Justiça, a fim de acabar com esquemas pró-criminosos.

Em junho de 2008, Washington estendeu sua mão para enfrentar o problema. Teve início a Iniciativa Mérida, acordo entre os EUA, o México e países da América Central, que disponibilizava por três anos um total de US$ 1,5 bilhão para atingir as drogas e a corrupção. ;Creio que, apesar desses recursos e de outros esforços mexicanos, isso é pouco perto do que os traficantes ganham;, opinou Raza.

;Não podemos esquecer que a corrupção não foi reduzida como se queria e que os cartéis estão desde meados do século passado envolvidos em um negócio altamente rentável;, acrescentou Thiago de Aragão, diretor de análise de risco político latino-americano na consultora Arko Advice. De acordo com dados levantados por ele com a universidade da Pensilvânia (EUA), o ilícito renderia entre US$ 35 bilhões e US$ 45 bilhões anuais. ;O mais irônico é que 90% das drogas que saem do México vão para os EUA, que pressionam Calderón para resolver a situação;, frisou.

;Parte da tragédia que os mexicanos vivemos se deve a que somos vizinhos do maior consumidor de drogas do mundo;, reclamou recentemente o presidente. ;E isso só vai piorar se os americanos não acabarem efetivamente com esse consumo e não atuarem de modo mais integrado com o México, uma carência do plano Mérida;, apontou o diretor do Colégio da Fronteira Norte, José Ramos García. Ele, que supervisiona estudos sobre a violência e o narcotráfico, lamentou: ;Falta ao plano mais inteligência para enfrentar os cartéis e ações sociais sistematizadas de conscientização. Sem isso, o problema se manterá;.

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