O Conselho Nacional de Transição (CNT) da Líbia obteve ontem significativas vitórias institucionais. A cinco dias da abertura oficial da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), o novo governo que se instala em Trípoli recebeu a aprovação para ocupar o assento do país na reunião. Além disso, o Conselho de Segurança da ONU aceitou suspender parcialmente a restrição de acesso a bens que estavam sob administração do regime deposto. Isso permitirá que os líbios possam receber recursos para projetos de infraestrutura e comecem a organizar um processo eleitoral e uma nova Constituição.
Com a cadeira garantida, o chefe interino do CNT, Mustafa Abdul Jalil, anunciou que viajará a Nova York para discursar na Assembleia Geral e encontrar-se com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. A aprovação ao CNT como representante da Líbia perante as Nações Unidas teve o voto favorável de 114 países, entre eles o Brasil ; que, até ontem, mantinha a posição de aguardar uma posição da ONU antes de reconhecer explicitamente o governo dos rebeldes que depuseram o ditador Muamar Kadafi. A votação teve ainda 15 abstenções e 17 votos contrários, entre eles os da Venezuela e outros integrantes da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba).
Em sua declaração de voto, a representante da Nicarágua, que integra o bloco bolivariano, questionou a intervenção das potências ocidentais na mudança de regime na Líbia. ;A livre determinação deve ser reconhecida pelos povos, não pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, aliança militar ocidental);, protestou a embaixadora María Rubiales de Chamorro. O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, foi um dos críticos mais ácidos aos bombardeios da Otan contra as forças de Kadafi, iniciados em março e apoiados em uma resolução do Conselho de Segurança da ONU que permitia o recurso a ;todos os meios necessários; com o fim de ;proteger a população civil;. O Brasil, que integra o CS até o fim deste ano, se absteve na votação desse texto.
Reconhecimento
Um dia depois de ter recebido a visita do presidente francês, Nicolas Sarkozy, e do premiê britânico, David Cameron, os dois artífices da intervenção militar e do apoio diplomático ao CNT, Trípoli aclamou ontem o primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que ampliou o apoio ao novo governo líbio no âmbito regional. Como representante de um país de maioria muçulmana, embora estabelecido como Estado laico, Erdogan acompanhou Mustafa Abdul Jalil em um aparição na Praça dos Mártires, símbolo da conquista da capital pelos rebeldes, e nas orações muçulmanas da sexta-feira, dia sagrado da semana islâmica. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, já enviou à Líbia o secretário de Estado adjunto para o Oriente Médio, Jeffrey Feltman. A embaixadora norte-americana na ONU, Susan Rice, disse que seu governo ;está pronto para ser parceiro da Líbia em um futuro democrático e inclusivo;.
O avanço na frente diplomático foi acompanhado por um dia de combates acirrados entre forças do novo governo e remanescentes do antigo regime em torno de Bani Walid e Sirte ; esta última, a cidade natal de Kadafi. No ímpeto de conquistar os últimos redutos inimigos, as tropas do CNT chegaram a penetrar no perímetro de Bani Walid, mas horas depois foram forçadas a recuar, diante da ameaça representada por franco-atiradores instalados em edifícios, além de barragens de morteiros e foguetes. ;Recebemos ordens de retroceder, mas voltaremos logo mais;, disse um combatente à agência de notícias Reuters. De acordo com observadores citados pela emissora britânica BBC, a batalha pelo controle dos últimos redutos dos kadafistas estaria entrando na fase final.
Divisão no conselho
A Resolução n; 1.973 do Conselho de Segurança das Nações Unidas foi adotada em 17 de março último, quando se multiplicavam as notícias sobre o uso de armas de fogo e até bombardeios, por parte do regime líbio, contra os manifestantes que saíam às ruas de várias cidades do país para exigir a queda de Muamar Kadafi. O texto da resolução autorizava os países-membros da ONU a usar ;todos os meios necessários; com o propósito de ;proteger os civis;, o que motivou resistências da parte de dois dos cinco membros permanentes do conselho, Rússia e China. Para não agravar a crise votando contra, o que representaria um veto e derrubaria a iniciativa, ambos os países se abstiveram, e foram acompanhados por Alemanha, Brasil e Índia. A resolução foi aprovada com o voto de 10 dos 15 membros do CS.