A promessa do novo comando na Líbia de levar todo o clã Kadafi à Justiça ficou mais difícil de ser cumprida após a confirmação de que a mulher e três filhos do ditador estão na Argélia. O Conselho Nacional de Transição (CNT) ; braço político da rebelião ; classificou a atitude do governo argelino como uma ofensa e vai pedir a extradição dos fugitivos. Argel, porém, deu aos familiares do ditador salvo-conduto para que se desloquem para um terceiro país, segundo porta-vozes dos rebeldes. Havia suspeita de que o próprio coronel estivesse no país vizinho, mas a Casa Branca assegurou que ele continua na Líbia.
Segundo um informe oficial do Ministério das Relações Exteriores da Argélia, a mulher de Kadafi, Safia; a filha Aisha; e os filhos Hannibal e Mohammed, além de alguns netos do ditador, entraram no país ontem de manhã. A chegada da família foi informada às Nações Unidas (ONU), diz o documento. Autoridades rebeldes também foram notificadas e a reação foi imediata. ;Prometemos providenciar um julgamento justo a todos aqueles criminosos, e além disso consideramos este um ato de agressão;, disse o porta-voz dos rebeldes, Mahmoud Shamman, em entrevista à agência de notícias Reuters.
Fontes locais citadas por Anis Rahmani, dono do jornal Ennahar, disseram que Aisha estaria a menos de 48 horas de ser mãe. ;Ela deve dar à luz hoje ou amanhã e precisa de cuidados médicos;, disseram as fontes. A decisão de acolher parte da família de Kadafi pode ter sido motivada por razões humanitárias e pelo fim do Ramadã, mês sagrado islâmico, além do fato de os asilados ;não serem procurados pelo Tribunal Penal Internacional (TPI);, explicou o cientista político Abdelaziz Djerrad, ex-funcionário da chancelaria argelina.
O governo interino em formação em Trípoli já havia acusado Argel de apoiar Kadafi no conflito. A Argélia é o único entre os países vizinhos que ainda não reconhece o CNT como autoridade legítima na Líbia. O braço da rede terrorista Al-Qaeda no Norte da África assumiu ontem a responsabilidade por um ataque suicida contra uma academia militar argelina, na sexta-feira, acusando a instituição de apoiar o regime de Kadafi. No atentado, 16 soldados e dois civis morreram, segundo o Ministério da Defesa.
A notícia da fuga de parte da família de Kadafi coincidiu ainda a informação de que outro filho do coronel, Khamis, teria sido morto na noite de domingo. Segundo o Conselho Militar rebelde, Khamis teria sido morto em batalha numa área entre os vilarejos de Tarunah e Bani Walid. O corpo teria sido encontrado na região, spultado, mas a informação não foi confirmada oficialmente. Filho mais novo do líder, com 28 anos, Khamis comandava uma brigada considerada das mais eficazes entre as forças ainda leais ao ex-líder. Sua morte já tinha sido noticiada antes, mas desmentida pouco depois, com a divulgação de imagens do rapaz, vivo.
Caçada
Essa região, segundo informação divulgada pela imprensa italiana, também seria o local onde Kadafi estaria escondido, a cerca de 100km da capital, Trípoli. Veículos de comunicação da Itália noticiaram que ;influentes diplomatas líbios; teriam dito que o coronel estaria em Bani Walid acompanhado dos filhos Saadi e Saif Al-Islam. A localidade, segundo rebeldes, seria um dos poucos redutos ainda sob controle de Kadafi. No sábado, havia relatos de que um comboio com 60 a 80 viaturas da brigada comandada por Khamis se encaminhavam para a cidade.
Chefes de Estado-Maior dos países envolvidos na ação militar internacional na Líbia declararam ontem que ainda são necessárias operações para derrotar completamente o regime, que resiste na região de Sirte, cidade natal de Kadafi e um de seus últimos bastiões. Na reunião dos líderes militares da coalizão, o presidente do CNT, Mustafah Abdel Jalil, disse que o ditador ainda representa ;um perigo; e pediu que os aliados continuem apoiando o novo governo da Líbia.
100 MORTOS NO EGITO
A ONG Iniciativa Egípcia para os Direitos das Pessoas (EIPR) denunciou ontem que pelo menos 100 detentos morreram durante a revolta popular contra o regime de Hosni Mubarak e nos desdobramentos imediatos da rebelião. Um relatório da organização, com base em investigações em apenas cinco presídios, denuncia ;crimes atrozes;. Massacres e fugas em massa ocorreram em várias prisões desde 25 de janeiro, quando começaram os protestos que culminaram com a queda de Mubarak, em 11 de fevereiro. A ONG sustenta, porém, que os presos foram objeto de ;assassinatos deliberados, que não estavam em absoluto relacionados com tentativas de fuga ou motins;. O documento afirma que muitos corpos exibiam ferimentos de bala na cabeça e no peito. A organização baseou-se em testemunhos de sobreviventes e membros das famílias das vítimas, assim como em fotos e vídeos captados com telefones celulares. O EIPR pediu ao governo egípcio que forme uma comissão de investigação independente e determine compensações para as vítimas ou suas famílias. Pede também à Justiça que investigue rigorosamente os incidentes e puna os guardas penitenciários envolvidos.