Roma - A FAO considerou "inadmissível" a fome no Chifre da África e fez um apelo à comunidade internacional para que não financie apenas uma ajuda de urgência, mas também faça investimentos agrícolas por um longo período a fim de evitar a repetição de crises alimentares. "É inadmissível que hoje em dia, com todas as fontes financeiras, tecnológicas e a experiência à nossa disposição, mais de 12 milhões de pessoas corram o risco de morrer de fome", declarou Jacques Diouf, diretor-geral da Organização da ONU para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em Roma.
"Planos completos de investimento já foram aprovados e estão disponíveis, mas falta financiamento. Se os governos e seus parceiros doadores não investirem imediatamente, a fome apavorante que tentamos combater voltará e será uma vergonha para a comunidade internacional", acrescentou Diouf.
Douf participou de uma reunião técnica sobre a seca e a fome no Chifre da África para preparar a conferência da União Africana que deverá reunir países doadores na cidade de Addis Abeba no dia 25 de agosto. Diouf disse durante uma entrevista à AFP que "a construção de canais de irrigação não são obras com custos exorbitantes, são pequenas coisas que podem ser feitas". O chefe da FAO também sugeriu a escavação de poços nos caminhos ocupados por pastos, melhoria das estradas e criação de sistemas de estocagem das colheitas. Disse ainda que a perda de produção chega aos "40% ou 60%" e pediu que os Estados africanos passem a investir 10% de seus orçamentos, ao invés de 5%, na agricultura.
Na segunda-feira, a ONU fez um apelo de urgência e pediu contribuições para o fundo da luta contra a fome no Chifre da África. A organização arrecadou até o momento presente apenas 1,3 bilhões de dólares, segundo a ONU são necessários 2,4 bilhões. Na quarta-feira, os membros da Organização de Cooperação Islâmica (OCI) se reuniram em Istambul para arrecadar 350 milhões de dólares para a Somália. "É necessário preparar a próxima campanha agrícola. As chuvas só irão chegar em outubro. Os únicos meios para a sobrevivência das famílias são os campos e os pastos (...) Portanto, é preciso ajudar as famílias a ficarem nas terras", declarou à AFP Cristina Amaral, diretora de operações emergências da FAO recentemente vinda da Somália.
Sally Kosgei, ministra da Agricultura do Quênia que recebe um grande número de refugiados, ressaltou que no seu país "60% das terras são áridas ou semi-áridas" e sofre também com a seca, "as famílias perdem seus pastos e a situação se agrava com a chegada dos refugiados". O Quênia "não se queixa", existem programas, mas "nós não podemos financia-los", disse. "O mundo precisa acordar" para evitar a fome, "temos os projetos, falta a infraestrutura", acrescentou Kosgei, que citou também a construção de diques e a distribuição de cereais resistentes à falta de água.
A seca que afeta a região, a pior em 60 anos, já deixou dezenas de milhares de mortos e ameaça 12 milhões de pessoas na Somália, Quênia, Etiópia, Djibuti, Sudão e Uganda. "Existe quase uma banalização da fome na Somália. Estamos habituados a ver imagens de crianças que morrem, de um país que está sempre em crise", lamentou Amaral. Diouf declarou que não suporta mais "ver uma imagem de uma criança que corre o risco de morrer de fome", acrescentando: "não ficamos felizes por nossas crianças, eu não sei por que aceitamos isso para as crianças dos outros".