Dois homens seguram um corpo cuja cabeça ficou reduzida a uma massa disforme. O barulho frequente das explosões e a fumaça escura que toma conta do horizonte misturam-se aos gritos de desespero. Ao fundo, ouve-se a repetição do Takbir ; como é chamada a expressão ;Allahu Akbar; (;Deus é grande, em árabe;). É véspera do Ramadã, o mês sagrado para o islã, e os cerca de 700 mil moradores de Hama (centro), 209km ao norte de Damasco, mergulham no horror. Às 5h de ontem (23h de sábado, em Brasília), os tanques de guerra enviados pelo presidente Bashar Al-Assad invadiram a cidade, após 29 dias de cerco. Saleh Al-Hamwi (nome fictício) estava em casa quando ao menos 80 blindados se aproximaram, vindos de todas as direções. ;Nós corremos para a rua, com a intenção de fazer uma barreira humana e deter o avanço das tropas, mas eles começaram a disparar a esmo;, afirmou o sobrevivente ao Correio, por telefone. ;A situação é muito aterrorizante;, assegurou Saleh, enquanto relatava escutar tiros. Até o fechamento desta edição, os moradores de Hama contavam ao menos 100 mortos.
Em um dos dias mais sangrentos desde o início da revolta contra Al-Assad, 136 pessoas morreram em todo o país ; cinco em Homs, três na província de Idleb, 19 em Deir Ezzor, seis em Hark, duas em Surán e uma em Bukamal, além das 100 em Hama. Ativistas de direitos humanos denunciam que a matança, condenada pela comunidade internacional, faz parte de uma estratégia de Damasco para encerrar o levante antes do início do Ramadã. Visivelmente abalado, Saleh contou que os tanques alvejaram casas e não pouparam nem sequer as crianças. ;Algumas foram atingidas dentro de seus próprios lares;, disse, entre lágrimas. ;A maior parte dos disparos foi efetuada na cabeça e no peito. Os soldados iniciariam nas próximas horas uma nova operação. Temos que nos proteger.;
Ouça trecho (em inglês) de entrevista com Saleh Al-Hamwi (nome fictício)