BEIRUTE - O tribunal da ONU que investiga o assassinato do primeiro-ministro Rafic Hariri entregou nesta quinta-feira uma ata de acusação e quatro mandados de prisão ao procurador geral em Beirute, em um caso que divide o Líbano e suscita temores de mais violência.
O líder da oposição parlamentar e filho de Rafic Hariri, Saad Hariri, saudou um "momento histórico" após "vários anos de patiência e de combate", pedindo ao governo de Najib Mikati, dominado pelo Hezbollah, que respeite as resoluções internacionais. "Um grupo de especialistas do Tribunal Especial para o Líbano (TSL) entregou hoje ao procurador Sa;d Mirza a ata de acusação", declarou à AFP Far;s Souaid, um dos líderes da oposição.
Uma autoridade do governo Mikati confirmou a entrega da ata de acusação muito aguardada, assim como mandados de prisão. "Os mandados de prisão foram entregues lacrados e devem ser executados contra quatro libaneses", indicou uma fonte judicial libanesa sem fornecer maiores detalhes.
Segundo a imprensa local, que identificou os quatro suspeitos, pelo menos dois são membros do poderoso movimento xiita Hezbollah, aliado dos regimes sírio e iraniano. Nenhuma confirmação foi obtida no momento com o TSL, que tem sua sede localizada nas imediações de Haia. O Hezbollah, movimento armado cujo julgamento pelo TSL é esperado há meses, provocou em janeiro a queda do governo de união de Saad Hariri após a recusa deste de interromper sua cooperação com o tribunal.
Seu sucessor, Najib Mikati, pediu nesta quinta-feira que o processo seja levado adiante de forma "responsável e realista" após a entrega da ata de acusação. "Hoje, enfrentamos uma nova realidade (...) com a qual devemos agir de forma responsável e realista (...) mantendo em mente que são acusações e não veredictos", declarou.
O governo libanês indicou em seu programa de política geral apresentado nesta quinta-feira "seguirá os procedimentos do Tribunal Especial para o Líbano, criado para que a justiça seja feita sem considerações políticas ou vingança". O gabinete indicou, entretanto, que fará tudo "de forma que isso não tenha impacto negativo para a estabilidade do Líbano e para a paz civil", o que significa, segundo os observadores, que não cooperará com o TSL.
Paris, Washington e a ONU manifestaram sua preocupação frente à eventualidade de ver o novo governo interromper sua cooperação com o TSL. Eles o lembraram de seus "compromissos internacionais", principalmente relativos ao financiamento do TSL, para o qual Beirute fornece em torno de 49% dos recursos.
O TSL, criado em virtude de uma resolução da ONU, é encarregado de julgar os supostos autores do atentado que custou a vida de Rafic Hariri e de outras 22 pessoas no dia 14 de fevereiro de 2005 em Beirute, no momento em que o Líbano estava sob tutela da vizinha Síria.
Segundo especialistas, o Líbano tem agora 30 dias para executar os mandados de prisão. Se os suspeitos não forem presos durante este período, o TSL divulgará a ata de acusação e convocará os suspeitos para comparecer ao tribunal. O assassinato do ex-primeiro-ministro Rafic Hariri, um muçulmano sunita e arquiteto da reconstrução do Líbano, mergulhou o país em um período instabilidade que corre o risco de ser reavivado com a apresentação da ata de acusação.
Sua morte desencadeou "a Revolução do Cedro", que forçou a Síria a retirar suas tropas do Líbano dois meses depois. O Líbano se dividiu na época em dois campos, uma cisão que gerou uma onda de violência confessional entre xiitas e sunitas em 2008. Uma acusação do Hezbollah suscita temores de um novo ciclo de violência.