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Kadhafi se aferra ao poder e diz que rebeldes servem a Bin Laden

Trípoli - A televisão estatal líbia transmitiu nesta quinta-feira (24/2) uma mensagem de áudio do líder Muamar Kadhafi em que ele acusou as forças rebeldes de estarem a serviço de Osama Bin Laden.

A mensagem foi divulgada em Zawiyah, cidade a oeste de Trípoli e palco de violentos confrontos.

Segundo um jornal líbio, dez pessoas morreram e dezenas ficaram feridas durante o ataque de tropas governamentais a essa localidade, que conta com a maior refinaria de petróleo do país.

"Essa gente não tem verdadeiras reivindicações. Suas reivindicações são as de Bin Laden", afirma o coronel Kadhafi, referindo-se ao chefe da Al-Qaeda.

"É óbvio agora que esta situação é promovida pela Al-Qaeda. Estes jovens armados, nossos filhos, estão sendo incitados por gente que é reclamada pelos Estados Unidos e o Ocidente".

Kadhafi também acusou os rebelados de terem sido drogados pela rede de Bin Laden.

"Vocês em Zawiyah se voltaram para Bin Laden", afirmou. "Eles deram drogas a vocês. Eles lavaram o cérebro das crianças nessa região e pediram que se comportassem dessa maneira", acrescentou.

"Mãos do povo"

O líder líbio assegurou que a situação em seu país é diferente da do Egito e da Tunísia, onde as rebeliões populares acabaram com regimes longevos e autoritários.

"Aqui a autoridade está em suas mãos, nas mãos do povo. Podem mudar a autoridade sempre que quiserem. A escolha é sua. Vocês são os anciãos, os líderes das tribos, os professores", declarou.

E enfatizou: "Meu poder na Líbia é simplesmente moral".

"Não tenho o poder de legislar ou de fazer aplicar a lei. A rainha da Inglaterra não tem essa autoridade. Este é, exatamente, o meu caso", reiterou.

O dirigente também apresentou suas condolências às famílias de quatro membros das forças de segurança que morreram em Zauiya.

"Pergunto se Bin Laden vai indenizar as famílias dos que foram assassinados".

Até a morte

Na terça-feira, em seu primeiro discurso à nação depois do início da insurreição, o coronel líbio prometeu ficar no poder até sua última gota de sangue e reprimir com rigor os protestos.

A revolta parece solidamente implantada na costa leste do mediterrâneo líbio, na região de Cirenaica, da fronteira com o Egito até as cidades de Tobruk e Benghazi, passando por Al Baida. Nas estradas, rebeldes armados estão posicionados ao lado de soldados que aderiram à causa dos insurgentes.

Nesta quinta-feira, a cidade de Zuara, 120 quilômetros ao oeste de Trípoli, foi abandonada pela polícia e os soldados, passando ao controle do povo, afirmaram testemunhas que chegaram à Tunísia.

"Não há policiais nem militares, o povo é quem controla a cidade", declarou à AFP o egípcio Mahmud Mohamed Ahmed Atia, que conseguiu fugir para a Tunísia pela estrada.

Cerca de dez generais e coronéis já desertaram e proclamaram sua fidelidade à rebelião, sob aplauso dos populares.

O ex-ministro da Justiça, Mustafá Abdel Jalil, que renunciou para protestar contra a brutal repressão, sugeriu que Kadhafi acabará se suicidando como Hitler.

Pressão internacional

Além de aparentemente perder o controle do leste do país, Kadhafi enfrenta uma forte pressão ocidental para evitar um banho de sangue, que pode provocar um grande êxodo e uma desestabilização ainda maior desta rica nação petroleira.

O presidente Barack Obama qualificou de escandalosa a repressão que matou centenas de pessoas e afirmou que os responsáveis pela violência devem responder por seus atos.

A União Europeia (UE), por sua vez, também se mobiliza para decidir eventuais sanções e tenta encontrar uma resposta para a fuga de milhares de líbios e estrangeiros do país do norte da África.

O bloco anunciou ainda que busca apoio naval militar para retirar até 6 mil europeus que permanecem na Líbia.

Organizações de defesa dos direitos humanos denunciaram ataques aéreos e bombardeios contra civis. Segundo a Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), a repressão na Líbia provocou 640 mortes desde 15 de fevereiro.

O ministro britânico das Relações Exteriores, William Hague, declarou-se nesta quinta-feira favorável a uma "investigação internacional sobre as atrocidades" cometidas na Líbia durante a sangrenta repressão dos protestos contra o regime de Muamar Kadhafi.

Kadhafi, 68 anos, no poder desde 1969, ameaçou na terça-feira "lutar até a morte" e ordenou que suas tropas esmaguem a rebelião.

Mas um dos filhos do ditador, o ex-jogador de futebol Saadi Kadhafi, declarou que o "guia da revolução" estaria considerando outros planos, como o de virar um conselheiro para uma nova geração de dirigentes.

"Meu pai seria como o avô que dá conselhos", declarou Saadi Kadhafi em entrevista por telefone ao jornal britânico Financial Times.

Ao mesmo tempo, a Al-Qaeda do Magreb Islâmico (AQMI) anunciou apoio total aos manifestantes líbios e prometeu fazer o possível para ajudar na insurreição contra o coronel Muamar Kadhafi, informou nesta quinta-feira o SITE, centro americano de vigilância de sites islâmicos.

"Faremos todo o possível para ajudá-los, com o poder de Alá, porque vosso combate é o combate de todo muçulmano que ama Alá e seu mensageiro", afirma o comunicado da AQMI.

A tradução para o inglês do comunicado da AQMI não menciona a instauração do emirado islâmico pela Al-Qaeda, dirigido por um ex-preso de Guantánamo, em Derna, leste da Líbia, como anunciou na quarta-feira o vice-ministro das Relações Exteriores, Khaled Kaim.

Os moradores da região desmentiram a notícia.