Cairo - O exército egípcio, ao qual o presidente Hosni Mubarak cedeu o poder antes de renunciar ao cargo, enfrenta a tarefa colossal de restaurar a estabilidade e responder, ao mesmo tempo, às aspirações de uma mudança democrática expressa pela revolta que derrotou o "rais" (chefe supremo).
O controle militar do país mais populoso do mundo árabe foi anunciada esta sexta-feira em uma declaração lacônica pelo vice-presidente Omar Suleiman.
"Levando em conta as difíceis condições que o país atravessa, o presidente Mohamed Hosni Mubarak decidiu abandonar o cargo de presidente da República e encarregou o Conselho Supremo das Forças Armadas de administrar os assuntos do país", anunciou o vice-presidente Omar Suleiman em breve intervenção transmitida pela TV.
Este conselho é chefiado pelo ministro da Defesa, o marechal Mohamed Husein Tantaui, que fez uma aparição perante o palácio presidencial de Heliópolis, perto do Cairo, para saudar a multidão.
O conselho havia anunciado na quinta-feira que se reuniria para examinar as "medidas" necessárias "para preservar a nação" e "para apoiar as demandas legítimas do povo", sem dar maiores detalhes.
Na manhã desta sexta, para grande decepção dos manifestantes, deu a impressão de apoiar Mubarak em seu desejo de chegar até o fim do seu mandato, que termina em setembro.
Mas o exército também declarou, antes do anúncio da renúncia de Mubarak, que garantiu a celebração de eleições "livres e transparentes" e assegurou que poria um fim ao estado de emergência em vigor ao longo da presidência de Mubarak desde que a situação volte à normalidade.
Em comunicado publicado na sexta-feira, prometeu "uma transição pacífica do poder que leve a uma sociedade democrática livre".
O Conselho Supremo militar também destacou "a necessidade de um retorno à vida normal" e advertiu contra todo ataque à segurança do país.
Poucas horas depois do anúncio da demissão, o exército voltou a fazer uma declaração e assegurou que não substituirá "a legitimidade desejada pelo povo".
A instituição militar "saúda o presidente Mohamed Hosni Mubarak pelo que deu à nação em tempos de guerra e em tempos de paz e por sua atitude patriótica que fez prelavecer os interesses superiores da nação", acrescentou.
A magnitude das manifestações maciças desta sexta-feira e talvez também as pressões internacionais cada vez mais fortes, entre outras, dos Estados Unidos, parecem ter levado o exército a aceitar uma saída de Mubarak.
"Desde o começo, o exército não interveio para impedir as manifestações, não desempenhou o papel que Mubarak sem dúvida queria que desempenhasse. Preferiu se manter neutro e preservar sua postura de árbitro", avaliou Mustafa Kamel Saied, professor de ciências políticas da Universidade do Cairo.
"O exército é visto como um garantidor, um mediador, entre um poder ausente e a revolta das ruas", disse Amr al Chobaki, do instituto al Ahram de Estudos Políticos e Internacionais.
A incerteza reinava, no entanto, sobre a forma que a instituição militar, adepta do secretismo, adotará para gerir o país.
Estimado, ao contrário da polícia, pela população que em várias ocasiões confraternizou com os soldados durante as manifestações, o exército tampouco informou que tipo de processo concreto contava instaurar para reformar um sistema do qual é a coluna vertebral.
Os militares tampouco informaram se pretendem dar prosseguimento ao diálogo iniciado nos últimos dias pelo regime de Mubarak com o poderoso movimento da Irmandade Muçulmana.
Herança
O exército herda, ainda, um país com uma economia gravemente afetada por 18 dias de crise, abandonado pelos turistas, com a bolsa fechada e os investidores estrangeiros em alerta.
O exército egípcio tem 470.000 homens, muitos deles recrutas.
Desde a queda da monarquia em 1952, todos os presidentes egípcios - Mohamed Naguib, Gamal Abdel Nasser, Anwar al Sadat e Hosni Mubarak - fizeram parte do exército.