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Berlusconi voltará a ser julgado por dois crimes após imunidade reduzida

;Viva a Constituição! A lei é igual para todos!”, gritava Gianfranco Mascia, enquanto abria a garrafa de champanhe diante da sede do Tribunal Constitucional de Roma. Ao seu lado, uma ativista sorria e segurava um cartaz com os dizeres ;Stappa il Tappo; (;Tire a rolha;, em italiano). ;Simbolicamente, nós destampamos o champanhe para definitivamente retirar a ;rolha;, em todos os sentidos, do sistema democrático italiano;, afirmou Gianfranco, em entrevista ao Correio pela internet, referindo-se ao primeiro-ministro, Silvio Berlusconi. Às 15h de ontem (meio-dia em Brasília), Gianfranco ; líder do movimento de oposição Popolo Viola ; e cerca de 30 seguidores começaram a celebrar o dia da derrota de Il Cavaliere. O chefe de governo conhecido pelas frases polêmicas e pelos escândalos envolvendo prostitutas e dinheiro viu parte de sua imunidade ser retirada pelos juízes. A Corte invalidou parcialmente a chamada lei do legítimo impedimento. Sem o recurso, Berlusconi dependerá dos magistrados, que avaliarão se o líder poderá faltar aos julgamentos, ao alegar compromissos oficiais.

A decisão tem caráter irrevogável e prazo até o mês de outubro, quando o premiê encerra seu mandato. Também abre um precedente para a retomada dos processos contra Berlusconi, que envolvem os crimes de fraude fiscal e corrupção de testemunha (veja o quadro nesta página). De acordo com o italiano Giovanni Guzzetta, professor de direito público da Universitá degli Studi di Roma, o primeiro-ministro sofrerá consequências políticas e jurídicas após a perda relativa de imunidade. ;No campo das leis, os julgamentos contra Berlusconi recomeçarão. Caberá ao juiz verificar até que ponto ele não poderá comparecer à Corte;, explica à reportagem, por e-mail. ;Por outro lado, se Berlusconi discordar da resolução do juiz, poderá sabotar o Tribunal Constitucional e levantar um conflito com a Justiça;, acrescenta.

Do ponto de vista político, Guzzetta não vê graves repercussões. ;O próprio Berlusconi já vinha dizendo que a decisão não afetaria estabilidade do governo;, lembra. No entanto, ele alerta que o primeiro-ministro tem o poder de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. ;No entanto, ninguém, à exceção da Liga do Norte e do Partido Di Pietro, deseja isso;, conclui. Outro motivo pelo qual o especialista afasta grandes mudanças na estabilidade do governo é o fato de que Berlusconi enfrenta julgamentos desde o início da carreira política. ;Essa situação durará até sua saída, ao menos que ele consiga reformar a Constituição e introduzir imunidade explícita a altas autoridades do Estado;, diz Guzzetta.

Ano decisivo

Independentemente de Berlusconi se sentir ameaçado ou não, Gianfranco Mascia elogia a resolução do Tribunal Constitucional. ;O terceiro artigo da Constituição declara: ;Todos os cidadãos são iguais perante a lei;. Ele não tem respeitado esse princípio, que hoje (ontem) foi reafirmado pela Corte;, celebra o oposicionista. O líder do grupo Popolo Viola aposta que 2011 será um ano decisivo para o mandatário. ;Berlusconi enfrenta um momento muito difícil, politicamente, com a perda de um número expressivo de deputados;, lembra. ;Além disso, a população tem saído às ruas para protestar. Estudantes, operários, professores, o mundo da arte e da cultura e, inclusive, a polícia, que sofreu um corte de orçamento e perdeu as horas extras.;

A situação de Il Cavaliere poderia ter sido ainda pior. Segundo a agência de notícias italiana Ansa, os 15 juízes optaram por uma alternativa a meio caminho entre a rejeição e a aprovação da lei do impedimento legítimo. O Tribunal Constitucional decidiu reduzir sensivelmente o campo de aplicação da lei sem, no entanto, invalidá-la. Dessa forma, escolheu apenas eliminar o mecanismo que permitia, de modo automático, o não comparecimento de Berlusconi à Justiça. ;Não acho que a decisão tenha viés político. Mas acho que ela poderia ter um impacto político ainda maior;, observa Guzzetta. Por meio de um comunicado de imprensa, o gabinete do premiê divulgou nota lacônica. ;O primeiro-ministro não tem comentado, nem tem a intenção de comentar a decisão;, afirma o texto.