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Haiti chora os mortos do terremoto de 12 de janeiro de 2010

Porto Príncipe - Os haitianos começaram a congregar-se lentamente, nesta quarta-feira (12/1), para homenagear os quase 250 mil mortos do terremoto devastador que sacudiu o país no ano passado, em meio a uma tempestade política e uma epidemia de cólera. Em Porto Príncipe, a capital do país, milhares de pessoas com roupas de domingo e a Bíblia nas mãos começaram a se aproximar para a missa católica, prevista para ser celebrada na catedral de Porto Príncipe, em ruínas.

Uma multidão aguardada o culto religioso ao ar livre nos arredores do templo, que não é mais que um montão de escombros. Com a chegada dos sacerdotes após a longa procissão, os fiéis cantaram hinos e muitos deles, de pé sobre as ruínas, secavam as lágrimas aos gritos de "Aleluia". "É um dia de reflexão, um dia de oração", disse Roger Jean, de 64 anos, que pediu "ao Senhor uma oração especial para o Haiti, para que o Haiti mude, para que o Haiti continue vivendo". Roger Jean perdeu a esposa e três filhos no terremoto, "mas a vida continua", acrescentou.

Os ruídos da cidade devem se aplacar à medida que se aproximar as 16H53 locais (19H53 de Brasília), hora exata em que o sismo de magnitude 7 fez tremer a terra em 12 de janeiro de 2010, provocando a morte de 220.000 pessoas e deixando mais de um milhão sem teto. Balões brancos devem ser lançados em homenagem aos mortos.

A TV nacional exibe desde o amanhecer e sem interrupções imagens da catástrofe, mostrando corpos entre os escombros e os gritos aterrorizados dos sobreviventes. O presidente em fim de mandato René Préval tinha previsto assentar a pedra fundamental de um monumento em memória das vítimas.

As pessoas começaram a se concentrar desde a madrugada em volta dos templos em pé ou em barracas transformadas em centros de oração em várias partes da cidade, com as mulheres vestidas de branco, levando os filhos pela mão. No Campo de Marte, a algumas dezenas de metros do Palácio Presidencial em ruínas, mais de mil pessoas se reuniram para escutar o testemunho de um pastor americano que sobreviveu ao terremoto.

"Aqui estamos para celebrar a vida. Em 12 de janeiro (de 2010) foi a morte, hoje é a vida que nos chama", declarou Livio Dubernard, diretor da rádio protestante.

O aniversário do sismo também será motivo de reuniões em outros países, como os Estados Unidos. Em Miami, onde mora uma importante comunidade de haitianos, será inaugurado um mural em memória das vítimas.

Um ano depois da tragédia, o Haiti mantém as feridas abertas. A economia e a infraestrutura estão paralisadas, uma epidemia de cólera que começou em outubro continua castigando a população e mais de 800.000 pessoas ainda vivem em campos de refugiados, enquanto os trabalhos de reconstrução apenas acabam de começar.

O trabalho é gigantesco: é preciso terminar de retirar os escombros, realocar os sem-teto, proteger um meio ambiente degradado e reformular o sistema educacional que atualmente se ocupa apenas da metade das crianças do país. Os doadores internacionais prometeram cerca de 10 bilhões de dólares, mas só uma parte foi liberada, à espera de que a situação política do país se estabilize.

Uma das preocupações mais imediatas diz respeito à epidemia de cólera, que matou 3.758 pessoas e deixou mais de 170.000 doentes. A Organização Mundial da Saúde (OMS) advertiu que a propagação ainda não foi contida. As homenagens se realizam, ainda, em meio a uma crise política, provocada pela impugnação dos resultados do primeiro turno das eleições presidenciais celebradas em 28 de novembro.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) anunciou que a entrega do relatório sobre as eleições, onde recomenda a retirada do candidato oficialista acusado de fraude, ficou em suspenso para não perturbar as cerimônias solenes desta quarta-feira. A data do segundo turno no qual devem se enfrentar a ex-primeira dama Mirlande Manigat e o cantor popular Michel Martelly, não foi marcada ainda e na segunda-feira o presidente René Preval explicou que não poderá entregar o poder em 7 de fevereiro, como estava previsto porque "não temos presidente eleito".