Enquanto muitos californianos sonham com a aprovação da legalização da maconha no plebiscito de hoje, muitos presidentes latino-americanos começam a ter pesadelos. %u201CComo eu vou dizer a um fazendeiro no meu país que, se ele plantar maconha, eu o colocarei na prisão, quando no estado mais rico dos EUA é legal produzir, traficar e consumir o mesmo produto?%u201D, questionou o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. No fim do mês passado, na cúpula do Grupo de Tuxtla, na Colômbia, presidentes e altos representantes dos países-membros concluíram que, se a maconha for legalizada na Califórnia, seus governos terão de rever suas políticas antidrogas.
O foro de Tuxtla é formado por Belize, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, México, Panamá e República Dominicana, que totalizam uma população de 212 milhões de habitantes. Os participantes da cúpula também pediram mais %u201Cconsistência e congruência%u201D das nações %u201Cconsumidoras%u201D na hora de propor políticas sobre drogas. %u201CElas não podem apoiar a criminalização dessas atividades em um ou outro país se, ao mesmo tempo, apoiam a legalização aberta ou velada da produção e do consumo no próprio território%u201D, diz a declaração final do encontro.
A Proposição 19, como é chamado o projeto de legalização do uso recreativo da maconha, será votada na mesma eleição em que os californianos escolherão o novo governador, um senador, os deputados federais e o novo legislativo estadual. Se a decisão for favorável, adultos com mais de 21 anos poderão ter até uma onça (28g) de maconha e cultivar até 7m; da erva. O texto prevê locais autorizados para a venda da droga e normas que limitarão os locais de consumo %u2014 inclusive com a proibição de usar a maconha em lugares públicos fechados.
O presidente mexicano, Felipe Calderón, considera uma %u201Cinconsistência terrível%u201D que uma decisão desse tipo seja tomada de forma unilateral. %u201CHá décadas eles (os americanos) exercem pressão e exigem que o México e outros países controlem, reduzam e lutem contra o tráfico de drogas, e não há um esforço efetivo para reduzir o consumo das drogas (nos EUA)%u201D, disse durante a cúpula.
O californiano Ryan Hemming, mestre em Relações Internacionais pela UnB, é a favor da legalização. Ele recorda que desde 1996 existe o Cannabis Club, uma associação que facilita legalmente a compra e a produção da maconha mediante prescrição médica. %u201CUm amigo meu tinha câncer e usava a maconha para abrir o apetite. Ele já morreu, mas, graças à associação, pôde ter acesso ao tratamento%u201D, disse Hemming ao Correio. Atualmente, o uso medicinal da erva é autorizado no Distrito de Columbia e em 14 estados americanos.
Questionado sobre a consequência das decisões de seu estado natal para países vizinhos, Hemming considera que os latino-americanos teriam de avaliar se têm condições políticas para legalizar a maconha. Em caso positivo, deveriam acompanhar a liberalização, que poderia apresentar inclusive vantagens econômicas. %u201COs impostos permitem ao governo ter controle sobre a venda da maconha, e talvez isso até diminuísse a guerra do narcotráfico%u201D, avalia o mestre da UnB.
José Jacobo Femat, presidente nacional da Central de Organizações Camponesas e Populares (Cocyp) do México, defendeu que o país também comece a discutir a legalização da produção e do consumo de maconha, para evitar que milhares de agricultores sejam cooptados pelo crime organizado. %u201CÉ urgente acabar com os grupos de poder que se vêm beneficiados pelos cartéis das drogas e outorgar o controle da produção, distribuição e venda a laboratórios especializados, como se faz com os medicamentos controlados%u201D, destacou.
Soros na campanha
O investidor multimilionário George Soros doou US$ 1 milhão para a campanha pela aprovação da Proposta 19. ;Regular e taxar a maconha poderá economizar milhões de dólares dos contribuintes com forças policiais e prisões e, ao mesmo tempo, garantir milhões todo ano (para o Estado);. Pesquisas indicam que a lei geraria mais de US$ 1,4 bilhão em receita fiscal para a Califórnia. Por outro lado, há consumidores da erva que são contra a proposta. O grupo ;Não à 19; alega que hoje, na Califórnia, qualquer pessoa consegue uma receita médica por menos de US$ 100 e já consome 28g da erva. Se o projeto passar, os impostos tornarão a maconha mais cara em benefício dos cofres públicos.