Buenos Aires - A morte do ex-chefe de Estado argentino Néstor Kirchner (2003-2007), homem mais influente do país, mexeu com o cenário político e desestabilizou a esposa, a presidente Cristina Kirchner, agora privada do principal conselheiro.
Kirchner havia renunciado a um segundo mandato em 2007, preferindo dar apoio à mulher, ao lado de quem exercia grande influência, a ponto de alguns analistas afirmarem que ele governava em parceria com a esposa.
"A partida de Kirchner dá a impressão de que foi o próprio presidente que morreu", revelou o analista Rosendo Fraga, do Instituto Nueva Mayoria. "É a primeira vez na história da Argentina que o falecimento de alguém, que não é presidente, cria tal situação".
Cristina Kirchner "trabalhou até o momento como primeira-ministra, colocando-se em palavras e em imagens, corrigindo, às vezes um pouco, uma construção política e econômica elaborada essencialmente pelo marido", escreveu o editor do jornal La Nación, Carlos Pagni. "Onde ela vai agora procurar esta inspiração?", acrescentou.
Cristina Kirchner está "à frente do país, mas ela ficou muito sozinha", declarou Estela Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio, organização que luta para encontrar os bebês roubados durante a ditadura (1976-1983).
O vice-presidente da República, Julio Cobos, discorda, no entanto, e diz estar convicto de que Cristina estará à altura do desafio.
"A presidente mostrou que tem a força e a autoridade necessárias para governar: ela levará alguns dias para superar a perda, mas conseguirá, com apoio de toda a classe política", disse.
O ex-presidente Eduardo Duhalde, mentor e rival de Kirchner, que o ajudou a chegar à presidência em 2003, convocou todos os argentinos a apoiar Cristina.
Para o analista Rosendo Fraga, a morte de Néstor Kirchner permite à esposa "exercer, enfim, o poder, a um ano das eleições presidenciais". "Ela tem a possibilidade de tomar distância de Hugo Moyano e talvez pôr um fim a sua influência", disse.
Na opinião dele, a Cristina Kirchner "tem diante de si uma oportunidade histórica: a de cessar de ser a presidente de uma facção para tornar-se a de todos os argentinos". "É uma situação paradoxal: o governo se beneficia de um crescimento (econômico) anual de 9%, mas tem apenas o apoio de um argentino em três".
Há uma razão para isso, segundo ele: Kirchner "deixou para a esposa um governo com uma economia sólida, mas em conflito com agricultores, a Corte Suprema, o Congresso, a Igreja católica e as principais mídias".