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Caridade islâmica se mobiliza rapidamente no Paquistão e preocupa EUA

As organizações de caridade islâmicas se mobilizaram com mais agilidade que o governo para socorrer as vítimas das inundações que causaram a pior crise humanitária do Paquistão, provocando preocupação nos Estados Unidos, que suspeitam da influência dos talibãs sobre estas ONGs.

A Jamaat-ud-Dawa (JuD), oficialmente proibida no Paquistão e listada pela ONU como organização terrorista, teve atuação ostensiva nos últimos dias ao lados dos quase 15 milhões de paquistaneses afetados pela catástrofe. Muitos perderam tudo, e dependem totalmente da ajuda humanitária para sobreviver.

Estas organizações são recebidas com alívio pelas vítimas, que ao mesmo tempo denunciam a ineficiência do governo desde o começo da crise.

"Estamos entregando comida, roupas, medicamentos, barracas, utensílios e 5.000 rúpias (cerca de 58 dólares) em dinheiro para cada família", explicou à AFP Atique Chohan, porta-voz da JuD na província de Jiber Pajtunjwa (noroeste), onde o talibã é bastante ativo.

"Já ajudamos 250.000 pessoas até agora", acrescentou, falando em um acampamento montado por um braço da JuD no distrito de Nowshehra - cujo chefe, Hafiz Saeed, é considerado um terrorista pela Índia e pelos Estados Unidos.

Saeed é fundador do Lasjar-e-Taiba (LeT), grupo armado rebelde que atua na Cachemira proibido no Paquistão e acusado de ter perpetrado os violentos atentados que deixaram 186 mortos em Mumbai, no fim de 2008.

[SAIBAMAIS]A mobilização destas ONGs tem tirado o sono de muitos em Washington, que enxergam nestas organizações uma ferramenta para a propagação do extremismo islâmico.

Os EUA anunciaram o envio de mais 20 milhões de dólares em ajuda humanitária aos desabrigados, elevando a 55 milhões o montante destinado à catástrofe paquistanesa, aliado chave contra os rebeldes islamitas na região.

Na terça-feira, os rebeldes do Movimento dos Talibãs do Paquistão (TTP) fizeram um apelo ao governo para que recuse qualquer ajuda dos Estados Unidos, afirmando que eles próprios doariam até 20 milhões de dólares às vítimas das inundações.

A ONU, por sua vez, instou a comunidade internacional a doar mais dinheiro, e destacou que a vida de seis milhões de pessoas está em jogo.

O enviado especial das Nações Unidas para o Paquistão, Jean-Maurice Ripert, declarou que a ONU precisa ajudar o governo paquistanês a impedir que os extremistas islâmicos saiam fortalecidos da situação.

"Todos nós esperamos que os militantes não aproveitem as circusntâncias para marcar pontos", declarou Ripert ao jornal francês Le Monde.

As vítimas das inundações concentram suas críticas no governo e no presidente, Asif Ali Zardari, que apenas esta semana retornou ao Paquistão. Ele estava na Europa, e decidiu manter a agenda de visitas oficiais mesmo com o país mergulhado no caos.

"Organizações religiosas como a JuD nos ajudam mais", destacou Ghulam Haider, 25 anos, motorista de taxi cuja casa, em Nowshehra, foi arrastada pela enchente.

Nos Estados Unidos, Anthony Cordesman, conselheiro da administração do presidente Barack Obama para Afeganistão e Paquistão em Washington, teme que a situação "torne o Paquistão ainda mais vulnerável ao extremismo".

"E um Paquistão radicalizado reforça a ameaça terrorista", apontou.