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Primeiros resultados da eleição em Ruanda indicam vitória de Paul Kagame

Kigali (Ruanda) - A Comissão Eleitoral Nacional de Ruanda divulgou, na madrugada desta terça-feira (10/8), os primeiros resultados da eleição presidencial realizada ontem. O atual presidente, Paul Kagame, apareceu com 92,9% dos votos e está virtualmente reeleito para mais uma mandato de sete anos.

A contagem dos votos começou logo depois do fechamento das urnas, às 15h locais (10h em Brasília). Damascene Ntawukuriryayo, do Partido Social Democrata (PDS), teve 5% dos votos. Proper Higino, do Partido Liberal (LP), estava com 1,5%, e Alvera Mukubaramba, do Partido para o Progresso e Concordância (PPC), teve 0,7%.

Kagame foi esperar pelos resultados com milhares de correligionários no Amahoro National Stadium (Estádio Nacional da Paz). O presidente usava um boné da campanha e dançou acompanhado da primeira-dama e de líderes do seu partido, a Frente Patriótica Ruandesa (RPF). Os cantores interpretavam as músicas usadas na campanha eleitoral, em vários ritmos. Kagame chegou para a festa antes da meia-noite (21h em Brasília), enquanto o resultado parcial foi divulgado somente às 4h (23h de segunda-feira em Brasília).

Kagame dedicou a vitória ao povo de Ruanda e disse que o resultado é uma demonstração da dedicação e compromisso apresentados ao longo da campanha. Acrescentou que o sucesso da eleição é uma prova de que o país respeita seus valores. Também pediu que continuem com o apoio aos programas de governo e que mantenham o passo do desenvolvimento e da unidade nacional.

Em entrevista à TV Pública Ruandesa, logo depois da divulgação dos resultados parciais, o presidente do PSD, Vincent Biruta, parabenizou Kagame pela vitória e confirmou seu apoio ao governo.

De acordo com o chefe da missão de observadores da União Africana, Anyl Gaian, ;não há nada adverso a informar; a respeito do processo eleitoral e do início da apuração. Ele disse ter recebido a informação de membros da oposição de que pelo menos uma zona eleitoral trabalhou de madrugada, antes da abertura oficial do pleito.

Também ouviu de repórteres de veículos internacionais que eles tinham entrevistado pessoas que afirmaram só ter ido votar por medo de represálias, como ser presos. Segundo Gaian, são fatos não confirmados. Até agora, reforçou, os observadores da União Africana consideram as eleições ;justas e tranquilas;.

Kagame dirige Ruanda desde 2000, quando era vice-presidente, e assumiu o poder, escolhido pelo Parlamento, para substituir o então presidente Pasteur Bizimungu, de origem Hutu, que havia renunciado. Da etnia Tutsi, Kagame liderava a oposição no exílio em 1994, quando retornou ao país logo depois do genocídio que matou mais de 800 mil pessoas em pouco mais de três meses. Ele é fundador do partido Frente Patriótica Ruandesa (RPF), que está no poder há 16 anos.

Ruanda tem um pequeno território, apertado entre o Burundi, a República Democrática do Congo, Uganda e a Tanzânia. São 26 mil quilômetros quadrados ; pouco maior que o menor estado brasileiro em extensão, Sergipe - e uma população de apenas 10 milhões de habitantes. Sem grandes reservas naturais, apostou em atrair o setor de serviços nos últimos dez anos.

Desde então, os ganhos médios da população melhoraram, o combate à corrupção recebe elogios internacionais e as mulheres têm grande espaço na vida pública. Os recursos não param de chegar a Ruanda, considerado pelo Banco Mundial um dos cinco países africanos mais seguros para investir.

Além de receber empresas estrangeiras, o governo passou a investir em infra-estrutura. As estradas estão mais modernas, o fornecimento de energia elétrica está sendo melhorado e uma potente rede de fibra ótica está sendo instalada para ligar o país de ponta a ponta. No centro de Kigali, marcado por construções baixas e inúmeras colinas, já surgem os primeiros edifícios envidraçados.

Antes da eleição, o governo negou acusações de grupos de direitos humanos de que estava calando a oposição. Jornais deixaram de circular em abril e um jornalista que criticava o governo foi baleado na cabeça. Opositores foram presos acusados de incitar as diferenças étnicas ; que causaram o genocídio de 1994. Eles não obtiveram registro para concorrer.

Diferentemente de 2003, até agora, nesta eleição não foi registrada nenhuma ocorrência de violência.

Saiba mais sobre o genocídio em Ruanda:

Em 6 de abril de 1994, um avião que levava os presidentes de Ruanda, Juvenal Habyarimana, e do Burundi, Cyprien Ntaryamira, foi derrubado por um foguete nas proximidades do aeroporto de Kigali, capital ruandesa. Habyarimana, de origem Hutu, era acusado por integrantes de sua própria etnia de ter sido leniente ao assinar um acordo de paz com os opositores tutsis dois anos antes.

O vácuo de poder foi ocupado pelo caos. Em pouco mais de três meses, cerca de 800 mil pessoas, a maioria tutsis (mas também hutus moderados) foram mortos. Entre as vítimas estavam, inclusive, governantes que tentavam acalmar a situação. Os assassinatos em série foram creditados aos hutus extremados e ao Exército.

A ordem voltou à força. Em julho de 1994, a Frente Patriótica Ruandesa (RPF), formada por tutsis refugiados nos países vizinhos e liderada por Paul Kagame, conseguiu dominar o exército de 400 mil hutus. Dois milhões de civis foram forçados a exilar-se nos vizinhos Burundi, Tanzânia e Zaire (hoje República Democrática do Congo).

Desde 1996, os líderes envolvidos no genocídio são julgados pelos crimes no Tribunal Internacional Criminal de Ruanda, instalado na Tanzânia. Em Ruanda, cerca de 1 milhão de pessoas enfrentam acusações em tribunais populares ; as guacacas. Em 2002, governo e oposição firmaram um termo de paz. No ano seguinte, houve a primeira eleição presidencial e Paul Kagame foi eleito com mais de 85% dos votos.