O especialista da ONU pelo direito à expressão pediu nesta terça-feira (13/7) ao governo italiano de Silvio Berlusconi o abandono do projeto de lei visando a limitar o uso de escutas telefônicas pela imprensa, o que provocou uma reação irritada de Roma.
"Eu sei bem que o projeto de lei foi introduzido em razão das preocupações sobre as consequências da publicação de informes obtidos por escutas telefônicas, pelos processos jurídicos e o direito à vida privada. Entretanto, o projeto de lei na forma atual não constitui uma resposta adaptada a essas preocupações e ameaça a liberdade de expressão", julgou Frank La Rue.
"Estou verdadeiramente desconcertado e surpreso pela posição do representante da ONU", retorquiu o ministro italiano das Relações Exteriores, Franco Frattini, cidado pela agência de notícias Ansa. "Em todos os países democráticos, o parlamento é soberano e decide", acrescentou Frattini durante uma visita a Milão, norte da Itália.
O projeto de lei, adotado no Senado em 10 de junho e que ainda deve ser aprovado pelos deputados, prevê até dois meses de prisão e multa de até 464.700 euros aos veículos (impressos ou audiovisuais) que difundirem escutas ou gravações de áudio ou vídeo durante uma investigação judicial.
Além disso, os não jornalistas incorrem em pena de quatro anos de prisão, revelou La Rue, relator independente da ONU sobre a Liberdade de Expressão.
"Uma sentença tão pesada pode comprometer o direito de todos os indivíduos a buscar e compartilhar informações e violar a Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, na qual a Itália participa", alertou o especialista da ONU. Segundo ele, as sanções previstas são "desproporcionais à ofensa".
"Dada a duração excessiva de processos judiciais na Itália, as disposições da lei podem dificultar o trabalho dos jornalistas para realizar investigações sobre questões de interesse público, como, por exemplo, a corrupção", observou o advogado guatemalteco.
Por isso, La Rue pediu às autoridades italianas que se abstenham a aprovar o projeto na forma atual e se engajem em um diálogo verdadeiro com todas as partes interessadas, em particular as organizações de jornalistas e meios de comunicação, para garantir que as preocupações sejam levadas em consideração.
Os jornalistas italianos protestaram na sexta-feira, com um "dia de silêncio", com uma greve geral nos jornais, rádios e televisões contra o projeto chamado de "lei da mordaça".
A oposição de esquerda e a maioria dos principais meios de comunicação veem o projeto como uma tentativa de silenciar a imprensa e impedir a divulgação de informações embaraçosas para o primeiro-ministro.