Jornal Correio Braziliense

Mundo

Cidades da América Latina: desiguais, porém férteis campos para o futuro

De Lima a Montevidéu, passando por Bogotá e Rio de Janeiro, as principais cidades da América Latina revelam desigualdades no acesso de seus cidadãos às condições que melhorem sua qualidade de vida, mas ao mesmo tempo são campo fértil para projetos com vistas para o futuro.

Assim disseram, na sexta-feira (2/7), em Paris, altos funcionários políticos, institucionais e econômicos de organismos internacionais e empresas privadas da região na conferência "Cidades Latino-americanas e Qualidade de vida: estado de situação e perspectiva", organizada pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD) e a Corporação Andina de Fomento (CAF).

Nos últimos 20 anos, a região tem sido cenário de avanços nos campos de habitação, transporte, espaços públicos, acesso à educação e à saúde, mas "ainda resta muito por fazer", afirmaram os organizadores da conferência, à qual assistiram mais de cem pesquisadores, autoridades locais e representantes políticos.

"Devemos nos preocupar com a disparidade nas condições econômicas porque condicionam o acesso aos serviços básicos", disse Pablo Sanguinetti, diretor de Pesquisas Socioeconômicas da CAF.

No entanto, "a qualidade de vida depende muitas vezes de muitos mais elementos que não têm a ver com a renda", mas com "a segurança, o acesso à cultura, ao transporte público e à educação", afirmou.

Sanguinetti destacou o papel desempenhado por três indicadores - mortalidade, taxa de alfabetismo e expectativa de vida -, que permitem estabelecer o "grau de convergência" dos moradores de uma cidade, isto é, a qualidade de vida e o bem-estar, "que é o que nos importa".

"De que forma as cidades podem gerar mais convergência entre os Estados, as regiões e entre si mesmas para ter um impacto no desenvolvimento", questionou Michael Penfold, vice-diretor de Políticas Públicas e Competência da CAF.

Segundo Penfold, é preciso avançar em "estratégias de desenvolvimento local" que permitam promover os investimentos, como o caso da agência de promoção "Invest Bogotá", que permitiu um "bem sucedido processo de transformação" da capital colombiana a partir da "marca da localidade".

Outro caso foi o do "Tramifácil" em Lima, que permitiu aumentar em 600% a formalização de negócios em 2007-2008 em um país onde o "gigantesco" mercado informal de trabalho tem a ver com os altos custos administrativos.

A "promoção de ;clusters; (conglomerados) produtivos" é outra das experiências bem sucedidas na região entre os armazéns de Mendoza (Argentina), que permitiu "consolidar" as melhorias obtidas na produção e na exportação.

O estado mexicano de Chiapas é um exemplo de revalorização de uma região pobre, caracterizada por um "conflito e pela violência", terra fértil em um processo de "transformação social e turística" que permitiu dinamizar as pequenas e médias empresas, explicou.

Do ponto de vista institucional, a cidade do Rio de Janeiro, com seis milhões de habitantes, enfrenta o desafio de adaptar sua infraestrutura urbana com vistas aos Jogos Olímpicos de 2016, explicou Eduarda La Rocque, secretária de Fazenda do município do Rio.

O governo local, que quer introduzir o conceito de "meritocracia" no setor público, propõe dois projetos chave: revitalizar o Porto do Rio ao estilo do Puerto Madero (Buenos Aires) e reestruturar o transporte urbano.

Montevidéu, onde a intendente Hyara Rodríguez compartilha a sugestão do Prêmio Nobel da Economia, Josep Stiglitz, de estabelecer o índice de "Felicidade Nacional Bruta" para medir a qualidade de vida dos cidadãos, apresentou o projeto de renovação do transporte público que prevê a interligação dos bairros da cidade e o desenvolvimento de ciclovias.

O ponto de vista industrial ficou por conta de Philippe Delleur, gerente para a América Latina do grupo francês Alstom, que lamentou que para os latino-americanos "o único critério de escolha seja o preço" e que até agora não tenham refletido sobre uma "visão integrada de desenvolvimento".

Delleur defendeu a "intermodalidade" como "única solução" no setor dos transportes para as cidades da região e apontou o bonde como a melhor opção, inclusive para os políticos.

"Um prefeito pode anunciar a construção do bonde e inaugurá-lo antes do fim do seu mandato", comentou o industrial, ao destacar as virtudes deste meio de transporte mais ecológico, que está voltando a se impor nos países do Mediterrâneo.