Brasil e Turquia continuam dispostos a buscar um acordo entre as potências ocidentais e o Irã sobre seu programa nuclear(1). A garantia foi dada pelo chanceler turco, Ahmet Davutoglu, um dia depois de o colega Celso Amorim afirmar que o Brasil não vai ;agir de novo por iniciativa própria, a menos que peçam;. ;Estamos determinados a continuar nossos esforços e o Brasil vai continuar conosco;, anunciou Davutoglu. Em Bucareste, na Romênia, Amorim elogiou a decisão de Teerã de manter o compromisso assumido com os dois países para a troca de urânio na Turquia e não adotar uma ;reação inflexível;. O Irã prometeu responder ;em breve; às cartas enviadas pelo Grupo de Viena ; Estados Unidos, Rússia, França e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) ; sobre a Declaração de Teerã.
O chanceler turco relatou uma conversa que manteve no sábado com os colegas brasileiro e iraniano, na qual foi reafirmada a determinação de continuar os esforços por uma solução negociada. Amorim confirmou que o Irã ainda está disposto a conversar. ;Há um desejo de manter o acordo como uma base, o que é positivo, porque, após o que aconteceu no Conselho de Segurança, você poderia temer uma reação menos flexível por parte do Irã;, argumentou. O ministro brasileiro elogiou a disposição da França de iniciar uma conversa com base no acordo tripartite: segundo o chanceler iraniano, Manouchehr Mottaki, o presidente Nicolas Sarkozy teria se oferecido para dialogar.
Para o especialista da Universidade de Brasília (UnB) Virgílio Arraes, no entanto, o governo brasileiro deveria pesar as vantagens e desvantagens de se oferecer mais uma vez como ;facilitador;. ;Os dois maiores interessados, EUA e Irã, não conseguem chegar a um denominador comum, ainda que mínimo. A iniciativa do Brasil (e da Turquia) foi válida, mas insistir nela talvez não seja;, pondera.
O porta-voz da chancelaria iraniana, Ramin Mehmanparast, destacou que seu governo ainda vê no acordo sobre a troca de urânio uma oportunidade para cooperação, que ;não deve ser ofuscada por demandas que vão contra os direitos dos membros da AIEA;. Ele informou que as cartas do Grupo de Viena sobre o documento enviado por Teerã, já como parte do acordo assinado com Brasil e Turquia, também serão respondidas. ;A resposta do Irã às cartas dos três países já foi finalizada e será enviada em breve;, anunciou.
Protesto
Dos 15 países-membros do Conselho de Segurança, 12 votaram a favor da quarta rodada de sanções contra Teerã. Eles também receberão em breve cartas do governo iraniano ; só que de denúncia. Segundo Teerã, as acusações que constam no texto da Resolução 1.929, para justificar as medidas, não foram provadas. ;Ao contrário, o último relatório do diretor-geral da AIEA, publicado apenas um dia antes da resolução, reiterou que nossas atividades não apresentam qualquer desvio dos objetivos pacíficos;, afirma o Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã na carta.
Mottaki disse que seu país não considera válidos os votos dos cinco membros permanentes e sete não permanentes ; entre eles México, Japão, Áustria e Gabão. ;Temos declarado as nossas opiniões para os países de forma aberta e clara, mas não respeitamos o seu voto como influente, uma vez que são abusivos e ilegais;, disse. Mottaki ainda afirmou que a decisão de barrar a entrada de dois inspetores da AIEA serviu como uma ;lembrança; para que o diretor da agência, Yukiya Amano, monitore seus funcionários para que não violem as regras da agência. O Irã acusa os inspetores de terem deixado vazar para a imprensa informações sigilosas.
1 - Espião no céu
Israel colocou ontem em órbita um satélite-espião que, embora os porta-vozes oficiais tenham se recusado a comentar, terá a missão de monitorar o programa nuclear iraniano. O Ofek 9 foi lançado de uma base no sul do país e, como os veículos anteriores da série Ofek, está capacitado para fotografar com alta resolução alvos específicos na superfície. Israel acusa o Irã de desenvolver uma bomba atômica e não esconde que tem planos para atacar instalações, caso detecte uma ameaça à sua segurança.
A caminho de Gaza
O bloqueio naval imposto por Israel à Faixa de Gaza entra em novo capítulo com o envio de um cargueiro iraniano que pretende levar 1.100 toneladas de donativos para o território palestino. O navio, batizado de Crianças de Gaza e a serviço do Crescente Vermelho ; equivalente muçulmano da Cruz Vermelha ;, deve partir no domingo do porto de Bandar Abbas. A chegada a Gaza está prevista para 14 dias depois, mas o comandante das Forças de Defesa de Israel, general Gabi Ashkenazi, já deixou claro que a embarcação será abordada e revistada, para garantir que não transporta material bélico.
;Temos o direito natural de examinar (os navios) e prevenir a entrada de armas em Gaza;, disse o general durante encontro com militares ultra-ortodoxos em Kiryat Shmona, colônia judaica no território palestino da Cisjordânia. ;É importante fincarmos o pé nesse direito, porque não podemos permitir que Gaza se torne um porto iraniano;, completou.
O encarregado de Assuntos Internacionais do Crescente Vermelho iraniano, Abdolrauf Adib-zadeh, fez o anúncio oficial da partida do navio em Teerã e garantiu que a carga se compõe ;exclusivamente de ajuda humanitária, em particular medicamentos, alimentos, roupas infantis e brinquedos doados às crianças de Gaza pelas crianças iranianas;. De acordo com Adib-zadeh, a bordo viajarão apenas cinco voluntários da organização e cinco jornalistas.
No último dia 31, comandos israelenses interceptaram em águas internacionais uma flotilha que partira da Turquia com a intenção declarada de levar donativos a Gaza. Na abordagem do navio Mavi Marmara, os militares encontraram resistência e mataram nove ativistas durante o confronto. O incidente desencadeou protestos pelo mundo afora e clamores pela suspensão do bloqueio naval ao território. O Conselho de Segurança das Nações Unidas pediu a abertura de um inquérito internacional, mas Israel optou por apenas convidar dois observadores estrangeiros para integrar uma comissão de investigação própria.
Mais incisivo que o general Ashkenazi foi um porta-voz da chancelaria israelense, Yigal Palmor, que colocou em dúvida a natureza dos donativos iranianos. ;Ninguém em sã consciência pode acreditar que um navio mandado pelos aiatolás e pela Guarda Revolucionária (iraniana) pode ter algo a ver com ajuda humanitária;, disparou o porta-voz. ;Não acredito que um só país da região permitiria a um desses navios dos aiatolás aproximar-se da sua costa.; O Egito, que controla o Canal de Suez, passagem obrigatória para o cargueiro iraniano, deu sinal verde. ;Se ele vem de um país que não está em guerra com o Egito, se não polui o mar, o ar nem a terra, será autorizado a passar;, disse o ministro dos Transportes, Mohammad Abdelwahab.