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Ataque a frota humanitária estremece relações de Turquia e Israel

O sangrento ataque israelense a uma frota humanitária e a dura reação turca estremeceram as relações entre os dois países e geraram questionamentos sobre como a Turquia atuará no futuro no contexto regional e internacional.

"Israel perdeu seu único amigo" na região, que era a Turquia, afirmou Amberin Zaman, especialista em assuntos de Oriente Médio, ao jornal Haber Türk, depois do ataque a uma frota pró-palestina de ajuda a Gaza que deixou vítimas turcas.

Antes aliados estratégicos em contratos de armamento, troca de informação e manobras conjuntas, Turquia e Israel deverão cortar relações por algum tempo, preveem especialistas turcos.

A Turquia - que chamou para consultas seu embaixador em Israel e um diplomata ocidental em Ancara - deve estar se perguntando agora que argumento adotará para expulsar o embaixador israelense.

Será "difícil retomar" as relações bilaterais, comenta Sedat Ergin, editorialista do jornal de grande circulação Hürriyet.

E ele tem razão, agora que o primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, e seu ministro das Relações Exteriores, Ahmet Davutoglu, adotaram violentas condenações contra a ação israelense.

"Terrorismo de Estado desumano", acusou na segunda-feira Erdogan. "Massacre sangrento", completou nesta terça-feira.

O ataque dos comandos israelenses "equivale a banditismo e pirataria, a assassinato de Estado" e Israel "perdeu toda a legitimidade internacional", acusou o chefe diplomático turco, o que parece indicar um ponto de não retorno nas relações bilaterais.

Relações que se degradaram depois da ofensiva israelense a Gaza no fim de 2008, violentamente criticada pela Turquia, à medida que melhoraram de forma espetacular as relações entre Ancara e os países árabes ou muçulmanos como Irã, Iraque, Estados do Golfo e em especial Síria, o que o Estado judeu vê com maus olhos.

O acordo sobre o tema nuclear iraniano, alcançado em meados de maio entre Turquia, Brasil e Irã, esfriou as relações turco-israelenses. É uma "impostura", disse o primeiro-ministro israelense, Bejamin Netanyahu.

Mas apesar de a ruptura parecer consumada com Israel, é bom questionar se, com isso, a Turquia está dando as costas aos países ocidentais.

"Esta é a impressão inicial, mas é falsa", afirmou Mehmet Ali Birand, do Turkish Daily News, que lembra os laços políticos e econômicos importantes que esse país membro da OTAN tem com Estados Unidos e Europa.

"A Turquia participa de um jogo arriscado para conseguir a liderança na região", acrescenta o analista.

Ele completa que o governo de Erdogan precisa também endossar a opinião pública no apoio à causa palestina, a menos de um ano das eleições legislativas.

No total, 20.000 manifestantes gritaram palavras de ordem contra Israel e queimaram bandeiras desse país nas ruas de Istambul na segunda-feira.

"A diplomacia turca se desliga de seu alinhamento sistemático com o Ocidente, sem dar as costas aos ocidentais", afirmou à AFP Ahmet Insel, da Universidade de Galatarasay (Istambul).

Ele completou que a mensagem do governo é esta: "nos viramos sozinhos e desempenhamos o papel de potência regional".

E o pouco avanço nas negociações para aderir à União Europeia só ajudam a corroborar essa atitude, segundo os analistas.