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Americanos, britânicos e franceses ignoram declarações de Ahmadinejad

Terminou em fracasso o primeiro dia da conferência para revisão do Tratado de Não Proliferação (TNP), assinado em 1970 com o fim de prevenir a disseminação de armas nucleares. O presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, acusado de burlar o tratado para obter a bomba atômica, esquivou-se de dar mais provas de que o programa nuclear de seu país tem fins exclusivamente civis. As potências ocidentais, que ameaçam Teerã com sanções, nem sequer ouviram o que ele tinha a dizer: as delegações dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França deixaram o salão da Assembleia Geral, em Nova York, lotado com representantes de mais 186 países, enquanto o oponente discursava.

O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, afirmou que Washington gostaria de ter ouvido uma promessa dos iranianos de que ;cumprirão seus compromissos; como país signatário do TNP. Gibbs alegou que, em vez disso, o que se ouviu foram ;acusações bárbaras;. Os americanos ficaram incomodados com o fato de Ahmadinejad ter defendido a criação de um órgão mundial independente que estabeleça um prazo para a eliminação dos arsenais nucleares ; uma cláusula do tratado que diz respeito aos EUA e às demais potências atômicas oficiais.

O mandatário iraniano reiterou suas críticas à nova política americana de ameaçar com armas nucleares nações que tenham firmado o TNP, mas que o desrespeitem ; na interpretação americana. A formulação foi recebida como ameaça velada ao Irã e à Coreia do Norte. ;Atacar instalações nucleares pacíficas é um desrespeito à paz e à segurança internacional;, disse. Ahmadinejad chegou a propor que os EUA fossem excluídos do comando da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). ;O governo dos EUA não deve ser membro do conselho diretor, pois além do uso de bombas atômicas durante a guerra, contra o Japão, adotaram a mesma estratégia contra o Iraque, com munição de urânio empobrecido;, afirmou Ahmadinejad.

Na abertura da conferência, o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, pediu à delegação iraniana para comprovar que seu programa nuclear se dedica somente a fins pacíficos e para aceitar a proposta de enriquecer seu urânio na Rússia e na França. Ahmadinejad respondeu que ;a bola não está do lado iraniano, mas no campo de outros negociadores;. A frase se referia ao fato de o Irã ainda aguardar uma resposta à sua contraproposta: receber o urânio enriquecido no mesmo momento da entrega do urânio bruto. Até o momento, as potências ocidentais se recusam a aceitar a sugestão. Brasil e Turquia vem tentando ajudar na solução do impasse, sugerindo que o minério seja enriquecido na Turquia.

Brasil


O chanceler brasileiro, Celso Amorim, também defendeu a eliminação de todas as armas nucleares, porém em termos menos agressivos. Amorim considerou que o TNP, da maneira como está redigido, divide o mundo entre ;os que têm; e ;os que não têm; armas nucleares, o que contribui para uma ;lógica perversa;: ;Enquanto alguns Estados possuírem as armas, outros Estados se sentirão tentados a adquiri-las ou desenvolvê-las;. O ministro recordou que, 40 anos depois da assinatura do TNP, o objetivo fundamental de eliminar as armas nucleares continua sendo ;uma miragem;. ;O Brasil está convencido de que a melhor forma de implementar a não proliferação é a completa destruição das armas nucleares;, completou.

Em reunião com a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, Amorim notou as divergências de posição. Enquanto o Brasil tenta conseguir a ;confiança; do Irã para resolver o impasse, Hillary reiterou que a ;pressão; é o melhor caminho. O chanceler não escondeu da imprensa que as divergências entre Brasília e Washington, nesse tema, persistem: ;Isso não se resolve com uma reunião;.

Enquanto alguns Estados possuírem as armas, outros Estados se sentirão tentados a adquiri-las ou desenvolvê-las;
Celso Amorim, ministro brasileiro das Relações Exteriores