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Premiê tenta exaltar desempenho na economia, mas não convence e paga pela gafe com aposentada

O primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, aproveitou cada fala no último debate pré-eleitoral para tentar mostrar que ainda é o mais preparado para lidar com a principal preocupação do eleitor britânico hoje: a economia. A tática do líder trabalhista era tirar o foco da gafe cometida na véspera ; quando foi gravado chamando uma eleitora de ;intolerante; ; e convencer o eleitorado de que foi um bom administrador ;nos bons e nos maus momentos;. No entanto, o esforço aparentemente não convenceu. A maior parte das pesquisas divulgadas logo após o embate político apontou vitória para o conservador David Cameron, enquanto Brown foi considerado pior até que o líder do Partido Liberal Democrata, Nick Clegg. A última cartada dos trabalhistas será explorar, até a próxima quinta-feira, o apoio que o ex-premiê Tony Blair ainda tem entre os britânicos: ele fará um tour político pelo país.

Segundo o levantamento do instituto YouGov para o jornal The Sun, 41% dos 1.151 telespectadores entrevistados disseram que Cameron teve o melhor desempenho, contra 32% que escolheram Clegg e 25% que apontaram o premiê. A sondagem da ComRes mostrou uma diferença menor: 35% para o conservador, seguido do liberal-democrata, com 33% dos votos, e do trabalhista, com 26%.

Brown chegou a pedir, durante o debate na Universidade de Birmingham, que os britânicos o julgassem pelos resultados econômicos de seu governo, e não por sua personalidade. ;Não é o meu futuro que importa. É o seu futuro que está na cédula eleitoral na próxima quinta-feira, e eu sou o homem para lutar por seu futuro;, declarou. A única menção ao episódio envolvendo a eleitora de Rochdale, que rendeu ao premiê manchetes negativas em praticamente todos os jornais britânicos, foi feita pelo próprio Brown, ao justificar que seu emprego é ;bastante exigente; e que, como se viu no dia anterior, ;nem sempre; ele acerta.

Durante os 90 minutos de debate, Brown, Cameron e Clegg mostraram que têm posições bastante divergentes quando os assuntos são economia, ajuda aos bancos e imigração. O confronto mais acirrado, no entanto, foi entre Cameron, que lidera as pesquisas(1) de opinião, e o premiê, que tenta recuperar ao menos a segunda posição, para manter parte das 345 cadeiras do Partido Trabalhista no Parlamento.

;Nossa economia está encalhada e é preciso mudar para devolvê-la ao rumo do crescimento;, disse um agressivo mas bastante seguro Cameron. O conservador prometeu reduzir o número de dependentes do sistema de seguridade social, diminuir o Estado e acertar o sistema bancário. Brown, entretanto, criticou a proposta do opositor de cortar 6 bilhões de libras do orçamento. ;Isso vai encolher a economia, pôr em risco nossos empregos e nossa qualidade de vida;, afirmou, comparando o plano de Cameron com o que o governo conservador teria feito para levar o país à depressão nos anos 1930.

[SAIBAMAIS]Clegg virou a bola da vez quando o debate enveredou para a imigração. Os líderes trabalhista e conservador condenaram a política liberal-democrata para o tema, que, segundo eles, daria ;anistia; aos estrangeiros em situação irregular. ;Não estou defendendo uma anistia. Mas nós precisamos fazer algo em relação a tanta gente que vive à margem da nossa economia. Brown e Cameron só querem negar que esse problema existe;, defendeu-se o azarão.

Blair na estrada
Hoje, os trabalhistas começam a colocar em ação sua última tática para tentar salvar o partido nas eleições do dia 6. O ex-premiê Tony Blair, que não fez aparições públicas desde seu último discurso, há quase um mês, percorrerá a região sudeste da Inglaterra em busca de votos. Segundo o jornal britânico The Guardian, o itinerário estava previsto mesmo antes da ;gafe; da última quarta-feira, mas será um pouco alterado nos próximos dias.

1 - Sem maioria
Uma pesquisa com economistas e analistas financeiros, divulgada ontem pela agência Reuters, indica uma chance de 65% de que as eleições no Reino Unido resultem em um Parlamento sem nenhum partido majoritário. O aumento de 10 pontos percentuais em relação ao último levantamento do tipo, fechado em 31 de março, deve-se ao crescimento do Partido Liberal-Democrata após os dois primeiros debates entre os candidatos a premiê. A chance de os conservadores ; que estão liderando as pesquisas ; conseguirem a maioria absoluta (326 das 650 cadeiras) está entre 23% e 25%. Em outubro, quando foi realizada a primeira sondagem, era de 75%, contra apenas 15% de chances para um Parlamento ;misto;.

Indiscrição desastrosa

;Ontem foi ontem. Hoje eu quero falar sobre economia;, afirmou o primeiro-ministro Gordon Brown pouco antes do último debate pré-eleitoral, ao visitar uma fábrica em West Midlands. O premiê se referia ao ato mais desastroso de sua campanha, cometido no dia anterior, quando um microfone esquecido preso à roupa captou o político criticando uma eleitora que lhe cobrara solução para o problema da imigração. A ;gafe; dominou as manchetes dos principais jornais britânicos ontem, e foi considerada até uma ;catástrofe política; para Brown, que tenta manter os trabalhistas no poder.

O premiê sabe o mal que pode ter causado a si próprio a uma semana das eleições, e tentou remediar de todas as formas. Foi à casa de Gillian Duffy, mulher a quem chamou de ;intolerante; sem saber que estava sendo gravado, para pedir desculpas. Depois, repetiu a ação no site trabalhista, onde escreveu que magoar a idosa era ;a última coisa que queria ter feito;. Em entrevista ao jornal Telegraph, Peter Duffy, sobrinho de Gillian, disse que a aposentada de 66 anos, eleitora declarada dos trabalhistas, aceitou o pedido de desculpas, mas ;ainda está triste;.

;Minha tia apresentou sua visão sobre o que ela tinha dito durante o dia e o que ele tinha dito. Ele pediu desculpas e foi embora;, contou Peter, acrescentando que sua tia pensou em sair da casa, em Rochdale (norte da Inglaterra), com Brown, mas a família convenceu-a do contrário. ;Não achei que era uma boa ideia naquele momento. Nós achamos que ela já tinha passado pelo bastante;, afirmou o sobrinho da nova ;celebridade;.

Para o jornal The Guardian, a gafe de Brown expõe a ;hipocrisia dos políticos;. ;Ontem não foi um bom dia para a campanha trabalhista. Mas também não foi um bom dia para os políticos. Foi um momento revelador, uma câmera que capturou muito daquilo que está errado no comportamento político. E, claro, foi um desastre para Gordon Brown;, avalia o editorial. ;Foi um acidente, mas infligiu um grande estrago ao reforçar a imagem do primeiro-ministro como irascível, inclinado a ofender os outros, e ao projetar que ele possui uma imagem em público e outra na privacidade;, ponderou o Times.

O centro de pesquisas YouGov, que tem realizado pesquisas de opinião diárias sobre a corrida eleitoral, mostrou que, de fato, o deslize do trabalhista não pegou nada bem. Logo após a divulgação da declaração, o partido de Brown já apresentava uma queda de dois pontos percentuais em relação ao dia anterior ; 27% de aprovação, contra 31% dos liberal-democratas.