A Venezuela vive hoje um dia marcado por protestos em todo o país. Grupos de oposição ao governo do presidente Hugo Chávez organizaram marchas populares contra o fechamento de seis canais de televisão na segunda-feira passada. O prefeito metropolitano de Caracas, Antonio Ledezma, disse que os atos de hoje servirão para mostrar ao governo o descontentamento com esta ;nova medida arbitrária e ilegal;, que busca ;instalar no país uma hegemonia comunicacional;.
Na segunda-feira, a decisão de tirar do ar a RCTV Internacional (1)e mais cinco emissoras de TV a cabo (American Network, América TV, Momentum, Ritmo Son e TV Chile) provocou a reação de estudantes, opositores e partidários do governo venezuelano, nas ruas das cidades mais populosas do país. Ontem, militares recorriam a Mérida, onde dois estudantes foram mortos a tiros enquanto participavam dos protestos. O jovem Yosinio Carrillo Torres, 15 anos, morreu na Avenida Las Américas. O segundo manifestante assassinado se chamava Marcos Rosales ; ele tinha 28 anos, cursava medicina e era líder estudantil do grupo Um Novo Tempo (UNT).
O governador Marcos Díaz Orellana fez um chamado à calma, suspendeu as aulas em todo o estado de Mérida e responsabilizou os setores ;contrarrevolucionarios; por criarem um clima de violência. Ele anunciou que uma comissão do Corpo de Investigações Penais e Criminalísticas deverá esclarecer a morte dos dois estudantes. O decano da Faculdade de Ciências Econômicas e Sociais da Universidade de Los Andes (ULA), Raúl Huizi, informou que cerca de 40 pessoas encapuzadas destruíram lanchonetes e centros de estudos, na noite de segunda. Em Anzoátegui, muitos alunos da Universidade Santa María também ficaram feridos.
As aulas permanecerão suspensas por tempo indeterminado. Nazik Alfakih, conselheiro da Faculdade de Direito da Universidade Católica Andrés Bello (UCAB), convocou toda a comunidade estudantil a mobilizar-se em seu estado. ;Temos que continuar os protestos contra o fechamento da RCTV e contra a insegurança que reina em toda a Venezuela;, disse Alfakih ao jornal El Universal.
Imprensa
As manifestações dividiram os jornalistas na Venezuela e em todo o mundo. José Gregorio Guédez, da organização não governamental Jornalistas pela Verdade, expressou seu pesar pelas famílias dos estudantes mortos, mas considerou que as manifestações eram ;atos de violência financiados por grupos opositores que envenenam os jovens para que saiam as ruas, enquanto eles se fecham em seus laboratórios;. ;A RCTV está utilizando o cenário para desestabilizar o país, porque seu único objetivo é a saída de Chávez;, disse Guédez. Em Viena, o Instituto Internacional de Imprensa (IPI) criticou a medida do governo venezuelano. ;A decisão de sábado de ordenar deter a transmissão se ajusta a um modelo de opressão dos meios de comunicação livres na Venezuela;, criticou o diretor do IPI, David Dadge, em nota à imprensa.
Em um primeiro momento, o presidente da Comissão Nacional das Telecomunicações (Conatel), Diosdado Cabello, explicou que as emissoras perderam suas concessões por descumprirem a Lei de Responsabilidade Social em Rádio e Televisão, ao não transmitirem discursos de Chávez e comunicados do governo venezuelano. Ontem, ao anunciar a medida, Cabello esclareceu que as redes de TV são consideradas canais nacionais, por transmitirem 90% de sua programação em conteúdos venezuelanos. Os canais devem contestar na Justiça a definição de meio de comunicação nacional e internacional.
Com os índices de aprovação abaixo de 50%, Chávez enfrenta agora as manifestações dos estudantes. A grande prova de fogo, porém, deve ocorrer no fim do ano, quando ocorrem as eleições legislativas. ;O povo tem em suas mãos uma fatura para este governo que lhe corta a luz, a água, que lhe fecha as janelas da informação. Vamos cobrá-la em 26 de setembro, quando devolvermos ao povo venezuelano um Parlamento que garanta o respeito à Constituição;, ressaltou o prefeito Ledezma.
1 - Da decadência ao triunfo
A RCTV foi suspensa em maio de 2007, data em que deixou de ser canal aberto. A justificativa era de que ela mantinha uma posição bastante crítica ao governo. A emissora conseguiu a proeza de motivar milhões de venezuelanos a assinarem, pela primeira vez, o sistema de televisão a cabo, para continuarem a assistir à programação. Dos 188 canais por assinatura, 24 eram nacionais e 164, internacionais. Em pouco tempo, a audiência subiu de 19% para 65%, e passou a ser líder absoluta da televisão por assinatura na Venezuela.