O nome da cidade que chorou seus mortos em 2001, após ser golpeada pelo terror, foi pronunciado ontem duas vezes, em uma mesma frase, pelo procurador geral dos Estados Unidos, Eric Holder. ;Depois de oito anos de atraso, aqueles que se confessaram responsáveis pelos ataques de 11 de setembro finalmente vão encarar a Justiça. Eles serão trazidos a Nova York ; a Nova York ; para responder por seus crimes em uma corte, apenas a alguns quarteirões de onde as torres gêmeas (do World Trade Center) se erguiam;, declarou. O kuweitiano Khalid Sheikh Mohammed, cérebro dos piores atentados da história, terá seu destino lançado nas mãos de um tribunal civil e poderá pagar com a vida pelo assassinato de 2.752 pessoas.
O mesmo deve ocorrer com Walled bin Attash, Ramzi Binalshibh, Mustafa Ahmad Al-Hawasawi e Ali Abd Al-Aziz Ali, suspeitos de terrorismo também detidos na base naval de Guantánamo, em Cuba. ;Os regulamentos federais nos autorizam a exigir a pena de morte para grandes crimes;, afirmou Holder. ;Vou certamente pedir aos promotores que requeiram a pena de morte para cada um dos acusados do 11 de setembro;, acrescentou.
Em visita ao Japão, o presidente norte-americano, Barack Obama, comentou a transferência dos supostos extremistas islâmicos para uma prisão federal em Nova York ; o que não deve ocorrer antes de 45 dias. ;Eu estou absolutamente convencido de que Khalid Sheikh Mohammed estará sujeito às mais exatas demandas da Justiça. O povo americano insiste nisso. Meu governo insiste nisso;, disse o chefe de Estado. A decisão causou polêmica entre a sociedade civil e os congressistas republicanos. ;A decisão da Casa Branca de trazer os acusados ao interior de nossas fronteiras (;), em vez de o fazer na segurança do próprio centro de detenção de Guantánamo, significa um passo atrás, representando um risco inútil para os americanos;, afirmou o líder da minoria republicana, Mitch McConnell.
Em entrevista ao Correio, Ed Kowalski, diretor da organização não governamental 9/11 Families for a Secure America (em Nova York), demonstrou preocupação com o julgamento em território norte-americano. ;Acreditamos que é uma decisão errada. As cortes civis não são lugar para se julgarem terroristas;, criticou. O empresário lembrou que os sete autores do primeiro atentado contra o World Trade Center, em 1993, também foram submetidos a uma corte civil entre 1994 e 1997. ;Em troca, tivemos o 11 de setembro, que custou a vida de 3 mil inocentes;, desabafou. Para ele, o processo em tribunais federais permitiria aos advogados dos réus realizarem uma manobra legal para terem acesso a informações importantes sobre o caso. ;Isso seria útil para que eles analisassem as acusações e moldassem a defesa;, acrescentou.
Kowalski cita como exemplo o julgamento do xeque Omar Abdel-Rahman, condenado à pena perpétua por ter planejado a explosão de 1993. ;O governo teve que revelar quem eram seus co-conspiradores, em 1995. Um deles era Osama bin Laden. Ao permitir que pessoas sejam julgadas nos Estados Unidos, você concede a mesma proteção que civis norte-americanos teriam. Esses indivíduos são criminosos de guerra. Isso põe em perigo a segurança deste país;, comentou.
Vitória
Ken Gude, analista de Segurança Nacional do Center for American Progress (em Washington), pensa de modo bem diferente. Para ele, o julgamento de Khalid Sheikh Mohammed e de outros conspiradores do 11 de setembro é uma ;tremenda vitória; da lei e do sistema judicial norte-americano. ;A principal questão será saber até que ponto a corte aceitará uma declaração de culpa dos réus. É do interesse estratégico dos Estados Unidos negar a esses terroristas o que eles mais querem: o martírio;, aposta.
Segundo Gude, a rede terrorista Al-Qaeda deve explorar uma execução como vitória significativa. ;A pena perpétua faria com que Khalid e seus coconspiradores sejam esquecidos, lançados na obscuridade das cadeias do país.; De acordo com Judith Kipper, diretora do Programa de Oriente Médio do Instituto de Assuntos Mundiais (também em Washington), qualquer julgamento nos EUA resguardará o direito de defesa aos acusados. ;Na Corte Federal dos EUA, especialmente em casos de grande importância, a lei é meticulosa.;
; Personagem da notícia
Mente diabólica
Khaled Sheikh Mohammed, que teria realizado ou planejado dezenas de atentados, entre eles o de 11 de Setembro, era considerado o número três da rede terrorista Al-Qaeda antes de sua prisão em maio de 2003 no Paquistão. Nascido em 24 de abril de 1965, no Kuweit, tinha 16 anos quando se somou ao movimento extremista Irmandade Muçulmana. Após os anos escolares, mudou-se para os Estados Unidos, onde obteve em 1986 um diploma de engenheiro na Universidade Agrícola e Técnica do Estado da Carolina do Norte. Em seguida, afirma ter cumprido uma formação militar em Peshawar (Paquistão) ao lado de islamitas afegãos. No fim da década de 1980, participou da guerra no Afeganistão contra os soviéticos.
Após breve permanência no Paquistão, mudou-se para o Catar, onde trabalhou como engenheiro no Ministério das Águas e da Eletricidade. Teria participado do atentado em 1993 contra o World Trade Center e, em 1994, de um plano para explodir 12 aviões americanos sobre o Oceano Pacífico. Em 1996, refugiou-se no Afeganistão e se encontrou com Osama bin Laden. Segundo uma declaração divulgada pelo Pentágono, Sheikh Mohammed reconheceu sua total responsabilidade em 31 ataques ou tentativas de atos terroristas, entre elas as tentativas de assassinato de ex-presidentes americanos Bill Clinton e Jimmy Carter e do papa João Paulo II, durante uma viagem do pontífice às Filipinas.
Os envolvidos
Ramzi ben Al-Shaiba (foto): morava em Hamburgo com Mohammed Atta, líder do comando do 11 de Setembro. Iemenita, 37 anos, al-shaiba foi treinado nos acampamentos da Al-Qaeda no Afeganistão. De acordo com a acusação, ele ia participar da operação, mas não obteve visto de entrada para os EUA.
Wallid ben Attash: nascido na Árabia Saudita em uma família originária do Iêmen, ele é acusado de ter participado da busca de informações para os atentados. O governo norte-americano suspeita de envolvimento no ataque ao destróier americano Cole, que matou 17 marinheiros americanos na costa do Iêmen em outubro de 2000.
Mustapha Al-Hawsawi: é acusado de ter sido o financiador da Al-Qaeda, nos primeiros anos do surgimento da rede terrorista. Segundo a acusação, al-Hawsawi, um saudita de 41 anos, organizou e centralizou o financiamento dos ataques de 11 de setembro.
Ali Abd Al-Aziz Ali (foto): sobrinho de Khaled Cheikh Mohammed e primo de Ramzi Youssef, autor do atentado contra o World Trade Center em 1993. Paquistanês criado no Kuwait, al-Aziz Ali é acusado de ter participado da organização da logística da operação de 11 de setembro de 2001.
; Otan e serviço secreto são alvos
Desde os atentados de 11 de setembro de 2001, a ousadia tem sido a marca registrada dos terroristas pelo mundo. Não foi diferente ontem. O estudante paquistanês Khalid Nawaz, 20 anos, acabava de girar a chave da ignição de seu Suzuki vermelho pérola modelo 2005, em Peshawar (noroeste). Mas ele preferiu não assistir às aulas pela manhã na universidade. ;Quando dei a partida, escutei um barulho intenso. Parecia um terremoto. Todas as portas de casa se abriram e o vidro das janelas arrebentou;, relata ao Correio, pela internet.
Às 6h40 (hora local), um homem-bomba tinha acabado de colidir o carro com 300kg de explosivos em uma barreira de aço, diante do prédio da Inteligência Interserviços (ISI, pela sigla em inglês) ; a agência de espionagem paquistanesa. A fachada da construção de três andares ficou destruída. De acordo com o jornal Dawn, o ataque ocorreu antes do encontro de Jim Jones, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, com líderes políticos e militares em Islamabad. Ao menos 12 pessoas morreram e 40 ficaram feridas. ;Ele surgiu na contramão e começou a vir na direção do escritório;, contou o soldado Nasir à agência de notícias Reuters. ;Os guardas abriram fogo, mas ele veio para a entrada do prédio e explodiu.; Para Nawaz, os moradores de Peshawar tiveram ;muita sorte;. ;O ataque ocorreu em um local por onde as pessoas passam para ir ao colégio. Foi sorte ter ocorrido tão cedo;, explica.
Esforço
De acordo com Imtiaz Gul, diretor do Centro para Pesquisas e Estudos sobre Segurança (Islamabad) e autor de A Conexão Al-Qaeda ; o Talibã e o terror em áreas tribais, o atentado em Peshawar parece ser parte de um esforço para enfraquecer o aparato de segurança e inteligência do Paquistão. ;Outros grupos islâmicos do exterior ; que veem o Exército como pária e fonte de instabilidade na região ; estão usando elementos locais do Talibã para infligir danos ao Exército e às instituições do governo;, opina. Outro complô suicida contra uma delegacia em Baka Khel (noroeste) deixou cinco mortos.
Nas imediações da capital do Afeganistão, Cabul, um terrorista se explodiu às 8h (hora local) na estrada Jalalabad, rota de comboios das forças internacionais. O impacto da bomba feriu nove soldados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e 10 civis. ;Os insurgentes usam indiscriminadamente ataques como esse para tentar intimidar as forças internacionais e nossos parceiros afegãos, mas seguiremos com nossos importantes esforços para apoiar o povo afegão;, disse uma porta-voz militar, a capitão da Marinha Jane Campbell, citada pela agência de notícias EFE. (RC)