A reunificação colocou para a Alemanha questões sobre a posse e a propriedade de imóveis. Cerca de 3 milhões de cidadãos orientais haviam abandonado suas casas e fugido para o lado ocidental. ;Sempre resolvemos os problemas com muita burocracia e leis complicadas;, analisa hoje o arquiteto Manfred Kühne, diretor do Departamento de Desenvolvimento Urbano de Berlim. ;Com a queda do muro, tínhamos uma lei para devolver as propriedades aos seus primeiros donos, mas tivemos casos difíceis.; Muitos alemães adquiriram, a partir de 1945, moradias disponíveis em decorrência da perseguição aos judeus sob o nazismo. ;Por outro lado, a legislação dizia que a mudança na propriedade não significava que os inquilinos tinham de se mudar.;
A situação gerou soluções heterodoxas. Na rua Oranienburger, os turistas se impressionam com um grande edifício no antigo bairro judeu, cuja fachada é puro grafite: o Centro Cultural Tacheles (;comunicar-se;, em hebraico). Lá funcionam estúdios de artes plásticas e artesanato, além de um bar decorado com sucata. O prédio vazio e em ruínas foi ocupado por artistas de todo o mundo em fevereiro de 1990. Nos últimos 10 anos, reunidos em cooperativa, conseguiram legalizar a situação com o governo ; pagam aluguel e gastos de manutenção. ;Mas, infelizmente, o prédio acabará até o fim do ano, se não o comprarmos por 4 milhões de euros;, diz um dos moradores, um artista plástico de Ipswich, na Inglaterra.
Consultado a respeito do edifício ; o último na cidade inteiramente ocupado por artistas e artesãos ;, Manfred explicou que o governo não poderia arcar com a manutenção. ;A cidade de Berlim é tão pobre que temos de vender tudo que pudermos, cada apartamento, cada prédio;, argumenta. O prédio será vendido a um grande investidor internacional, se a cooperativa de artistas não conseguir arrecadar a quantia necessária com a campanha de doações divulgada no site http://super.tacheles.de.
Outras experiências tiveram mais sucesso. O filósofo Heiner Koch, 30 anos, mora em um edifício na rua Kinzig, onde cada família tem direito a um quarto. As cozinhas e os banheiros são compartilhados por andares e há um salão no térreo para festas e reuniões. O prédio foi adquirido em 1992 por um grupo de famílias que se juntaram e conseguiram um financiamento de 2 milhões de euros. O aluguel custa 230 euros. ;Todos pagam o mesmo valor, não importa se o quarto é maior ou menor;, explica. O filósofo valoriza a solidariedade entre os moradores, que ocupam os quartos segundo a necessidade de cada família: pais jovens com crianças têm mais espaço. ;Há pessoas de todas as faixas etárias, que buscam o local não apenas por ser mais barato, mas também porque têm o espírito de compartilhar experiências de vida;, diz, resumindo o espírito alternativo cultivado em Berlim.
Heiner diz que não há problemas na hora de pagar as contas, nem no uso dos espaços comuns. A parte mais incômoda pode ser na hora de mudar de quarto ; os moradores decidiram que haverá rodízio a cada três anos. ;Uma vez, tivemos de ajudar um senhor que tinha uma grande biblioteca e ia para o sexto andar. Ficamos desanimados só de imaginar a mudança, mas no final todo mundo ajudou;, conta. (VV)