A junta militar no poder na Guiné tentou nesta quarta-feira impor silêncio no país, dois dias depois do massacre de mais de 150 pessoas em um estádio de Conakry.
A União Europeia (UE) se reuniu em Bruxelas para estudar novas sanções contra os golpistas, depois de uma das matanças mais sangrentas perpetradas no país nos últimos 25 anos.
"Há uma vontade de calar todas as contestações e de prender todas as pessoas suspeitas de terem liderado a manifestação de segunda-feira", denunciou Mamadi Kaba, presidente da ONG Raddho (Encontro Africano para a Defesa dos Direitos Humanos) na Guiné.
"A repressão no sangue não pode deter a vontade do povo de alcançar a democracia", declarou Kaba por telefone à AFP.
Na noite de terça-feira, em discurso transmitido pela TV, o chefe da junta, o capitão Mussa Dadis Camara, decretou quarta e quinta-feira "dias de luto nacional" e proibiu "qualquer reunião de caráter subversiva".
Ele ainda conclamou o "conselho religioso", que reúne líderes cristãos e muçulmanos, "os dirigentes de partidos políticos", "as organizações da sociedade civil" e "a imprensa" a "se absterem de declarações e atos suscetíveis de perturbar a ordem púiblica e abalar os fundamentos da nação guineana".
"Os perturbadores e seus líderes serão severamente punidos", ameaçou.
De acordo com a Organização Guineana de Defesa dos Direitos Humanos, mais de 150 pessoas foram mortas e mais de 1.200 feridas na repressão da manifestação pelas forças de segurança, ainda marcada por estupros e cenas de barbárie. Os manifestantes protestavam pacificamente contra a eventual candidatura de Dadis Camara à eleição presidencial.
Após a repercussão internacional do massacre, o chefe da junta tratou de minimizar sua responsabilidade na tragédia alegando que não controla o exército.
"Não controlo todas as atividades do exército", declarou Dadis Camara à rádio francesa Europe 1.
Para o defensor dos direitos humanos Mamadi Kaba, o capitão Camara "sabe que a população não desistiu, e que as pessoas pretendem continuar com os protestos". "Ele quer, porém, garantir que a festa da independência, no dia 2 de outubro, transcorra sem problemas", opinou.
Os carros e as pessoas recomeçaram a circular nesta quarta-feira pela manhã. Ontem, Conakry parecia uma cidade fantasma.
Alguns postos de gasolina voltaram a funcionar, mas a maior parte das lojas continua fechada.
A pedido da França, ex-potência colonial, os representantes dos países da UE se reuniram nesta quarta-feira em Bruxelas "para examinar novas medidas, principalmente individuais, que poderiam ser tomadas rapidamente", segundo o ministro francês das Relações Exteriores, Bernard Kouchner.
A Bélgica anunciou que defenderá sanções suplementares contra o país africano, além do congelamento da ajuda europeia ao desenvolvimento dedicida no segundo trimestre deste ano.
Paris suspendeu terça-feira a cooperação militar com a Guiné, e anunciou que reexaminará a totalidade da ajuda bilateral prestada a este país.
"Os responsáveis pelos massacres em Conakry devem responder por seus atos. Nada justifica tamanha violência", reafirmou nesta quarta-feira o porta-voz do ministério francês das Relações Exteriores.