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No Japão, em queda demográfica, ter filhos é uma corrida com obstáculos

TÓQUIO - O Japão pode perder 20% de sua população até 2050 se seus habitantes não decidirem ter mais filhos, um problema que se deve tanto às dificuldades materiais para criá-los como à atitude dos japoneses frente ao casamento e ao sexo.

Com uma taxa de fecundidade das mais baixas do mundo (1,37 por mulher em 2008), enquanto o tema da imigração continua sendo um tabu, o Japão passará de 127 milhões de habitantes atualmente para cerca de 100 milhões em 2050.

Todos os candidatos às eleições legislativas de 30 de agosto prometeram tratar o problema com subsídios familiares, estabelecendo gratuidade nas escolas ou multiplicando os jardins de infância, que hoje são insuficientes. "A falta de creches é um verdadeiro problema. Mas a razão mais simples da queda da natalidade, é que as pessoas se casam cada vez mais tarde ou não se casam nunca", explica à AFP Yuko Kawanishi, socióloga da Universidade de Tóquio Gakugei.

Em 2007, a idade média para se casar era de 28,3 anos para uma mulher. Em 1950 era de 23 anos.

No Japão, o casamento é uma etapa fundamental para se fundar uma família: menos de 2% dos nascimentos ocorrem com casais solteiros. Mas se 91% das jovens japonesas solteiras sonham em se casar, 69% asseguram que ainda não o fizeram por não terem encontrado o marido ideal, que seja sensível, tenha um bom emprego e participe das tarefas domésticas, segundo um estudo. "Muitas mulheres japonesas modernas hesitam em se casar, já que temem perder sua liberdade", afirma Kawanishi.

Já entre os homens, muitos são incapazes de manter uma família por não terem estabilidade profissional. Mais de um trabalhador em cada três no Japão estão em situação precária.

Inclusive com a aliança no dedo, os obstáculos para a procriação persistem.

Um estudo da Universidade de Nihon revelou que em 2007 quase um casal em cada quatro não mantinham relações sexuais. O principal culpado é a jornada de trabalho interminável, que esgota os maridos, e a escassez de residências.

A isso se soma, segundo Kawanishi, uma misteriosa falta de comunicação entre homens e mulheres. "A indústria do sexo, a sexualidade estão onipresentes no Japão, salvo dentro dos lares. Seria possível dizer que os maridos e as esposas têm sempre outra coisa melhor para fazer", se lamenta a socióloga.

Até para um casal sexualmente ativo, ter filhos requer uma reflexão. O seguro médico não cobre, salvo complicações sérias, as caras consultas médicas durante a gravidez e o parto, assim como os tratamentos contra a esterilidade.

Outro problema é a falta de estrutura para as crianças. No Japão, encontrar um pediatra, uma babá ou um espaço de recreação digno pode se tornar uma verdadeira corrida de obstáculos. As obrigações que recaem, tradicionalmente, sobre as mães também podem ser dissuasivas. Neste sentido, 70% das mulheres que trabalham renunciam ao seu emprego quando chega o primeiro bebê. "É muito difícil para uma japonesa trabalhar sendo mãe. Há, certamente, um problema para cuidar dos filhos", explica Kawanishi.

"Mas não se pode deixar de lado a mentalidade, muito arraigada, segundo a qual espera-se que uma mãe sacrifique todo o resto para cuidar de seu filho durante seus três primeiros anos, sem isso a progenitura será um fracasso", acrescenta. Segundo ela, "esta concepção, implícita e culpabilizante, leva muitas mulheres a considerar que ser mãe traz muitos problemas".