ESTRASBURGO - A queda do governo do primeiro-ministro liberal Mirek Topolanek mergulha a República Tcheca na incerteza política, com uma Constituição suficientemente vaga para permitir todos os cenários em curto e médio prazo, segundo os analistas. Topolanek, que ficou em minoria na terça-feira depois dos votos contrários de quatro deputados vindos da maioria parlamentar, prevê demitir-se nesta quinta-feira após a reunião extraordinária de seu gabinete, segundo sua porta-voz Jana Bartosova.
O desaparecimento da coalizão de centro-direita põe em questão vários dossiês importantes, como o Tratado de Lisboa, a instalação do escudo antimíssil americano e a administração da crise econômica.
O atual governo tcheco tentou nesta quarta-feira (25/03) garantir que sua queda não terá impacto na presidência da União Europeia (UE), que Praga deve exercer até junho, embora tenha admitido que a situação "complica" o futuro Tratado europeu de Lisboa ainda não ratificado em seu país. "Não se preocupem, esta situação não terá impacto na presidência da Ue", declarou o primeiro-ministro tcheco, no plenário da Eurocâmara, um dia depois de seu governo ter caído por uma moção de censura lançada pela oposição de esquerda.
O chefe do governo de centro direita deve renunciar, mas poderá permanecer em suas funções para se ocupar dos assuntos correntes até o final da presidência semestral da UE no fim de junho. "O que é triste é que a oposição social-democrata tentou minar a presidência (tcheca da UE). Mas espero que de qualquer forma esta presidência seja um sucesso", disse Topolanek, que ao chegar ao plenário abraçou o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durao Barroso.
No entanto, e apesar das tentativas de Topolanek para acalmar os nervos, o certo é que a crise tcheca "complica" a crucial questão da ratificação do Tratado de Lisboa pela República Tcheca, conforme admitiu o vice-primeiro-ministro tcheco encarregado de Assuntos Europeus, Alexandr Vondra. "Estamos esperando o voto do Senado, não vai ser fácil", declarou.
A República Tcheca ainda não completou seu processo de ratificação parlamentar do Tratado de Lisboa e é o único país nessa situação, junto com a Irlanda, quer o rejeitou no referendo. Para entrar em vigor, o Tratado deve ser confirmado pelos 27 países da UE.
O Senado tcheco ainda tem de se pronunciar, no início de abril, mas a data e o resultado desta votação são incertas, como explicou o próprio Topolanek.
"O telefone direto para o Tratado de Lisboa está no escritório de Jiri Paroubek (o líder do Partido Social Democrata, responsável da queda do governo e cujo partido administrará a agenda parlamentar a partir de agora), não no de Mirek Topolanek", declarou o primeiro-ministro. Neste sentido, o chanceler francês, Bernard Kouchner, afirmou que o que acaba de acontecer na República Tcheca prejudica mais uma vez a certeza sobre a aprovação do Tratado de Lisboa. "A presidência tcheca da UE tem sido prejudicada pelo voto do Parlamento em Praga", disse Kouchner.
Diante desta situação que ameaça prolongar a crise institucional da UE, o titular do Europarlamento, o alemão Hans-Gert Pöttering, disse que os europeus devem "incentivar a presidência tcheca do bloco a continuar com o processo de ratificação.
Terça-feira, após saber da queda do governo tcheco, a Comissão europeia limitou-se a manifestar sua "confiança" no bom funcionamento da presidência da UE, apesar das turbulências políticas em Praga.
Diante de uma opinião pública hostil e das divisões dos deputados, os acordos militares e diplomáticos assinados por Praga e Washington já foram retirados in extremis da ordem do dia dos debates parlamentares no início de março, por medo de um voto negativo.
A política de diálogo da nova administração de Barack Obama com o Irã e a Rússia já alimentava dúvidas sobre o futuro do projeto de instalação de um escudo antimíssil previsto pela administração Bush na República Tcheca e na Polônia.
No plano econômico, os analistas dizem que a queda do governo tcheco, o terceiro a cair em algumas semanas na Europa do Leste, após a Letônia e a Hungria, acontece no pior momento. "Isto acontece no momento em que os mercados estão nervosos", destacou o analista Tomas Sedlacek, que trabalha no conselho especial anti-crise (NERV).