;Eu sempre agi de acordo com os melhores interesses de nosso paÃs. Segui minha consciência e fiz o
que achava que fosse o melhor. Vocês podem não concordar com algumas duras decisões que tive de
tomar, mas eu espero que vocês concordem que eu estava disposto a tomar decisões difÃceis.;
George W. Bush bem que tentou se justificar no discurso de despedida, na noite de quinta-feira, mas
ainda assim vai entrar para a história como um dos presidentes mais impopulares dos Estados Unidos.
O apoio conquistado após os atentados de 11 de setembro de 2001 se desmanchou em meio a uma série
de polÃticas catastróficas. Enquanto as bombas da coalizão ainda caÃam sobre o Afeganistão,
Bush ordenou que os 775 primeiros prisioneiros de guerra fossem levados para a base naval de
Guantánamo, em Cuba. No inÃcio de dezembro, caiu Kandahar ; último bastião do Talibã ;, e a
milÃcia perdeu o poder.
Sem capturar o terrorista saudita Osama bin Laden, o mandatário norte-americano voltou-se para o
Iraque, abriu nova frente de batalha em março de 2003, derrubou Saddam Hussein e celebrou o
enforcamento do ex-ditador. Enquanto o número de presos aumentava em Guantánamo, os EUA amargavam
o escândalo de abusos cometidos na prisão de Abu Ghraib, em Bagdá.
Robert Guttman, diretor do Centro de PolÃtica e Relações Internacionais da Universidade Johns
Hopkins, classifica Guantánamo como um ;sinal da teimosia e relutância do governo Bush; em
promover mudanças, mas aponta o Iraque como o principal legado maldito do lÃder republicano. ;Bush
deixa a Casa Branca com mais de 140 mil soldados no Iraque e sem o fim da ocupação do paÃs Ã
vista;, lembra. ;A história julgará a invasão. Sim, nós derrubamos um terrÃvel ditador, mas
Saddam já estava encurralado pela zona de exclusão aérea;, afirma. Para especialistas, o Iraque
foi um erro polÃtico que custou a vida de 4.227 soldados norte-americanos e de 98 mil civis
iraquianos.
Boa parte do prestÃgio de Bush naufragou nas águas que cobriram 80% da cidade de Nova Orleans
(Louisiana), após a passagem do furacão Katrina, em 29 de agosto de 2005. O presidente demorou
quatro dias para visitar a região atingida pela tempestade que matou cerca de 1,7 mil pessoas. ;O
furacão Katrina mostrou-nos problemas sérios em nossa capacidade de resposta, em todos os nÃveis
de governo;, declarou Bush, duas semanas depois da tragédia. Um vÃdeo divulgado pela rede de TV
NBC mostra uma reunião na Casa Branca durante a qual Bush era alertado sobre os possÃveis estragos
do furacão.
De acordo com Matthew Baum, professor de ciência polÃtica da Universidade da Califórnia, ;é
difÃcil não ver o Katrina como uma falha em larga escala do governo;. Meteorologistas veem o
Katrina como um reflexo da indisposição do governo republicano em ratificar o Protocolo de Kyoto,
tratado que regula as emissões de gases causadores do efeito estufa. No entanto, Baum considera a
crise financeira global causada pela bolha imobiliária o maior fiasco do legado de Bush.
O especialista acredita que uma série de medidas impopulares custou aos EUA a perda da simpatia
adquirida perante o mundo após os ataques de 11 de setembro. ;O fim dessa ;boa vontade;
internacional danificou a habilidade dos EUA de conduzir uma polÃtica externa eficiente em uma gama
de temas e destruiu a confiança global no paÃs;, diz o professor. Bush chega ao fim do mandato com
um pÃfio Ãndice de popularidade de 22%, o terceiro mais baixo desde 1938.
Desconsideração
;O Katrina foi a maior falha interna dos anos Bush, destacando sua desconsideração para com os
pobres, exacerbada pelas polÃticas fiscais que redistribuÃram riqueza aos ricos;, critica Timothy
Patrick McCarthy, professor de polÃticas públicas da Universidade de Harvard. Segundo ele, o
governo Bush foi um ;fracasso abjeto;, tanto interna quanto externamente. ;O presidente está se
engajando em um processo deliberado de revisionismo e de criação de um mito. Mas a história o
julgará muito severamente;, alerta.
Em relação a Guantánamo, o especialista de Harvard acusa Bush de trair a Constituição, a lei
internacional e os princÃpios dos direitos humanos, causando um dano irreparável à imagem dos EUA
no mundo. ;Ainda se Barack Obama fechar Guantánamo ; e parece que ele o fará ;, será difÃcil
resgatarmos a nossa autoridade moral;, analisa. O desprezo pelo Protocolo de Kyoto, na opinião de
McCarthy, trará consequências negativas a longo prazo. ;A violação do tratado foi um sinal
precoce dos desastres que virão por aÃ.;
Análise da notÃcia
A mudança começou em 2008
Barack Obama se ocupará, num primeiro momento, da crise econômica no front interno; do Iraque,
Afeganistão e Oriente Médio no front externo. Nesses temas, a mudança de postura não será tão
excepcional como muitos acreditaram durante a campanha eleitoral. Em 2008, talvez numa tentativa
desesperada de reverter o desastre nas urnas, George W. Bush tomou medidas que já vinham sendo
prometidas pelo democrata.
Um dos maiores exemplos de como Bush convergiu para o plano de Obama foi busca, nas últimas
semanas, por paÃses dispostos a receber prisioneiros de Guantánamo. Obama terá de concluir essa
tarefa para fechar a prisão, sÃmbolo do desrespeito aos direitos humanos. No caso do Iraque, Bush
correu para acertar uma data de retirada das tropas. O cronograma foi concluÃdo, tem como prazo
2011, e foi assinado com as autoridades iraquianas. O democrata quer desocupar o paÃs árabe até
maio de 2010. Mas, se o caos polÃtico e social no Iraque não permitir, poderá se contentar com o
calendário atual.
Para o Afeganistão, o atual governo já previu maior presença de tropas ; o novo gabinete vai pôr
isso em prática. Também na economia, Obama pegará o bonde andando. As medidas iniciais mais
importantes de combate à crise foram tomadas no semestre passado. Portanto, que ninguém se
impressione caso o sentimento de mudança não seja tão forte nestes primeiros dias de Obama.
(João Cláudio Garcia)
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