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Relator da ONU ataca Israel e Estados Unidos

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Israel ignorou por completo iniciativas diplomáticas do grupo fundamentalista islâmico Hamas e, ao despejar bombas sobre a Faixa de Gaza, deveria responder por crimes contra a humanidade. A opinião é do norte-americano Richard Falk, relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos nos Territórios Palestinos. Durante visita a amigos em São Paulo, Falk falou com o Correio por telefone e denunciou a postura passiva da comunidade internacional diante do conflito, considerando a posição norte-americana de "inaceitável".

Como o senhor vê a ofensiva israelense na Faixa de Gaza?
É uma atrocidade. As vítimas civis são baixas aleatórias dos ataques. Israel alega que os ataques israelenses na Faixa de Gaza são retaliatórios. Mas devemos nos perguntar: "retaliatório pelo quê?" Até os ataques começarem, poucos dias atrás, nem uma única morte tinha ocorrido no ano inteiro. Apesar disso, ao atingir e amedrontar civis, os ataques com foguetes são ilegais e imorais, além de extremamente imprudentes. Não está inteiramente claro quem é responsável pelos ataques, ainda que a maior parte deles tenha sido atribuído ao Hamas. A liderança do grupo tem repetidamente oferecido a Israel uma trégua de longo prazo, que duraria até 10 anos. Além disso, a liderança do Hamas tem indicado sua vontade de aceitar, como solução para o conflito, um Estado palestino, com a retirada de Israel para as fronteiras de 1967. Talvez essas iniciativas diplomáticas não funcionassem, mas Israel as ignorou por completo. Mais provavelmente, a explicação real para os ataques israelenses esteja na política doméstica de Israel, com as eleições em menos de dois meses parecendo induzir a liderança a demonstrar sua tenacidade. Isso tristemente parece funcionar com o eleitorado de Israel. Também, possivelmente relevante, é a vantagem representada pelo feriado e o fato de que o governo Bush está chegando ao fim, e o mandato de Obama ainda vai começar.
Os ataques em Gaza têm sido realizados por armamentos modernas, como caças F-16 e helicópteros Apache, e dirigidos essencialmente à população indefesa, enfraquecida por muitos meses de pesado bloqueio. Não há nenhum modo adequado de caracterizar esses ataques, a não ser de graves crimes contra a humanidade, que deveriam levar a algum tipo de responsabilidade criminal para aqueles em posição de liderança civil e militar no governo israelense.

De que modo a comunidade internacional tem se portado em relação ao conflito?
A comunidade internacional tem sido essencialmente passiva, nem mesmo convocando direta e incondicionalmente um cessar-fogo imediato. Os altos oficiais da ONU têm expressado sua reprovação, mas o Conselho de Segurança tem sido impedido de tomar uma posição clara pelos Estados Unidos, que sempre protegem Israel da censura e de sanções.

Por que a ONU não pode ter influência sobre o Oriente Médio?
A ONU carece de vontade política e capacidade para implementar suas resoluções, e isso reflete a situação geopolítica. Como era diferente quando o Iraque se tornou alvo de resoluções punitivas, após o fim da Guerra do Golfo, em 1991.

Como deter essa onda de violência?
Eu não estou certo sobre uma posição decisiva do governo norte-americano, algo altamente improvável de ocorrer. Está ocorrendo uma ampla e profunda mobilização da opinião pública, mas é incerto até que ponto isso terá efeitos a curto prazo.

Quais as conseqüências desses ataques para a população da Faixa de Gaza?
As conseqüências já são desastrosas, em termos de baixas, com a possibilidade de continuidade dos ataques. A ofensiva agravou a situação ameaçadora para a sobrevivência coletiva de 1,5 milhão de pessoas, afetadas por um bloqueio que dura mais de um ano, e já produziu graves cortes de comida, suprimentos médicos e combustível. Há grandes riscos de a fome e as doenças agravarem os efeitos das ofensivas militares.

Existe um risco de colapso humanitário?
Já há muitos relatos de que os hospitais de Gaza não podem tratar os feridos. O Egito também não tem permitido a entrada de palestinos machucados. Há indicações de que Israel permitiu que alguns caminhões levassem comida e remédios para Gaza, mas esses relatos não foram confirmados.

O governo dos Estados Unidos legitimou a ação contra o Hamas. O que acha disso?
A posição do governo norte-americano é totalmente inaceitável. Se algum outro governo, que não fosse o de Israel, reforçasse um bloqueio do tipo daquele imposto a Gaza, e depois realizasse um ataque militar unilateral, os EUA responderiam com a fúria correta. E estariam na linha de frente dos governos, pedindo à ONU que atue prontamente e de modo coercitivo, se necessário. Graças ao apoio dos EUA, Israel infelizmente goza de impunidade geopolítica e pode fazer o que quiser sem prestar atenção à lei humanitária internacional ou à Carta da ONU. É uma política interna triste e trágica.