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Proteína com fluorescência rende Nobel

Osamu Shimomura, japonês, e o americano Martin Chalfie revelam ao Correio como substância extraída da água-viva pode iluminar processos complexos em organismos vivos. Roger Y. Tsien aprimorou estudo

Às vezes, os gênios agraciados com o Nobel surgem de idéias aparentemente malucas. Durante o verão de 1961, o japonês Osamu Shimomura e o norte-americano Frank Johnson espremeram cerca de 10 mil águas-vivas do gênero Aequorea victoria e, desse processo, extraíram do líquido obtido alguns poucos miligramas de um material fluorescente azul, ao qual deram o nome de aequorina. Aos 33 anos, Shimomura, então pesquisador da Universidade de Princeton, seguia os passos de Yashimasa Hirata ; o professor da Universidade de Nagóia constatou que os restos do molusco Cypridina brilhavam em contato com a água. Em 1962, Shimomura isolou um proteína que se apresentava levemente esverdeada quando exposta ao sol e verde fluorescente ao reagir com a luz ultravioleta. Apenas 26 anos depois, o norte-americano Martin Chalfie (leia a entrevista) adicionou um gene ao verme Caenorhabditis elegans, que passou a fabricar a proteína verde fluorescente (GFP). Na década de 1990, Roger Y. Tsien ampliou a palheta de cores da substância e aumentou a intensidade e a duração do brilho. Ouça entrevista exclusiva em inglês com o Nobel de Química Osamu Shimomura A Academia Real Sueca de Ciências justificou ontem o Nobel de Química para Shimomura, Chalfie e Tsien como sendo ;uma recompensa à descoberta inicial da GFP e a uma série de importantes evoluções que levaram ao seu uso como marcador em biociência;. Segundo a entidade, a ferramenta luminosa permite aos cientistas observar os movimentos, posições e interações das proteínas marcadas. ;Os pesquisadores podem acompanhar o destino de várias células com a ajuda da GFP: o dano aos neurônios durante o mal de Alzheimer ou como as células beta produtoras de insulina são criadas no pâncreas de um embrião em crescimento;, afirma o comunicado da Academia. Hoje aos 80 anos e professor do Laboratório de Biologia Marinha de Woods Hole (Massachusetts), Shimomura admite que não tinha idéia da revolução que provocaria no ramo das ciências biomédicas. Em entrevista ao Correio, por telefone, ele contou que a curiosidade o moveu. ;O professor Frank Johnson me contou que muitas águas-vivas (do gênero Aequorea victoria) poderiam ser coletadas nas praias do estado de Washington. Apenas fiquei interessado em estudar esses animais;, explicou. Pioneiro Bem-humorado, Shimomura disse que acordou às 5h com o telefonema da Academia Real Sueca de Ciências. ;Esta manhã bagunçou meu dia;, brincou. ;Foi uma grande surpresa, eu não esperava ganhar o Nobel de Química, mas sabia da possibilidade de ter um de Medicina.; De acordo com ele, a GFP ;é bastante útil em terapias contra doenças;. ;Ela pode ser usada no progresso da ciência;, aposta. A condição de Nobel deve promover uma revolução na vida de aposentado. ;Creio que vou dar aulas, escrever artigos; Eu me tornarei muito mais ocupado que agora.; Martin Chalfie, de 61 anos, pesquisador da Universidade de Columbia, afirmou ao Correio que a GFP é um combustível para a biotecnologia. Ele considerou ;gratificante; ter sido lembrado pela Academia. Já Roger Tsien, de 56 anos, professor da Universidade da Califórnia, San Diego, duvidava do prêmio. ;Houve rumores, mas de fontes cuja confiabilidade era questionável;, disse, durante coletiva de imprensa. Veja galeria de fotos relacionadas com as pesquisas com a proteína Para que serve A GFP também consegue rastrear as metástases do câncer e ajudar no tratamento por radioterapia Ao marcar os neurônios de ratos com a proteína, os cientistas assistem à destruição provocada pelo mal de Alzheimer Ao adicionar GFP ao embrião do rato em formação, visualizam como o pâncreas produz células beta (fabricantes de insulina) Injetada nas células de cobaias, a proteína permite, em tempo real, o estudo de diferentes processos biológicos ao mesmo tempo (foto), como o funcionamento das células e dos órgãos