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Manifestantes contrários a Evo Morales fecham a ponte que liga o Mato Grosso do Sul ao país

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Vôos suspensos, fronteira fechada, bloqueios nas rodovias, crise diplomática, ameaça de desabastecimento, protestos violentos, mortes. Em meio ao risco de guerra civil e convulsão social, brasileiros praticamente isolados na Bolívia aumentaram em cerca de 1.000% a procura pelo consulado na cidade de Santa Cruz de la Sierra. A região mais rica de um país miserável também é um dos principais focos de oposição à nova Constituição impulsionada pelo presidente Evo Morales ; o texto concede mais poderes aos indígenas e limita o tamanho dos latifúndios. Por volta da 0h de ontem, cerca de 30 bolivianos despejaram três caminhões de areia sobre a ponte de 20m que marca a fronteira entre Brasil e Bolívia, na estrada que liga Corumbá (MS) a Puerto Suárez. Em entrevista ao Correio, Carlos Eloy Ferreira, auditor fiscal do posto alfandegário da Receita Federal na fronteira dos países, afirmou que o trânsito está bloqueado para carros, caminhões e motocicletas. ;Os brasileiros que tentam passar a pé para o lado boliviano demonstram tensão por entrar numa região de conflito. Nós os advertimos sobre os riscos;, disse ele. Veículos de placa boliviana cruzam a fronteira por um desvio em estrada de terra. ;Os manifestantes estão proibindo o ingresso de brasileiros, porque eles sempre retornam pela mesma estrada;, acrescentou Ferreira. Enquanto conversava com a reportagem, ele relatou que rojões eram disparados a partir do país vizinho. Do lado de lá, o boliviano Carlos Vargas, presidente do Comitê Cívico de Arroyo Concepción, comanda o fechamento da fronteira. Por telefone, ele contou ao Correio que o protesto, em memória de oito oposicionistas mortos anteontem em Pando, resultou na tomada ;pacífica; da imigração e da aduana. ;Nesta segunda-feira vamos liberar o bloqueio e nomear uma autoridade autônoma para administrar os dois setores;, explicou. Ele garantiu que seus homens não impedem a passagem de brasileiros. ;Nós avisamos aos moradores de Corumbá que é melhor eles voltarem, porque não há trens, ônibus ou aviões no departamento (estado) de Santa Cruz.; A 480km da alfândega, pelo menos 4 mil brasileiros ; a maioria de estudantes ; temem o agravamento da crise. O enfermeiro paulista Eder Calil Gallon, de 25 anos, relatou que a madrugada em Santa Cruz de La Sierra foi bastante tensa. ;Teve muita bomba a noite toda. A gente quase não dormiu;, contou. O rapaz disse que a noiva, Débora Chiminelli, de 27 anos, está amedrontada e só pensa em voltar ao Brasil. ;Escutamos muitas ambulâncias e não temos noção do número de feridos;, comentou Eder. Segundo ele, os opositores tomaram entidades do governo, como os Correios e a Receita, e nomearam interventores. Consulado Por enquanto, o Consulado-Geral do Brasil em Santa Cruz descarta uma retirada em massa. ;Houve grande afluência de brasileiros ao consulado, em busca de ajuda. Mas nós recomendamos a eles que fiquem em casa;, afirmou o vice-cônsul Cláudio Bezerra da Silva. ;O que fazemos é efetivar a matrícula do brasileiro, registrando nome, endereço e telefones. Se antes 10 pessoas nos procuravam por dia, hoje (ontem) foram 100.; A companhia aérea Gol confirmou que todos os vôos para o Aeroporto Internacional Viru Viru, em Santa Cruz, estão suspensos até segunda-feira. No front político, o presidente Evo Morales convidou os estados opositores (Santa Cruz, Tarija, Beni, Pando e Chuquisaca) ao diálogo. Mario Cossío, governador de Tarija, aceitou o pedido de reunião e sugeriu ao mandatário que marque a data e o local do encontro. ;É hora de pacificar o país, pois temos assistido a um dos dias mais obscuros da história democrática da Bolívia;, acrescentou. Na noite de ontem, havia a expectativa de que Cossío fosse recebido por Morales em La Paz. Marcelo Varnoux, presidente da Associação Boliviana de Cientistas Políticos, admite não existir saída que não seja a moderação. ;É preciso o início de um acordo ou Morales cairá, como ocorreu com outros presidentes;, alertou, por telefone. Ele critica o líder indígena pela falta de iniciativa em atender às demandas. ;Espero que haja vontade de Morales em ceder. A própria bancada do Movimento ao Socialismo (MAS, partido do presidente) pede uma saída pacífica.; RECADO A CHÁVEZ As Forças Armadas bolivianas rejeitaram ontem um possível envio de tropas venezuelanas ao país. Na quinta-feira, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, havia dito que, se derrubarem o colega Evo Morales, ele apoiaria movimentos armados na Bolívia. ;Não permitiremos que nenhum soldado ou força armada estrangeiros ponham pé em nosso solo;, anunciaram os militares em comunicado lido pelo comandante-em-chefe Luis Trigo.